Os extremos esvaziam-se na Alemanha

A AFD é já hoje um partido político diminuído e o Die Link luta para se manter no Bundestag.

À hora que escrevo, não se sabe ainda se o novo chanceler alemão será Olof Scholz do SPD ou Armin Laschet da CDU/CSU. O que sabemos é que o resultado entre o Partido Democrático Liberal (FDP) e a extrema-direita Alternativa para a Alemanha (AFD) deve andar muito próximo e não irá além dos 11%. Enquanto os verdes (14.6%) e os liberais são vistos como peças-chave nas negociações, a AFD será excluída delas, com uma espécie de cordão sanitário à sua volta e excluindo qualquer participação num futuro governo. A queda na sua votação permite-o. O mesmo deverá acontecer à esquerda com o Die Link que não irá além dos 5%.

Por isso mesmo, a Alemanha dá mostras de que continua a merecer o seu lugar no coração da Europa. A AFD é já hoje um partido político diminuído e o Die Link luta para se manter no Bundestag, parlamento alemão. Sem dúvida, uma lufada de ar fresco num mundo e, em especial, numa Europa que muitas vezes parece enlouquecida e a viver entre narrativas populistas que representam um retrocesso civilizacional. Quem ganha em primeira instância são os alemães que terão no seu executivo uma coligação centrista e verde a definir o futuro.

Não consigo dissociar disto a realidade francesa com as eleições presidenciais a acontecer em abril do próximo ano. O peso da extrema-direita naquele país é bastante mais acentuado do que na Alemanha e, ao que tudo indica, em crescendo através do partido de Marie Le Pen. O xadrez da União Europeia entre as suas duas maiores potências, altera-se com uma presidência de Macron mais ou menos enfraquecida pela ameaça deste extremo e um executivo a ter de corresponder a alguma da vontade política desse campo. Como mudaria, caso fosse esse o desfecho eleitoral na Alemanha.

Neste contexto e seja qual for o futuro chanceler, dificilmente haverá espaço para a Alemanha evitar a sua responsabilidade maior numa nova estratégia na defesa e segurança europeia. Para lá das análises mais ou menos positivas sobre o legado da chanceler Merkel nas últimas semanas, todas convergem no facto de a geopolítica e o mundo se terem alterado substancialmente. A autonomia estratégica europeia é um tema cada vez mais urgente. As declarações de líderes da União Europeia como Von der Lyen e Joseph Borell também vão nesse sentido.

Se a Alemanha não perceber que Macron tinha razão há pouco menos de dois anos quando dizia que a NATO estava obsoleta e que o poder global da União Europeia desvanecerá sem uma afirmação política da UE; enquanto a Alemanha continuar a colocar a sua economia e as suas exportações para a China acima da autonomia estratégica europeia, então, apenas perpetuará o seu papel na morte lenta da União Europeia como um poder político global. Hoje, bem mais do que ontem.

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