Microbiota intestinal pode ter um papel importante na prevenção e tratamento de doenças

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Ali Inay/Unsplash

Temos 100 vezes mais genes de origem microbiana do que genes humanos. Os genes humanos não mudam ao longo da vida, já os genes de origem microbiana, esses sim, mudam. Que impacto pode essa mudança ter no nosso corpo? Qual é, afinal, a importância metabólica do microbiota intestinal?

O microbiota instestinal corresponde aos microorganismos, como bactérias, vírus e fungos, que habitam todo o nosso trato gastrointestinal. Podemos apresentar as suas funções em três esferas: na digestão, na regulação do metabolismo e na saciedade.

O microbiota intestinal é responsável pela síntese de vitaminas, como a vitamina K, o folato, a vitamina D, entre outras. Apresenta funções cruciais no processo digestivo dos alimentos, participando na digestão seja de proteínas, hidratos de carbono ou gordura, com a produção de compostos muitas vezes benéficos para a saúde, como os ácidos gordos de cadeia curta a partir da digestão de fibras.

O microbiota intestinal modula a expressão de genes nas células entero-endócrinas, regulando a saciedade. Mais, quando estamos em jejum, as bactérias darão o primeiro alerta: estimulam as células da parede intestinal a produzirem um sinal — uma proteína chamada FIAF (Fasting Inhibitory Adipocyte Factor), que inibe a acumulação de gordura a nível visceral durante o período de jejum. Esta “comunicação” pode ficar comprometida quando ocorrem alterações do microbiota. Não é por acaso que já se apelida a microbiota de “segundo cérebro”, sendo ela, também, responsável pela síntese de neurotransmissores.

Desde o nosso nascimento, até à fase em que começamos a fazer diversificação alimentar, o microbiota vai passando por transições, muito dependentes da idade gestacional da nossa mãe, de termos nascido de parto por cesariana ou vaginal e de termos sido alimentados por leite materno ou de fórmula. Nesta fase as diferenças interindividuais são grandes, mas aos 2-3 anos de vida, o microbiota atinge a sua composição de base, as diferenças são menores.

Ainda na infância, a vida urbana ou rural, com ou sem animais domésticos, com ou sem exposição a antibióticos e o tipo de alimentação praticada, têm impacto na forma como o microbiota é moldado. Outros factores que se fazem sentir ao longo da vida, como o exercício físico (ou a falta dele), a alimentação, o stresse e alguma da medicação que tomamos, também têm impacto no nosso microbiota. Todo este conhecimento sublinha a importância do papel modulador que a dieta, e em particular os prebióticos (hidratos de carbono não digeríveis, que estimulam o crescimento e actividade das bactérias boas) e os probióticos (microorganismos que auxiliam na digestão e protegem o organismo contra as bactérias nocivas) podem exercer de benéfico neste contexto.

Olhemos agora para a cronobiologia — disciplina que estudo como funciona e reage o nosso relógio biológico nas diferentes actividades do nosso dia-a-dia, como por exemplo a hora a que realizamos as refeições (crononutrição) e o não respeito pelo ciclo dia-noite — tudo isto tem impacto em termos hormonais e no microbiota.

Quando uma destas três esferas está desequilibrada pode haver espaço para a doença. A disbiose é um desequilíbrio do microbiota intestinal em que existe alteração na quantidade e na distribuição de bactérias no intestino, que por sua vez pode provocar doenças como obesidade, diabetes, doenças cardiovasculares ou autismo.

Em suma, alterando a comunidade do nosso microbiota intestinal, através de prebióticos, probióticos, antibióticos ou, mesmo, o transplante de microbiota fecal, poderá vir a ser uma esperança no tratamento de diversas doenças.

Importa, assim, fazer o diagnóstico correcto. Tudo se relaciona e nos faz reflectir como muitas vezes o microbiota intestinal é negligenciado. Relacionar o microbioma com os mecanismos das doenças, numa visão mais holística, poderá ajudar na prevenção ou tratamento das principais causas de morte da actualidade.

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