À atenção do sr. ministro do Ambiente e Acção Climática

Tal como existe uma medida de financiamento público de parte dos custos de funcionamento das IPSS para que possam produzir um bem público essencial que é a coesão social, também as Organizações de Produtores Florestais precisam de uma medida do género para produzirem o bem público “associativismo dos produtores florestais privados”.

Sr. ministro, faça a reforma da floresta que está por fazer: institua uma medida de financiamento público de parte dos custos de funcionamento das Organizações de Produtores Florestais (OPF). Tal como existe, e bem, uma medida de financiamento público de parte dos custos de funcionamento das IPSS para que, assim, possam produzir um bem público essencial que é a coesão social, também as OPF precisam de uma medida desse género para produzirem o bem público que é o objecto da sua missão, a saber: o associativismo dos produtores florestais privados. Este bem público está a montante doutros de que agora se começa a falar, e bem, que são os serviços não mercantis dos ecossistemas florestais, mas uns e outros são diferentes.

Tendo em conta o número de OPF existentes no país, considerando que esse número já é suficiente e sabendo os custos de funcionamento que têm, uma verba de cerca de cinco milhões de euros bastaria para a medida atrás proposta.

Como, pelas minhas contas, os espaços florestais de Portugal produzem bens e serviços com um valor total de mais de 2,24 mil milhões de euros por ano e que, deste valor, pelo menos, cerca de metade corresponde a bens e serviços não mercantis que, portanto, não revertem em receita para os produtores florestais, mas são benefício para o conjunto da sociedade, cinco milhões de euros por ano é uma pequeníssima parcela desse valor que a sociedade deve aos produtores florestais.

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Pinhal em Aveiro Adriano Miranda

A medida atrás proposta não consta do seu programa de Governo. Também não foi implementada por nenhum Governo anterior quer os de depois de 25 de Abril, quer os de antes dessa data. Para ser mais justo, esta medida também não foi, nem está a ser advogada por nenhum partido político. Para ser ainda mais justo, esta medida tem passado quase sempre ao lado dos escritos e dos debates públicos sobre o sector florestal. O que se diz, o que se escreve e o que se legisla tem sido e continua a ser sobre o que está a jusante da medida atrás proposta.

Os fundamentos económicos justificadores desta medida são dois.

Portugal está no topo da tabela dos países com maior área de floresta privada, sendo esta propriedade muito fragmentada e estando cada propriedade quase sempre dividida em parcelas pequenas e dispersas. Assim sendo, é preciso promover a gestão florestal agrupada, sendo necessário muito trabalho no terreno para que essas formas de gestão se constituam e funcionem. Como o sr. ministro sabe de Economia, não preciso de lhe explicar que produzir associativismo é produzir um bem público. Uma parte dos custos de produção deste bem público já está a ser suportada pelos produtores florestais através dos serviços que pagam às OPF a que pertencem e do trabalho voluntário dos seus dirigentes, mas para além disto quase mais ninguém contribui. É o problema do “free rider” típico dos bens públicos, que, como economista, bem conhece. Por isso, como é preciso mais desse bem público, para pagar os seus custos de produção é necessário juntar às contribuições voluntárias dos produtores florestais atrás referidas, as contribuições do resto da sociedade que beneficia com isso. As que acontecerem a título voluntário serão bem-vindas, mas isso é pouco. Daí a necessidade de se recorrer ao que os cidadãos pagam para se produzirem bens públicos, ou seja, o financiamento público alimentado pelos impostos.

O outro facto fundamental que caracteriza a produção florestal em Portugal já foi referido: pelo menos metade do seu valor corresponde a bens e serviços não mercantis que, portanto, não revertem em receita para os produtores florestais, mas que são benefício para o conjunto da sociedade. Assim sendo, não é possível contar com a terceira forma que poderia ser possível para pagar os custos do associativismo enquanto bem púbico que seria através da receita da venda de bens e serviços florestais. Como uma boa parte destes bens e serviços são não mercantis, as receitas dessas vendas não pagam os custos de produção do associativismo enquanto bem público que é instrumental para se produzirem os outros bens públicos que a floresta gera (serviços de ecossistema).

O sr. ministro poderá dizer que no programa do Governo estão medidas não só para pagar serviços de ecossistemas florestais, mas também para apoiar o associativismo florestal. Quanto aos serviços de ecossistemas, já atrás referi que é preciso um trabalho associativo a jusante para o qual não há cofinanciamento público.

Quanto ao associativismo florestal, nas quatro páginas e meia que o programa do Governo dedica à floresta aparecem, na penúltima página, três linhas onde se diz que se vai “reforçar o papel do associativismo florestal, executando os apoios previstos no PRR para aumentar a capacitação técnica das organizações de produtores florestais”. Sr. ministro, as OPF dispõem de colaboradores que têm capacidade técnica para o exercício das suas funções. O que eles não têm e as suas organizações dificilmente conseguem é quem lhes pague toda parte de “bem público” que caracteriza os serviços que prestam. Portanto, o que lhes faz falta é que esse serviço lhes seja pago.

Já agora não é boa política que a medida aqui proposta seja financiada pelo PRR, ou por outros fundos que não sejam de base nacional. É uma medida que deve ter um carácter estrutural e permanente. Por isso, tal como os acordos de cooperação entre o Estado e as IPSS, não pode ficar sujeita a fontes externas que são temporárias e que não controlamos totalmente.

Sr. ministro, antes de terminar, queria dizer-lhe que ando a fazer esta proposta há cerca de 30 anos, mas sem sucesso.

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