Colocados no Ensino Superior...e agora?

No momento da matrícula numa licenciatura não desaparecem os obstáculos suscetíveis de conduzir a abandono e insucesso escolar, nem as desigualdades deixarão de se fazer sentir.

Para os quase 50 mil candidatos que acabaram de ser colocados em cursos de licenciatura, terminou o que muitos vivem como uma corrida de obstáculos a transpor até à entrada no Ensino Superior. Uma corrida com obstáculos desiguais dependendo das características pessoais de cada jovem e dos recursos culturais e económicos das famílias para apoiar o percurso escolar dos seus filhos.

Só que no momento da matrícula numa licenciatura não desaparecem os obstáculos suscetíveis de conduzir a abandono e insucesso escolar, nem as desigualdades deixarão de se fazer sentir. É por isso crucial identificar necessidades e disponibilizar recursos que permitam acolher, o mais adequadamente que for possível, um número crescente de estudantes para realizarem aprendizagens significativas durante um nova etapa que deverá culminar com a conclusão da licenciatura.

Os resultados mais recentes do estudo Eurostudent confirmam Portugal como um dos países mais desiguais no espaço europeu e os estudantes portugueses como aqueles que mais dependem da família para suportar os custos diretos e indiretos de frequentar o Ensino Superior. Ainda que a redução do valor das propinas seja uma medida positiva, conclui-se no mesmo estudo que Portugal é um dos poucos países europeus em que mais de 90% dos estudantes pagam propinas. Este dado torna imperativo criar mecanismos que evitem o abandono por razões financeiras.

Mas há ainda outro tipo de obstáculos que podem dificultar o adequado acolhimento de um número crescente e cada vez mais diverso de estudantes, suscitando a elevação das taxas de abandono e insucesso.

Desde logo, não é possível aumentar infinitamente a dimensão das turmas o que, na versão pós-pandemia, passa por ter alunos em sala de aula e outros a assistir à mesma aula através de videoconferência. Em algumas instituições de ensino superior esta possibilidade está a ser colocada neste ano letivo, para multiplicar o número de alunos por turma sem contratar mais professores.

É também inaceitável que se diminuam as horas de contacto entre professores e alunos, reduzindo os gastos com horas de aulas, como sugeriram recentemente alguns responsáveis do Ensino Superior incluindo o próprio ministro Manuel Heitor.

A qualidade do processo de ensino-aprendizagem depende, em grande medida, da relação entre alunos e professores, pelo que precisamos de rácios adequados que não permitam um número de estudantes excessivo para cada docente. Proporcionar oportunidades aos professores para consolidarem ou reformularem estratégias de ensino, num contexto de crescimento e diversidade dos estudantes, é também fundamental.

E importa melhorar instalações e equipamentos, para dispormos de condições físicas de maior qualidade para atividades de ensino e aprendizagem. Na suposta era da digitalização da Educação, têm de existir recursos informáticos e ligações Internet nas instituições de ensino superior, e não podem continuar a ser os próprios docentes a comprar os equipamentos tecnológicos que utilizam diariamente no seu trabalho.

A chegada de novos alunos ao Ensino Superior é uma nova etapa também para os seus professores, empenhados em eliminar obstáculos nos percursos dos estudantes propiciando-lhes aprendizagens significativas. Importa que os responsáveis das instituições de ensino e do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior reconheçam e reforcem as capacidades científicas e pedagógicas dos professores, assegurando condições adequadas para continuarmos a ensinar todos os alunos.

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