Demolição da estação da Boavista no Porto é “contra a vontade da população”, diz movimento

O movimento afirma ter sido com a “mais profunda inquietação” que viu a decisão do Governo de “apoiar o processo de demolição da primeira estação ferroviária do Porto”.

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A estação será demolida Paulo Pimenta

O Movimento por um Jardim na Boavista afirmou nesta quinta-feira que a demolição da antiga estação ferroviária da Boavista, no Porto, vai “contra a vontade da população”, acusando tutela e autarquia de “desrespeito” e “ligeireza” na tomada de decisão.

Numa missiva enviada nesta quinta-feira ao ministro das Infra-estruturas, Pedro Nuno Santos, ao presidente da Infra-estruturas de Portugal (IP), António Laranjo, e ao presidente da Câmara do Porto, Rui Moreira, o movimento afirma ter sido com a “mais profunda inquietação” que viu a decisão do Governo de “apoiar o processo de demolição da primeira estação ferroviária do Porto”.

Na terça-feira, um despacho publicado em Diário da República dava conta de que a antiga estação ferroviária da Boavista será demolida no âmbito da desafectação do domínio público de vários edifícios da Infra-estruturas de Portugal (IP) para ser construído um El Corte Inglés.

O movimento, que é a favor de um jardim público nos terrenos onde o Corte Inglés tem intenção de construir um armazém comercial, salienta que a decisão é “contra a vontade da população” e denuncia o discurso de “inevitabilidade” usado para defender a condução do negócio, bem como a “ligeireza” com que as entidades aprovam a construção de “mais um centro comercial para o centro da cidade do Porto”.

“Inquieta-nos que não tenham tido a coragem de consultar a população (...) Inquieta-nos que não tenham sequer tentado encontrar um compromisso entre este negócio que ninguém quer e que, pelo contrário, tenham aprovado a duplicação de áreas de construção para lá dos limites regulamentados, retirando qualquer hipótese para a preservação da estação ou a criação de uma área verde numa cidade cada vez mais cinzenta”, refere.

A par do movimento, também o Núcleo de Defesa do Meio Ambiente de Lordelo do Ouro - Grupo Ecológico (NDMALO-GE) manifestou, na quarta-feira, descontentamento com a decisão tomada por despacho.

No comunicado, o núcleo acusou a Câmara do Porto de ter aprovado um Pedido de Informação Prévia (PIP) do El Corte Inglés “antes deste deter a titularidade do terreno onde se desenvolverá o projecto urbanístico”, e atribuiu também responsabilidades à autarquia pela concretização do projecto devido à “alteração introduzida da qualificação do solo e aumento da capacidade produtiva”.

Considerando que nesta matéria a Câmara do Porto teve “uma arrogante posição de sobranceria”, o núcleo atribuiu ainda responsabilidades à autarquia por “não exigir o cumprimento das regras previstas no regulamento do Plano Director Municipal (PDM)”, considerando que esta é “responsável pela demolição do edifício”.

“A ela cabe decidir e aprovar a destruição deste marco da memória dos portuenses”, acrescentou.

Contactada hoje pela Lusa, a Câmara do Porto escusou-se a comentar as considerações feitas tanto pelo movimento como pelo núcleo.

O despacho publicado em Diário da República (DR) tem anexo um mapa no qual é visível que um dos edifícios é a antiga gare de passageiros da Boavista, sendo os dois outros edifícios em causa, na Rua 05 de Outubro, dedicados a habitação.

A desafectação do domínio público ferroviário dos edifícios em causa destina-se “a integrar uma operação de loteamento sob a forma de reparcelamento urbano (...) em conjunto com uma área de 1.392 m2 da titularidade do ECI Boavista, S. A. (ECI), da qual está prevista a demolição dos três edifícios existentes e resultarão três lotes de terreno”.

A IP e o El Corte Inglés celebraram, a 21 de Setembro de 2021, o quinto aditamento ao contrato promessa de constituição de direito de superfície, decorrente do PIP aprovado em 2020 pela câmara.

De acordo com um esclarecimento do Ministério das Infra-estruturas e da Habitação a uma pergunta do grupo parlamentar do BE, partilhado pelo movimento em defesa do jardim, os lotes 2 e 3 têm um valor de 21,2 milhões de euros, segundo o PIP.

O PIP também enquadra que a parcela de 254 m2 referida, “não constituindo um lote para construção, possui potencial urbanístico” e é passível de ser entregue ao município pela cadeia espanhola como “dação em cumprimento de parte do pagamento de taxas urbanísticas”.

O esclarecimento da tutela refere também que a Direcção-Geral do Tesouro e das Finanças (DGTF) realizou uma avaliação de toda a operação imobiliária, cujo montante ascende aos 52,6 milhões de euros.

“O montante estabelecido de preço para a constituição do direito de superfície a favor do El Corte Inglés para o Lote 1 é de 29.444.510,46 euros”, acrescenta.

No documento, a tutela nota ainda que o PIP aprovado inclui a compatibilização com o projecto da Metro do Porto em curso para aquele local, salvaguardando uma área de 697 metros quadrados para a futura edificação da sede social da empresa.

A cadeia espanhola já pagou 19,97 dos 20,82 milhões de euros fixados há mais de duas décadas, tendo por base um PIP aprovado em 2000 pela Câmara do Porto.

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