Confinados, 74% dos alunos da Universidade de Coimbra pensaram em desistir de estudar

Associação Académica de Coimbra fez levantamento sobre impacto do confinamento nos estudantes. Apenas 26% responderam que nunca pensaram em abandonar o ensino superior.

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paulo pimenta

Durante o confinamento, sete em cada dez estudantes da Universidade de Coimbra (UC) pensaram, pelo menos uma vez, em abandonar o ensino superior. Esta é uma das conclusões do estudo O Impacto do Confinamento na Academia de Coimbra, promovido pela Associação Académica de Coimbra (AAC).  

Apenas 26% dos estudantes responderam que esse pensamento nunca lhes ocorreu.  Quarenta por cento dos alunos da UC disseram que pensaram “muitas vezes” ou “sempre” em abandonar os estudos. Olhando para as respostas a esta pergunta, observa-se que a percentagem de respostas “muitas vezes” ou “sempre” é mais elevada, se o estudante for natural de regiões do interior do país, seja do Norte, centro ou do Sul.  

O presidente da direcção-geral da AAC, João Assunção, que falou com o PÚBLICO à margem da apresentação dos resultados do levantamento, que decorreu nesta sexta-feira, no edifício da AAC, explica também que esta alta percentagem está relacionada com dois factores: a perda de rendimentos do agregado familiar e uma certa desilusão com o ensino à distância.  

“O ensino digital está muito aquém das expectativas dos estudantes.” E acrescenta: “Alguns acreditam que é preferível adiar a formação e, eventualmente, retomar quando surgir a normalidade.” Dá exemplos dos estudantes de Engenharia, “que não podem ir a laboratórios”, e de Medicina, “que não têm contacto com doentes”, como cursos que são radicalmente alterados pelo ensino à distância. Daí que os estudantes concluam que “o ensino digital deve ser temporário e o último recurso de todos, uma vez que põe em causa a qualidade no ensino e nas instituições de ensino superior”. 

A situação económica também pesou nestas respostas. “Dos estudantes inquiridos 33,45% referem repercussões negativas nos rendimentos do agregado familiar”, lê-se no estudo. Desse universo, 60,6% revelam que “houve uma quebra substancial nos rendimentos, apesar da manutenção do emprego”. Há 9,6% de estudantes que mencionaram que “pelo menos um dos elementos do seu agregado familiar ficou desempregado durante o confinamento”.  

Todas estas pressões tiveram impacto na saúde mental. As respostas mostram que 66% dos estudantes se sentiram ansiosos muitas vezes ou sempre e que 55% se sentiram frustrados. Sentimentos como apatia (34%), angústia (46%), tristeza (34%) e confusão (40%) também tiveram percentagens elevadas. Há também um dado que, para João Assunção, “é preocupante”: 20% dos estudantes revelam “ter tido um ou mais pensamentos suicidas durante o confinamento”.  

Apesar de os resultados atestarem que o confinamento teve forte impacto na saúde mental, a percentagem de estudantes que admite recorrer a ajuda especializada quando terminar o confinamento é de apenas 18%. A justificação mais vezes apontada é o preço elevado.  

O dirigente estudantil explica que a Universidade de Coimbra tem um serviço de apoio psicológico e que até será, “das instituições de ensino superior, a que mais passos deu a tentar combater este fenómeno” [os problemas de saúde mental no ensino superior]. Os estudantes, porém, entendem que é preciso “uma resposta central”, ou seja, “um mecanismo de intervenção, como a criação de uma linha psicológica específica para estudantes dos ensinos secundário e superior” no Serviço Nacional de Saúde. A direcção da AAC vai enviar este documento a todos os grupos parlamentares, explica João Assunção, e vai também requerer uma audição ao Governo.  

“Pareceu-nos fundamental fazer um quadro geral do impacto do confinamento nas academias”, explica. Para fundamentar as reivindicações, a AAC queria ter um mosaico dos impactos “económicos e pedagógicos” da pandemia na saúde mental.

Os estudantes entendem que é necessário “assegurar a redução dos custos de manutenção no ensino superior”, nomeadamente prosseguindo o trajecto de redução das propinas. Deveria também ser inserido um “tecto máximo” às propinas para o segundo ciclo do ensino superior.  

O estudo foi montado com a colaboração voluntária de “especialistas ligados à análise de dados e estatística” que já passaram pela academia de Coimbra, refere João Assunção. Foram inquiridos 1484 estudantes das oito faculdades da Universidade de Coimbra, a grande maioria dos quais de nacionalidade portuguesa (95,7%). Os dados foram recolhidos entre 17 e 31 de Janeiro de 2021 através de inquéritos online, já depois de ter entrado em vigor o novo estado de emergência que previa novo período de confinamento, no dia 15 de Janeiro. A margem de erro é 3% e o intervalo de confiança 95%.

O levantamento faz também uma radiografia à situação interna da AAC, que, além de representar os estudantes da universidade, tem dezenas de secções culturais e desportivas. O prejuízo nas contas do último ronda o meio milhão de euros (para o qual muito contribuíram o cancelamento da Queima das Fitas e da Festa das Latas). A crise sanitária “levou à desistência de 600 atletas” dos escalões de formação das secções desportivas, o que agrava a sua saúde financeira.  

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