Este ano a lampreia come-se em casa

Há quem as entregue já amanhadas e prontas a cozinhar, restaurantes que servem em take-away e até carrinhas que todos os dias circulam entre Monção e Lisboa para que o divino ciclóstomo não falte aos apreciadores. Em arroz, à bordalesa, grelhada ou assada no forno? João Guterres explica como preparar e servir a lampreia do rio Minho.

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Ele próprio se descreve como um irrequieto coleccionador de aromas e sabores, mas João Guterres é sobretudo um incansável cuidador dos saberes e tradição gastronómica, que defende e divulga. “Receitas com história que devemos preservar. Do ancestral receituário dos conventos e mosteiros, aos quartéis, casas senhoriais e gente das aldeias”, como explica no prefácio de Peixes do Rio Minho – Receitas com história, o livro recentemente editado com a colaboração de investigadores das universidades do Porto e de Aveiro.

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Ele próprio se descreve como um irrequieto coleccionador de aromas e sabores, mas João Guterres é sobretudo um incansável cuidador dos saberes e tradição gastronómica, que defende e divulga. “Receitas com história que devemos preservar. Do ancestral receituário dos conventos e mosteiros, aos quartéis, casas senhoriais e gente das aldeias”, como explica no prefácio de Peixes do Rio Minho – Receitas com história, o livro recentemente editado com a colaboração de investigadores das universidades do Porto e de Aveiro.

Essencial também nestes tempos em que os restaurantes estão de portas fechadas e os amantes não podem perder aquela que é provavelmente a época mais palpitante do calendário gastronómico. Um exaustivo capítulo dedicado à lampreia, onde, a par da sua história e significado, explica também todos os segredos e truques para as amanhar e cozinhar. Ou seja, já ninguém se pode queixar da falta dos restaurantes para celebrar e saborear esta época sempre tão aguardada e especial.

E este, apesar dos contratempos, parece ser até um ano particularmente propício. “Está boa e ovada. Tem a vantagem de desovar de forma mais sossegada, o que vai fazer também com que nos próximos anos haja mais lampreia”, vaticina João Guterres. Outra vantagem são os preços mais moderados, consequência da baixa na procura, que está também a fazer com que o meixão e o sável estejam igualmente mais acessíveis.

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A par dos restaurantes que a estão a cozinhar para take-away ou entregas em casa um pouco por todo o país, também os pescadores do Alto Minho estão a organizar-se para entregas de lampreia. Nuns casos já amanhadas, com todos os temperos e pronta a cozinhar, mas também vivas, para servirem os restaurantes ou aqueles que as preferem amanhar e preparar a gosto.

Há carrinhas carregadas de lampreia que todos os dias viajam entre as margens do rio Minho e Lisboa, mas as entregas também chegam até ao Algarve e outras paragens. Depende das encomendas.

“De preferência viva, fêmea e com ovas”, aconselha Guterres aos mais perfeccionistas, explicando que as ovas tanto podem reforçar a consistência e sabor do refogado, como ser retiradas. Neste caso, a opção é entre um refogado (na mesma calda), para servir em tostas de pão frito em azeite, grelhadas ou fritas em azeite para servir com salada de agriões ou tomate.  

Quanto às receitas e modos de reparação, o livro descreve com pormenor o arroz de lampreia ou estufada à moda de Valença, empadinhas de lampreia, assada no forno, assada na brasa, fumada de Valença, e até uma sopa de lampreia.

A preferência do autor vai para a versão assada no forno com batatinhas, uma receita que no Alto Minho “está a criar mais adeptos e muito fácil de executar”. Uma forma de preparação muito conhecida, “que esteve adormecida, mas que há uns bons dez anos saiu à luz e voltou a ser utilizada”, descreve.

Depois de amanhada, coloca-se numa assadeira, rega-se com um copo de Vinho Verde branco e ladeia-se com batata torneadas. “Temperar com sal e pimenta, noz-moscada e cravinho (contidos), um dente de alho e meia cebola cortados em pequenos gomos. Salpicar com salsa picada e um fio de azeite curto, já que a lampreia vai soltar a sua gordura natural, suficiente para que a assadura seja perfeita”, como se explica no livro.

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O arroz de cabidela e a receita à bordalesa, cuja base de preparação é idêntica, continuam a ser as de maior procura e as que oferecem os restaurantes. No caso do take-away ou das entregas em casa, alguns optam apenas pelo estufado à bordalesa, uma vez que o arroz deve ser sempre servido caldoso, o que não é compatível com as demoras da viagem.

No caso do take-away montado pelos restaurantes de Penacova com a Câmara Municipal e a Confraria da Lampreia para funcionar até ao final de Fevereiro, as doses de lampreia do Mondego são entregues pré-confeccionadas acompanhadas de um saco com as respectivas doses de arroz e as instruções para completar o cozinhado. E até doçaria regional e um folheto com a história local da tradição da lampreia.

Este ano come-se em casa, mas a lampreia não pode faltar nunca aos seus fiéis e devotos apreciadores.