Requalificação do Bom Sucesso avança “em cumprimento do caderno de encargos”

O pedido de licenciamento para o projecto do antigo mercado foi aprovado pela Câmara do Porto e obteve parecer favorável da DRCN. Além de manter a praça da alimentação e venda de frescos, o espaço terá um supermercado, 26 bancas e 40 lojas e restaurantes.

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Paulo Pimenta

Na sexta-feira foi anunciado que o pedido de licenciamento para o projecto de requalificação do Mercado do Bom Sucesso (MBS) foi deferido pela Câmara Municipal do Porto (CMP). Em declarações à Lusa, o director do espaço, Marco Massano, revelou que o projecto “está a ser desenvolvido e executado em articulação e diálogo com a autarquia, proprietária do edifício, e a Direcção Regional de Cultura do Norte (DRCN), em cumprimento do caderno de encargos e demais condicionantes em vigor”. O projecto, que pressupõe a instalação de 26 bancas, 40 lojas e restaurantes e de um supermercado do grupo Sonae naquele espaço, tem suscitado alguma discussão nos últimos anos, em particular devido à possibilidade de alteração da funcionalidade da tradicional venda de frescos para se acomodar aquela unidade comercial.

Marco Massano confirmou à Lusa que será ali construída uma unidade Continente Bom Dia com “um conceito orientado para a comunidade local e mantendo as funções mais tradicionais do Mercado do Bom Sucesso, com uma oferta de frescos e de outros produtos de conveniência”. Mais acrescenta que “esta unidade está em conformidade com o caderno de encargos, ocupando um espaço que estava vago há mais de um ano”.

O cumprimento dos trâmites legais por parte da Mercado Prime, estrutura empresarial pertencente ao Grupo Amorim, e a Sonae Sierra, que assumiram a concessão do MBS depois da cessação da gestão da Mota-Engil, foi atestado por Rui Moreira em reunião do executivo esta segunda-feira. De acordo com o autarca, “a Câmara foi interpelada no sentido de autorizar uma cedência de posição contratual”, procedimento que exigiu “a verificação da credibilidade dos proponentes na prestação de garantias equivalentes e do cumprimento do que está no programa para ir a concurso”. “Que fique claro que, sobre essa matéria, a coisa foi verificada pelos serviços e por mim”, afiançou.

Projecto teve pareceres favoráveis da DRCN e DGPC

O presidente da câmara do Porto respondia ao socialista Manuel Pizarro, que admitiu não ter “nada a dizer” sobre o assunto, “desde que esteja tudo absolutamente correcto do ponto de vista legal”. O vereador do PS quis “deixar a nota de que aconteceu o que antecedeu a vereação do PS, nomeadamente o arquitecto Manuel Correia Fernandes [ex-vereador do urbanismo eleito pelo PS em 2013]”, que “sempre disse que a transformação do espaço, nos termos do concurso que a câmara fez na altura, ia acabar com o Bom Sucesso como um supermercado em vez de um mercado” e lamentou a parca “estratégia de diversificação comercial da cidade”. “Quanto ao uso”, retorquiu Rui Moreira, “é aquele que foi decidido na altura”. 

Em Dezembro de 2019, aquando do pedido de autorização da transmissão do capital social da Sociedade Mercado Urbano - Gestão Imobiliária, S.A., aprovado com o voto contra da CDU e a abstenção do PS, Rui Moreira garantiu haver “determinadas salvaguardas” no caderno de encargos que impediriam o edifício de “ser transformado num supermercado”. Nessa reunião do executivo, Vítor Vieira, vereador da CDU, contrapôs as afirmações do independente, revelando que já estavam abertas as candidaturas de emprego para o futuro supermercado. Além disso, acrescentou que o partido se posicionava contra a transmissão de capital, alertando que uma das empresas envolvidas no negócio tinha sede fiscal na Holanda e, portanto, não iria pagar impostos em território nacional. 

O processo necessitou, ainda, do aval da Direcção Regional de Cultura do Norte (DRCN), uma vez que o MBS está classificado, desde 2011, como Monumento de Interesse Público, e “qualquer alteração infra-estrutural no edifício está sujeita a parecer prévio”. O parecer favorável por parte da DRCN e da Direcção-Geral do Património Cultural (DGPC) foi emitido a 2 de Dezembro de 2020, esclareceu à Lusa a DRCN, entidade que considerou que “a intervenção interior proposta não produz alterações significativas no carácter espacial e na identidade formal do edifício, não agravando o impacto da sua anterior transformação”. Mais recentemente, a 8 de Fevereiro, a DRCN e DGPC deram parecer favorável às alterações do projecto que visam a “remodelação do espaço das fracções ainda ocupadas com um pequeno mercado de alimentação e a criação de um acesso directo do exterior, a partir da Praça do Bom Sucesso, através de uma das lojas de rua que é integrada na área interior a intervir, introduzindo degraus e demolindo a laje do mezanino existente”.

Executivo deveria discutir licenciamentos, diz CDU

Em comunicado enviado esta segunda-feira às redacções, a CDU lembra que votou contra a concessão feita em 2011, invocando a “descaracterização do conceito de mercado de frescos” e o “facto de a operação constituir um mau negócio, pois na prática a CMP iria receber menos do que então se recebia dos comerciantes que ali trabalhavam”. Em 2019, os comunistas advertiram para a “possibilidade da pequena e lúgubre parte que fora mantida com a designação de ‘mercado de frescos’ poderem vir a ser afastados e, juntamente com outras lojas cujos contratos de arrendamento não foram renovados, ser o espaço transformado num supermercado do grupo Sonae.” Face à conclusão do processo, e “dada a classificação de interesse municipal [desde 2009] do imóvel, a CDU reitera, como já propôs, que estes projectos de licenciamento deveriam ser decididos no executivo municipal e não por um vereador só”. 

Ao PÚBLICO, a vereadora da CDU, Ilda Figueiredo, afirma que este “é o culminar de um processo que aparece como consumado, mas que nunca veio à câmara” e lamenta que “não tenha havido uma possibilidade prévia de discussão no conjunto do executivo antes da formulação da decisão”. Sobre este assunto, a autarquia assinala que “desde o início do actual mandato, no pelouro do urbanismo, já foram praticados mais de 9200 actos, ao abrigo da delegação de competências da Câmara no Presidente - aprovada sem qualquer voto contra - e na subdelegação de competências no vereador”, sendo que “a delegação ou subdelegação não exclui o licenciamento de edifícios classificados”.

Notícia actualizada às 19h50 com resposta da Câmara Municipal do Porto
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