Câmara do Porto defende descentralização no “licenciamento técnico de creches”

O encerramento de mais uma creche na zona de Cedofeita, sem parecer técnico da Segurança Social para abrir uma nova sala com dez crianças, levou o executivo municipal a concordar na urgência de advertir a tutela para o desaparecimento destas respostas sociais.

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ADRIANO MIRANDA / PUBLICO

O presidente da Câmara Municipal do Porto, Rui Moreira, comprometeu-se, na reunião camarária desta segunda-feira, a endereçar uma carta à ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Ana Mendes Godinho, para expor a situação de iminente encerramento da valência de creche da Criança e Vida (CEV) por falta de um parecer técnico da Segurança Social (SS) que autorizasse a associação a acolher mais dez crianças numa sala de 60m2 que estava vaga – onde já funcionou o pré-escolar, com 22 crianças – e advertir para o crescente desaparecimento destas respostas sociais que são da responsabilidade da administração central. “Falamos muito de descentralização e era conveniente que estas competências de licenciamento técnico [de creches] passassem para as autarquias”, considerou o autarca.

A discussão surgiu na sequência da exposição de Maria Luísa Magalhães, representante da associação Criança e Vida, no período de intervenção do público, que resumiu o processo de pedido de aumento da área de creche que se iniciou há três anos. “Em 2018, o projecto entrou na SS, em 2019 entrou na Câmara Municipal do Porto, na ARS Norte e na APNC [Autoridade Nacional de Emergência e Protecção Civil] e foi aprovado por todas, menos pela SS”, explicou. A instituição encontra-se actualmente com “défice financeiro” mas, segundo a munícipe, este seria “possível de ultrapassar” se houvesse autorização para acolher mais dez crianças. Sem luz verde da tutela, a CEV deverá encerrar a 31 de Agosto.

Valência de creches é “deficitária"

“A SS diz que temos que cumprir a lei com todas as especificidades, mas a lei prevê excepções [urbanísticas] e essas excepções aplicam-se ao nosso edifício”, advertiu, pois o edifício sito na Rua Miguel Bombarda encontra-se classificado como Imóvel de Interesse Municipal. Maria Luísa Magalhães afirmou que têm sido feitas “várias diligências para ultrapassar esta situação” devido à grande preocupação com as 180 crianças que “ficam sem sítio para onde ir” com o encerramento desta creche e da creche do Centro Social Paroquial de Cedofeita. “Isto é um problema social da nossa cidade”, atirou.

Em resposta, Fernando Paulo, vereador com o pelouro da coesão social, reconheceu que a cidade ainda é “deficitária” na resposta social de creche, mas esclareceu que esta questão requer a intervenção de dois departamentos diferentes, coesão social e urbanismo, sendo que “a coesão social pode necessitar muito de uma resposta, mas tem de se submeter às leis do urbanismo e à apreciação técnica do ponto de vista do edificado”. Uma vez que tem acompanhado de perto as diligências, referiu que “do ponto de vista social” há essa disponibilidade, mas “a parte técnica depende directamente de Lisboa”.

Estado tem de cumprir “função essencial"

O independente frisou que a solução “não parte da Câmara, parte da SS”, admitindo que “a SS não pode autorizar o funcionamento sem o licenciamento técnico, que compete aos serviços técnicos”. “A SS [Porto] já fez todas as diligências junto da tutela nesse sentido, mas diz que o processo não consegue interferir nem abreviar o procedimento.”

Face ao exposto, a comunista Ilda Figueiredo exortou a câmara a pedir “uma reunião à ministra da Segurança Social com urgência para ver esta situação”, pedido a que Rui Moreira assentiu, prenunciando já a resposta. “A senhora ministra vai mostrar toda a simpatia e compreensão, mas não se vai sobrepor aos serviços”, afirmou. Pelo PSD, o vereador Álvaro Almeida referiu que a tutela “tem de assumir politicamente a responsabilidade de aceitar estas alterações [na oferta da creche]”, já que “esta matéria não foi descentralizada”. 

Também o encerramento de quatro ATL da Obra Diocesana do Porto, cuja continuidade o executivo municipal conseguiu garantir por mais um ano para impedir a interrupção desta valência e dar tempo para que se encontre uma alternativa, elevou o tom crítico da discussão. “Quando vejo três instituições destas com problemas idênticos, começo a desconfiar que o problema não está nelas, mas no outro lado, na SS”, atirou o social-democrata. Em concordância, Fernando Paulo declarou que, se é preciso repensar o financiamento e as “novas respostas”, também é preciso “exigir que o Estado cumpra [o seu dever] numa função essencial, como cumpre na educação ou na saúde”.

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