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Geração de guerra: os jovens sírios chegam à idade adulta, após uma década de conflito

A nova geração de adultos sírios viveu a década da sua adolescência, “os melhores anos da vida”, num país em guerra. Agora, tentam libertar-se, através da profissão, da música, ou dos documentários online sobre a vida noutros países.

Ghenwa, Souna, DJ Karam e Ali, numa noite de bowling. REUTERS/Yamam al Shaar
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Ghenwa, Souna, DJ Karam e Ali, numa noite de bowling. REUTERS/Yamam al Shaar

Ghenwa está a tirar um curso para ser hospedeira de bordo. Ali é estudante de engenharia e Jawad DJ, de música electrónica. Os três sírios estão entre uma geração de jovens que entrou na idade adulta durante uma década de guerraVivem em Damasco, capital da Síria, poupada aos violentos bombardeamentos que destruíram a cidade de Alepo, mas a vida destes jovens adultos está longe de ser normal.

Uma década de conflito, sanções internacionais, um colapso financeiro no Líbano, país vizinho, e, agora, uma pandemia devastaram a economia na Síria e a queda no valor da moeda provocou escassez de bens essenciais, como trigo e combustível. Além das dificuldades económicas que ultrapassam, o acesso dos cidadãos ao resto do mundo também foi severamente limitado, sendo poucas as hipóteses de sair do país, seja para trabalho ou lazer.

A liberdade para viajar foi a principal motivação de Ghenwa quando decidiu tirar um curso para ser hospedeira de bordo, desistindo de estudar Arquitectura na universidade. "Sou síria e não posso viajar, excepto através desta oportunidade", disse Ghenwa, que usa apenas o primeiro nome por razões de segurança. "É a única hipótese de sentir que posso mover-me mais depressa... Para sentir a libertação das fronteiras."

Longe da sua cidade natal, Sweida, no sul da Síria, Ghenwa trabalhou em vários empregos para se sustentar, fazendo tudo, de trabalhar com crianças em serviços de oncologia a ser modelo. Encontra uma sensação de libertação quando está com os seus amigos, que partilham a paixão pela música electrónica.

"Estamos esfomeados por felicidade", disse Jawad, de 24 anos, DJ de música electrónica que regressou em 2019 a uma Síria que mal reconheceu, depois de passar os anos de guerra no Dubai por segurança. Jawad, formado em administração de empresas, diz que a música é uma fuga da dura realidade do país para onde regressou. "Foi um grande choque ver tudo sem luzes... Sem electricidade, mas, apesar de toda a exaustão e tristeza no rosto das pessoas, temos esperança de que tudo tenha solução", disse, citado pela Reuters.

Como Ghenwa, o seu sonho também é viajar e ver o mundo, mas, como jovem sírio, qualquer esperança de conseguir um visto para a Europa cai rapidamente por terra. Sem a possibilidade de ir de férias para Espanha, vê documentários online sobre o país com os amigos, uma fuga aos bem menos animadores noticiários na televisão.

Yara, de 33 anos, advogada durante o dia e DJ à noite, vive sozinha com os pais, depois de três dos seus irmãos terem saído para viver no estrangeiro. Costumava ter uma vida ocupada entre o trabalho, aulas de ioga, culinária e a sua paixão pela música, mas agora diz que só consegue cumprir uma tarefa por dia. "Abastecer o carro de combustível, por exemplo, após esperar horas numa fila", explica.

A advogada e DJ preferiu ficar na Síria durante todo o conflito, apesar dos perigos existentes. "Não gostei da forma como outros países estavam a tratar os sírios. Não queria perder o respeito que tenho aqui para receber uma atitude condescendente de pessoas que não sabem nada sobre nós. Mesmo que isso significasse viver a minha vida em perigo."

Yara estava perto do Palácio da Justiça, o principal tribunal no centro de Damasco, quando aconteceu um atentado suicida, em 2017. "Foi uma experiência horrível... Ver os corpos dos meus colegas à minha volta e, ao mesmo tempo, precisar de ajudar os feridos e levá-los rapidamente para o hospital."

Como Yara, Ali, estudante universitário de 25 anos, diz que podia falar durante dias sobre todas as coisas que o afectaram durante a guerra. "Não havia um dia que passasse sem que nos tirasse algo", contou. "Foi uma má experiência viver numa zona de guerra durante o que dizem ser os melhores dez anos da tua vida."

