Covid-19: o que podemos esperar?

No momento atual de dominância da Ómicron, não só as vacinas mantêm um nível de proteção considerável contra a doença, como esta é significativamente aumentada pela dose de reforço vacinal. A mensagem é clara: as vacinas funcionam; são seguras, eficazes e salvam vidas.

Se há uma coisa que a pandemia da covid-19 nos ensinou, é que devemos sempre ser muito cautelosos ao tentar prever o futuro. Pronunciamentos mais ou menos definitivos sobre o que esperar do SARS-CoV-2 depararam-se frequentemente com surpresas, na maioria das vezes desagradáveis, levando alguns a adaptar uma citação famosa muitas vezes atribuída a Mark Twain para afirmar que “as notícias da morte da covid-19 foram claramente exageradas”. É, portanto, com grande prudência que se deve abordar qualquer tentativa de prever o que se pode esperar da pandemia de covid-19. No entanto, estou convencido de que este também é o momento de mostrar algum “otimismo realista” diante do que provavelmente está para vir.

As variantes do SARS-CoV-2 fizeram maravilhas pelo nosso conhecimento do alfabeto grego, mas também trouxeram novas ondas de pandemia e de preocupação. A estirpe original de Wuhan foi substituída pela variante Alfa, que dominou as infeções até ao surgimento da Delta, a qual foi recentemente substituída pela Ómicron, agora dominante. Para que uma variante se sobreponha a uma anterior, ela necessita, acima de tudo, de ser mais transmissível que esta. No entanto, e isso é certamente verdade no caso da transição da Delta para a Ómicron, esse aumento da transmissibilidade é frequentemente acompanhado por uma menor gravidade da doença causada pelo vírus.

A variante Ómicron agora predominante exibe uma capacidade sem precedentes de se transmitir, mas, e os dados a este respeito são agora claros, também causa doença menos grave do que qualquer uma das variantes que predominaram antes dela. A investigação mostra que a Ómicron prospera nas vias aéreas superiores (aumentando, portanto, a sua transmissibilidade), mas parece ter menor capacidade para invadir as células dos pulmões (tornando a doença menos grave). Esta menor gravidade da doença causada pela variante Ómicron constitui uma boa razão para estarmos otimistas.

No entanto, antes que possamos dizer que a batalha está vencida, necessitamos de conhecer uma informação importante: qual é a percentagem de infeções por Ómicron que leva a doença graves nas populações mais vulneráveis, nomeadamente pessoas idosas, imunocomprometidas, ou com comorbilidades que se sabe aumentarem o risco de covid-19 grave? Se essa probabilidade for residual e não comprometer a capacidade de resposta dos sistemas de saúde, então o risco de deixar o vírus circular, tal como acontece com vários outros vírus que causam doenças respiratórias, é reduzido. No entanto, se essa probabilidade estiver acima de um limite aceitável, os riscos são demasiado elevados para deixar desde já o vírus disseminar-se livremente. Felizmente, não será necessário esperar muito tempo para conhecer aquela percentagem, sendo que nesse momento estaremos em melhores condições para tomar as decisões mais acertadas. E, felizmente, temos uma ferramenta eficaz para reduzir ainda mais essa percentagem, o que corresponde a dizer que está nas nossas mãos aumentar a nossa própria segurança. Essa ferramenta chama-se vacina.

As vacinas contra a covid-19 são uma das conquistas científicas com maior visibilidade e impacto dos últimos anos. Elas salvaram já inúmeras vidas, e salvarão ainda muitas mais. Apesar dos receios recorrentes, por vezes alimentados por notícias alarmistas e sem uma base científica sólida, de que “a variante X apresenta uma mutação que pode levá-la a evadir a imunidade vacinal”, a verdade é que as vacinas atualmente disponíveis, desenhadas para a estirpe do vírus inicialmente identificada em Wuhan, mostraram ser extremamente resilientes na sua capacidade de conferir uma proteção muito elevada contra as formas graves de covid-19 causada por quaisquer das variantes que se lhe seguiram. Apesar de a capacidade de neutralização das partículas virais pelos anticorpos induzidos pelas vacinas não ser a mesma para todas as variantes, as respostas imunitárias mediadas pelas chamadas células T, que são fundamentais para a proteção contra as formas graves da doença, mantêm-se altamente funcionais contra todas as variantes do SARS-CoV-2 que suscitaram até agora maior preocupação.

Crucialmente, no momento atual de dominância da Ómicron, não só as vacinas mantêm um nível de proteção considerável contra a doença, como esta é significativamente aumentada pela dose de reforço vacinal, colocando-a perto dos níveis conferidos pelas duas doses iniciais contra as variantes anteriores. A mensagem é clara: as vacinas funcionam; são seguras, eficazes e salvam vidas.

Ao longo desta pandemia, ouvimos com frequência dizer que “ninguém está seguro até que todos estejam seguros”. Talvez não seja surpreendente que as variantes mais recentes com as quais tivemos que lidar tenham surgido em países com baixas taxas de vacinação, como a Índia (Delta) e a África do Sul (Ómicron). Este é um alerta claro para a iniquidade da distribuição das vacinas pelo mundo, e para as potenciais consequências que tal acarreta para todo o globo. É, pois, urgente que todos compreendamos de uma vez por todas que uma distribuição justa das vacinas é não só um imperativo moral, mas também uma medida para a proteção de todos neste nosso mundo global.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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