Portugal poderá refinar lítio do Canadá, Brasil e Austrália

Futura unidade de conversão de lítio da Galp e da Northvolt “não está dependente do lítio português”, garantem as empresas. Decisão final de investimento no projecto está prevista para final de 2023.

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O presidente da Galp, Andy Brown, na apresentação da parceria com a Northvolt
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Paolo Cerruti, co-fundador da Northvolt, e Andy Brown, da Galp, formalizam a joint-venture Aurora

Numa refinaria ainda de localização incerta, que o Governo vê com bons olhos no Norte, mas que a Galp entende que ficaria bem em Sines, poderá vir a ser transformado lítio proveniente de Portugal, mas também de explorações na Austrália, Brasil e Canadá.

A Galp formalizou esta terça-feira, em Lisboa, a criação de uma joint-venture com a fabricante de baterias sueca Northvolt que contempla um investimento de 700 milhões de euros na construção de uma grande unidade de conversão de lítio, que se pretende que seja “a mais sustentável da Europa”.

Embora o processamento do futuro concentrado de espodumena extraído pela Savannah na mina do Barroso seja uma das possibilidades em análise, os dois parceiros – Galp e Northvolt – reconhecem que este material proveniente do norte do país não será suficiente para os objectivos de produção da futura unidade de conversão da nova joint-venture, baptizada como Aurora e detida em partes iguais pelos dois parceiros.

A nova unidade de conversão, com arranque comercial previsto para 2026, “será capaz de produzir hidróxido de lítio suficiente para a produção de 50 GWh de baterias por ano (o suficiente para 700.000 veículos eléctricos)”, num total de pelo menos 35 mil toneladas por ano, estimam as empresas.

Admitindo que estão a decorrer conversações com a Savannah, que tem a concessão da mina do Barroso e que chegou a ter um memorando de entendimento assinado com a Galp para a venda do minério, o presidente da petrolífera, Andy Brown, sublinhou que “essa é uma opção [de fornecimento], mas não a única opção”.

A Galp e a Northvolt “não estão dependentes do lítio português” e têm “uma paleta de várias fontes” de aprovisionamento, que incluem carregamentos provenientes de locais de extracção distantes como a Austrália, Canadá e Brasil. Por uma questão de “gestão de risco” também faz sentido que exista mais do que um fornecedor, salientou o presidente da Galp aos jornalistas.

Apesar de reconhecer que o transporte do minério por navio tem uma grande pegada carbónica, Paolo Cerruti, co-fundador da Northvolt, destacou que o processo industrial de transformação em Portugal será muito menos poluente do que em localizações como a China, porque será suportado em energia de fonte renovável.

Para chegar até às 35 mil toneladas de hidróxido de lítio por ano, a Aurora irá usar “uma tecnologia provada”, com efeitos ambientais “já conhecidos” e, por isso, os parceiros estão “confiantes” que nos “próximos 18 meses” estarão em condições de “obter junto das autoridades as necessárias autorizações ambientais”, disse ainda Andy Brown.

Neste período terá de ficar definida a localização da refinaria. Na candidatura do projecto aos subsídios do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) o consórcio apresentou Sines como a localização da futura unidade, mas Andy Brown diz que, apesar de ser “uma boa opção”, Sines não é a opção final e também estão a ser analisadas outras, “no Norte”, mais próximo dos locais de extracção.

Já o ministro do Ambiente, Matos Fernandes, considerou à saída do evento que o Norte do país parece fazer mais sentido nesta equação, já que é nessa região que se encontram as reservas do mineral. “A Norte, [a refinaria] parece mais bem localizada do que a Sul, e quanto mais no interior do país, melhor”, afirmou o ministro, salientando que a escolha cabe aos investidores privados.

Paolo Cerruti diz que na escolha da localização serão fundamentais “a logística” e a “proximidade com as fontes de espodumena”. Além disso, terá de haver mão-de-obra e proximidade com outras fábricas que façam parte da cadeia de valor.

Portugal tem vantagens “únicas” salientou Andy Brown: o acesso a energia renovável barata e boas condições logísticas, como “portos de águas profundas [Sines] e ferrovia”.

A decisão final de investimento só será tomada na segunda metade de 2023 e, segundo o gestor, está dependente de um bom casamento entre a existência de matéria-prima, os acordos com os compradores do hidróxido de lítio e o financiamento (sendo que este, como será via project finance, está dependente de que efectivamente se venham a garantir contratos de venda).

Sobre a candidatura ao PRR, que Andy Brown diz que vai ser trabalhada nos próximos dois meses, há a expectativa de que possa vir a comparticipar pelo menos em 15% o custo do investimento. Sem o apoio do PRR, o presidente da Galp reconhece que “fica reduzida a viabilidade do investimento”.

E sobre se poderá haver um retrocesso neste empreendimento com a Northvolt, o gestor sublinhou que as empresas estão já a comprometer-se com um “investimento de dezenas de milhões de euros” nesta primeira fase do projecto.

A refinaria portuguesa terá de competir com outras de “baixo custo” da China, e Andy Brown acredita que o Governo não vai deixar passar em branco a possibilidade de criar no país uma nova actividade industrial.

Na candidatura às Agendas Mobilizadoras, que disputam as verbas do PRR, o grupo Galp lidera o consórcio em que participam 17 entidades e que quer criar no país toda uma nova cadeia de valor do lítio, que inclua extracção, refinação, produção de cátodo, células, assemblagem de baterias e reciclagem de baterias.

Toda esta fileira representa um investimento de 981 milhões de euros, dos quais 425 milhões ficam a cargo do grupo Galp e outros 388 milhões de euros correspondem à Aurora Lith. A britânica Savannah também faz parte do consórcio com um investimento estimado de cerca de 124 milhões de euros.

A parceira sueca da Galp foi fundada em 2016 por dois ex-executivos da Tesla, Paolo Cerruti e Peter Mikael Carlsson. A empresa que fornece células e sistemas de baterias de ião de lítio diz ter “mais de 27 mil milhões de dólares em contratos com clientes-chave, incluindo a BMW, Fluence, Scania, Volkswagen, Volvo Cars e Polestar”.

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