Ghenwa posa para uma fotografia no seu quarto.
Ghenwa posa para uma fotografia no seu quarto. REUTERS/Yamam al Shaar
"Sinto que tenho de me manter assim — despreocupado... se não, vou ficar louco", diz Karam.
"Sinto que tenho de me manter assim — despreocupado... se não, vou ficar louco", diz Karam. REUTERS/Yamam al Shaar
Ali, com luzes em volta da cabeça.
Ali, com luzes em volta da cabeça. REUTERS/Yamam al Shaar
Souna, de 25 anos, gestora de empresas. "Honestamente, a vida na Síria é difícil e muito cansativa mas... por vezes, eu gosto das dificuldades. As coisas avançam muito devagar... A sensação de ver aqueles de quem gosto por perto compensa pelas dificuldades que enfrento", disse.
Souna, de 25 anos, gestora de empresas. "Honestamente, a vida na Síria é difícil e muito cansativa mas... por vezes, eu gosto das dificuldades. As coisas avançam muito devagar... A sensação de ver aqueles de quem gosto por perto compensa pelas dificuldades que enfrento", disse. REUTERS/Yamam al Shaar
Aya, chef de cozinha de 24 anos, faz uma tatuagem no pescoço.
Aya, chef de cozinha de 24 anos, faz uma tatuagem no pescoço. REUTERS/Yamam al Shaar
Roleen, modelo de 26 anos.
Roleen, modelo de 26 anos. REUTERS/Yamam al Shaar
Ali fuma um cigarro com uma amiga.
Ali fuma um cigarro com uma amiga. REUTERS/Yamam al Shaar
Yara toca música electrónica, em casa de Jawad.
Yara toca música electrónica, em casa de Jawad. REUTERS/Yamam al Shaar
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Jawad e os amigos passam tempo livre na sua casa.
Jawad e os amigos passam tempo livre na sua casa. REUTERS/Yamam al Shaar
Jawad fuma um cigarro.
Jawad fuma um cigarro. REUTERS/Yamam al Shaar
Jawad toca música electrónica, em sua casa.
Jawad toca música electrónica, em sua casa. REUTERS/Yamam al Shaar
Ali e Jawad, em casa de Jawad.
Ali e Jawad, em casa de Jawad. REUTERS/Yamam al Shaar
Souna tira uma selfie no seu quarto. "Eu quero viajar, visitar o mundo, e voltar para a Síria", disse.
Souna tira uma selfie no seu quarto. "Eu quero viajar, visitar o mundo, e voltar para a Síria", disse. REUTERS/Yamam al Shaar
Ghenwa posa para a fotografia, na casa de banho, em casa de uma amiga.
Ghenwa posa para a fotografia, na casa de banho, em casa de uma amiga. REUTERS/Yamam al Shaar
Souna e Ghenwa conversam.
Souna e Ghenwa conversam. REUTERS/Yamam al Shaar
Ali e Jawad.
Ali e Jawad. REUTERS/Yamam al Shaar
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Ghenwa dança, no dia do seu aniversário.
Ghenwa dança, no dia do seu aniversário. REUTERS/Yamam al Shaar
Ghenwa, que em breve se tornará hospedeira de bordo.
Ghenwa, que em breve se tornará hospedeira de bordo. REUTERS/Yamam al Shaar
Reflexo do presidente da Síria, Bashar al-Assad, num espelho.
Reflexo do presidente da Síria, Bashar al-Assad, num espelho. REUTERS/Yamam al Shaar
Ghenwa e Assala, estudante de arquitectura de 21 anos, preparam-se para ser modelos para um projecto de um estudante. "Vou, sem dúvida, deixar a Síria quando estiver licenciada", disse Assala.
Ghenwa e Assala, estudante de arquitectura de 21 anos, preparam-se para ser modelos para um projecto de um estudante. "Vou, sem dúvida, deixar a Síria quando estiver licenciada", disse Assala. REUTERS/Yamam al Shaar
Ghenwa e Assala dançam numa festa de música electrónica.
Ghenwa e Assala dançam numa festa de música electrónica. REUTERS/Yamam al Shaar
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