Hospital Militar de Belém volta à esfera militar e não é cedido à Câmara de Lisboa

Entrega ao município e à Santa Casa da Misericórdia foi sempre contestada por figuras militares e pelo principal partido da oposição.

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Entrada do Hospital Militar de Belém Rui Gaudêncio

O Hospital Militar de Belém (HMB), unidade que no auge da pandemia foi utilizada como centro covid-19, em colaboração da Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo e o exército português, já não vai ser cedido à Câmara Municipal de Lisboa e à Santa Casa da Misericórdia, como esteve previsto desde 2019 para aí ser instalada uma unidade de cuidados continuados, com uma ala reservada aos antigos combatentes.

A 9 de Agosto passado, um despacho conjunto dos secretários de Estado do Tesouro e Adjunto da Defesa Nacional, publicado em Diário da República nesta segunda-feira, decidiu a reafectação a uso militar daquelas instalações e, portanto, a sua retirada da lista de rentabilização definida há dois anos no âmbito da Lei das Infra-Estruturas Militares.

O despacho assinado por Miguel Cruz e Jorge Seguro Sanches salienta a importância que aquela unidade hospitalar, onde trabalharam lado a lado médicos civis e militares, teve no apoio do dispositivo nacional de combate à pandemia, o que levou à realização de obras de adaptação. “A experiência deste último ano e meio revelou a importância de manter aquele imóvel no domínio militar”, refere o despacho.

Deste modo, alterados os objectivos, fica sem efeito a cedência à Câmara de Lisboa em parceria com a Santa Casa da Misericórdia do HMB. Instalado entre Março de 2020 e Março passado — em Abril foi encerrado —, o centro covid acabou por assistir 657 doentes, cuja média de idade de situava nos 72 anos, oriundos da Administração Regional de Lisboa e Vale do Tejo, que naquele período sofreu uma grande pressão. Destes enfermos, 12 acabaram por morrer.

Polémica militar e política

Desde o anúncio da cedência do HMB à Câmara de Lisboa, a questão levantou polémica. Primeiro, entre os militares, com o antigo Presidente da República, Ramalho Eanes, a subscrever uma carta contra esta opção, juntamente com vários destacados oficiais. Nela se propunha o aproveitamento das instalações não apenas no âmbito das Forças Armadas, mas também em coordenação com centros universitários e de investigação. Foi então notado que Eanes abandonou o princípio de não se pronunciar sobre aspectos da vida pública para se juntar aos subscritores — o que aconteceu pela primeira vez.

Do ponto de vista político, apesar da aproximação do PSD às propostas para a nova Lei de Organização de Bases das Forças Armadas (LOBOFA) e da adaptação, consequente, da Lei de Defesa Nacional, defendidas pelo ministro da Defesa Nacional, João Gomes Cravinho, o Conselho Estratégico Nacional do partido de Rui Rio divergia quanto ao destino do HMB. O grupo de trabalho dirigido por Ângelo Correia foi claro: “Conclusão do projecto de reestruturação da Saúde Militar incorporando o Hospital Militar de Belém como pólo do Hospital das Forças Armadas, passando a constituir-se como centro de referência e inovação no apoio ao combate às pandemias e como unidade de cuidados continuados”.

A detecção de uma derrapagem orçamental de cerca de dois milhões de euros levou à intervenção, a pedido de Gomes Cravinho, da Inspecção-Geral de Defesa Nacional, cujo relatório foi enviado ao Tribunal de Contas e 2 de Março. O facto de, numa primeira fase, este relatório não ter sido tornado público, levou os deputados do PSD da comissão parlamentar de Defesa Nacional a questionarem várias vezes o ministro, tornando-se num tema que aqueceu as relações do principal partido da oposição com o ministro.

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