Um novo Governo que não olha para os direitos do consumidor?

Na tomada de posse do novo Governo, não houve espaço para a secretaria de Estado dedicada à defesa do consumidor. Um retrocesso impossível de ignorar, sobretudo nos tempos de crise em que vivemos.

“Eu avisei!” Para quem ouve, talvez não seja o mais agradável, mas para quem o diz, há um certo pretensiosismo que não consigo deixar de sentir. Estamos no início do terceiro Governo liderado por António Costa, e a grande conclusão a que chego, para o futuro dos consumidores, é só uma: retrocedemos.

No discurso da tomada de posse deste novo Governo com caras tão familiares, há uma frase do primeiro-ministro que não me sai da cabeça. “Saberemos ser uma maioria de diálogo, de diálogo parlamentar, de diálogo político e de diálogo social”. Mas é um facto que, nos próximos quatros anos, e dentro do Ministério da Economia, não haverá espaço para uma Secretaria de Estado dedicada ao Comércio, Serviços e Defesa do Consumidor, nem para João Torres. O que pensar desta “despromoção”? Qual é, então, o espaço destinado à opinião e ao diálogo com o consumidor? Fiquei com dúvidas.

Somos cada vez mais digitais. Se ainda não o éramos de todo, o esforço da pandemia assim nos obrigou a ser. Hoje, já não sabemos ser de outra maneira. Damos menos abraços e compramos menos em lojas físicas. Do lado do polo positivo desta pilha que alimenta o consumo, está a opinião do consumidor. Essa é dada cada vez mais vezes, em cada vez mais meios digitais e tem cada vez mais valor. Mas, do lado negativo, a desinformação, a ainda evidente desregulação da transição digital de alguns setores e a falta de apoio ou defesa dos direitos ainda faz mossa e não pode ser uma área cinzenta no parlamento.

Neste sentido, e ao suprimir-se esta pasta dentro do Ministério da Economia, surgem dúvidas que ninguém consegue calar: não haverá aqui um retrocesso relativamente aos direitos do consumidor? Em que ponto fica esta relação entre a regulação da digitalização da economia, a transição energética e digital e a forma como acedemos a bens e serviços online? O que mudou nesta necessidade até então dada como prioritária? Era apenas um job for the boy? Porque do nosso ponto de vista - dos restantes dez milhões de portugueses -, ser excluído por ineficiência ou rejeição dá lugar a novo cargo dentro da esfera política de António Costa. Que o diga o novo ministro das Finanças, Fernando Medina. Resta-nos olhar para o futuro e aguardar pelas respostas. Respostas essas que, adoraria eu, confirmassem um cenário favorável aos consumidores, mas que, à primeira vista, ainda é difícil de vislumbrar.

Na fase em que vivemos, seria de esperar que a defesa dos direitos dos consumidores acompanhasse tanto estas transições, como a crise dos aumentos dos combustíveis, da energia ou dos bens alimentares em que entramos agora a propósito do conflito entre a Rússia e Ucrânia. E, a restringir-se apenas a normas e diretivas europeias – no sentido de igualar Portugal aos restantes países-membros - claramente não irão satisfazer todas as necessidades individuais dos consumidores de cada país, num momento como este.

No entanto, também não é nada que não tenha previsto anteriormente: os governos mudam, e nada é estático. Haverá certamente razões e motivos alheios ao comum mortal para esta reviravolta no sector do consumo. Mas, precisamente pela volatilidade em questão, é preciso munir o consumidor de ferramentas alternativas que o ajudem a manifestar-se de forma individual, mas também em massa. Uma forma de fazer chegar a sua opinião o mais longe possível e que isso obrigue à alteração necessária de padrões e comportamentos.

Quando as respostas adaptadas às necessidades especificas de cada país em matéria de consumo escasseiam ou se revelam de certa forma difusas num determinado momento, só há um caminho: procurar os meios certos para reclamar mais e melhor.

Continuaremos a contribuir com os nossos meios, enquanto fundadores da maior plataforma online de consumidores em Portugal, pois, só assim se alcançará a visão de conseguir um ecossistema de consumidores independentes, seguros e informados que, juntos, exigem mais e fazem melhores escolhas em matéria de consumo. Reclamemos, então!

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