Investimento privado atingiu novo máximo histórico no primeiro trimestre de 2021?

O primeiro-ministro disse duas vezes esta semana que Portugal atingiu em Março um “novo máximo” de investimento empresarial

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Nuno Ferreira Santos

A frase

“O primeiro trimestre de 2021 fixou um novo máximo de investimento empresarial, pelo menos, desde 1999, início da série estatística”

António Costa, primeiro-ministro

O contexto

O primeiro-ministro fez esta declaração em dois dias consecutivos esta semana. Primeiro, na terça-feira, durante a cerimónia de assinatura de contratos de investimento entre o Estado e quatro grupos privados no valor de 140 milhões de euros. E no dia seguinte, no discurso de abertura do debate do Estado da Nação, na Assembleia da República. Costa estava a referir-se ao esforço que está a ser feito, em vários níveis, para o país “se reerguer” depois da crise provocada pela covid-19.

Os factos

Há vários indicadores que mostram os níveis de investimento no país. O Instituto Nacional de Estatística (INE) actualiza a cada trimestre esses dados, que dizem respeito tanto ao investimento público e privado (formação bruta de capital fixo total) quer ao investimento apenas das empresas (formação bruta de capital fixo, de sociedades não financeiras).

Em termos de investimento global, o valor mais elevado atingido desde 1999 em preços correntes (ou seja, incluindo o efeito da inflação) foi no segundo trimestre de 2008 (10.439,2 milhões de euros), altura do primeiro Governo de José Sócrates. Esse valor foi conseguido graças à forte componente de investimento público que nesse período foi possível. Depois disso, o montante caiu até ao mínimo de 6150 milhões de euros, registados no primeiro trimestre de 2013, ou seja, em pleno Governo de Passos Coelho e de troika. Tem vindo a recuperar desde aí, mas no primeiro trimestre de 2021 ainda registou um valor ligeiramente inferior ao de 2008: 10.312 milhões.

No que diz respeito ao investimento empresarial, o período de 2008 (também no primeiro Governo de Sócrates) foi um momento de grande investimento (6348 milhões); durante os anos da troika foi baixo e tem estado a subir. No primeiro trimestre de 2021, segundo o INE, as empresas investiram, em preços correntes, 6807,6 milhões de euros.

Estes dados do INE estão contudo, todos em preços correntes, isto é, acumulando também o efeito da inflação. Uma forma mais correcta de analisar a evolução dos níveis de investimento é olhar para os seus níveis em volume, que nos dão uma ideia do crescimento (ou contracção) real do indicador. Em termos de investimento global, o valor mais elevado atingido desde 1999 foi, em termos reais, registado no quarto trimestre de 2007 (10.838 milhões de euros), caindo para um mínimo de 6326,6 milhões, registado no primeiro trimestre de 2013. No primeiro trimestre de 2021, o valor atingido foi de 9554,4 milhões, ainda longe dos níveis de 2008.

No que diz respeito ao investimento empresarial, o INE não divulga dados em volume, apenas em preços correntes.

Em resumo

A frase de António Costa é parcialmente verdadeira. No primeiro trimestre de 2021, registou-se o valor mais alto de investimento empresarial desde 1999: 6807,6 milhões de euros. Antes disso, o máximo histórico tinha sido atingido no segundo trimestre de 2019 (com um valor muito semelhante, 6639,5 milhões) e em 2008 também se chegou a um valor semelhante: 6348 milhões.

No entanto, o facto de estes números estarem em preços correntes, não retirando o efeito da inflação, pode tornar estas comparações enganadoras. O INE não publica dados para este indicador em volume, mas é provável que um investimento de 6348 milhões de euros aos preços de 2008 seja, em termos reais, superior aos 6807,6 milhões de euros investidos no primeiro trimestre deste ano, aos preços de 2021. O investimento actual é 7,2% superior ao de 2008, mas o deflator do investimento (que indica a variação dos preços) calculado pelo INE aumentou, entre 2008 e 2020, 9,5%.

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