O esforço nacional da Medicina Intensiva na crise pandémica

É admissível atribuir-se o número de óbitos na última vaga ao aumento da incidência e a uma população mais idosa na Região Centro, mas não ao défice no número de camas em cuidados intensivos. Houve pressão sobre o internamento em cuidados intensivos, mas o “caos” nunca existiu.

Passados alguns meses sobre o último pico pandémico SARS-CoV-2, é importante, para conhecimento dos cidadãos, analisar ponderadamente a capacidade de resposta da Medicina Intensiva e o recente aumento de capacitação durante a crise pandémica em todo o País, bem como o que se perspetiva para a sua consolidação. É exemplo o caso da Região Centro, onde tenho responsabilidades no âmbito da Comissão de Acompanhamento da Resposta Nacional em Medicina Intensiva (CANRMI).

Durante o último surto pandémico de SARS-CoV-2​, a resposta da Medicina Intensiva na área da ARS Centro expandiu-se para além do que era expectável, tendo registado um aumento na sua capacitação em mais de 150%, em fevereiro último. Este aumento permitiu manter, enquanto necessário, a resposta para doentes covid e não covid e, solidariamente, internar em serviços de Medicina Intensiva dos Centros Hospitalares de Leiria, Coimbra, Viseu, Cova da Beira e Castelo Branco doentes críticos SARS-CoV-2​ transferidos de hospitais das ARS Norte e ARS Lisboa e Vale do Tejo. Por isso, a Medicina Intensiva nos hospitais da ARS Centro no período em causa, face à expansão conseguida, deu as necessárias respostas assistenciais aos doentes críticos covid (e não covid), com o empenho dos profissionais envolvidos, contribuindo para o esforço do SNS. E na Região Centro, previamente à pandemia, o ratio de camas por cem mil habitantes era o mais baixo a nível nacional.

Em fevereiro de 2020 existiam na ARS Centro 80 camas críticas (75 camas ativas), tendo-se alcançado 202 camas disponíveis (mais 153%) em fevereiro de 2021, à custa das sucessivas expansões da capacitação conseguidas nos sete serviços de Medicina Intensiva. Foi um esforço coletivo assinalável durante a última fase (a mais grave) da tempestade pandémica pelo SARS-CoV-2​.

Para cobrir as necessidades em camas de Medicina Intensiva na ARS Centro, a CARNMI propôs em relatório aprovado pela sra. ministra da Saúde que a região fosse dotada, no futuro, com um total de 145 camas de cuidados intensivos de adultos, ou seja, quase o dobro de camas ativas face às previamente existentes. Se somarmos as camas de cuidados intensivos pediátricos (o que faz sentido) chegaremos a 9,3 camas por 100.000 habitantes, não longe da média europeia. Esta nova capacitação já saiu do papel. Os vários projetos estão a avançar e no final de dezembro 2021 teremos concluída a consolidação do redimensionamento da Medicina Intensiva na Região Centro conforme o preconizado pela CARNMI.  Paralelamente, face à falta de médicos intensivistas, está a ser feito, a nível nacional e na região, um assinalável investimento na sua formação, conquanto que em 2022, e historicamente, vamos ter os primeiros intensivistas que frequentaram o internato de formação específica.

Face a notícias vindas a público, é admissível atribuir-se o número de óbitos na última vaga ao aumento da incidência e a uma população mais idosa na Região Centro, mas não ao défice no número de camas em cuidados intensivos. Houve pressão sobre o internamento em cuidados intensivos, mas o “caos” nunca existiu.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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