Silva Carvalho e os pides detidos em Peniche. "Tem que se ser muito forte para não fazer aquilo que nos fizeram"

Quando se deu o 25 de Abril, o então tenente Silva Carvalho estava preso na Trafaria por ter participado na tentativa de golpe contra o regime 40 dias antes, a 16 de Março. Saiu de uma prisão, mas poucos dias depois estava a entrar noutra, em Peniche, para comandar os militares que tomaram conta do Forte.

Com apenas 31 anos, o então tenente Silva Carvalho viu o 25 de Abril mudar radicalmente a sua vida: estava preso e passou a comandar uma prisão para onde foram levadas figuras destacadas da ditadura, entre elas Silva Pais, último director da PIDE. Ali viveu momentos tensos, "havia gente com espírito de vingança", mas a experiência na Guerra Colonial num dos piores palcos possíveis — a Guiné — ajudou-o a ter sangue frio em Peniche.

O agora coronel comandou as operações no Forte de Peniche entre Abril de 1974 e Agosto de 1975 e nunca mais tinha lá voltado. A convite do PÚBLICO, 46 anos depois, Silva Carvalho voltou a cruzar as muralhas da antiga prisão e a desfiar as memórias daquele período revolucionário muito confuso. Conta que chegou a dizer: "Se é para fazer o que vos fizeram, então eu escuso de estar aqui".

Um relatório da Comissão de Averiguação de Violências sobre Presos Sujeitos às Autoridades Militares, realizado em Julho de 1976 e que tinha sido mantido em segredo até Fevereiro deste ano, denuncia vários abusos cometidos por forças militares e civis entre o 25 de Abril de 1974 e 25 de Novembro de 1975 mas sublinha, como "ponto positivo", o funcionamento do Forte de Peniche como "não tendo sido alvo de quaisquer reparos, antes pelo contrário".

Silva Carvalho recorda diversos momentos onde teve oportunidade para mostrar que podia ser diferente dos seus antecessores. Como aquela vez em que viu um bebé a beijar o vidro do parlatório numa visita ao pai, preso. Os vidros foram retirados, porque "não tinham nada a ver com questões de segurança", recorda. Mas logo surgiram as vozes indignadas a questionar o gesto. "Chatearam-nos tantos que voltámos a pôr os vidros. E eu nunca mais aqui entrei".

"Acaba por ser normal", comenta. "A gente vinha de uma situação muito complicada. E tem que se ser muito forte para não fazer aos outros o que nos fizeram a nós."

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