Uma Europa mais digital

Existe mais vida para além da pandemia e a presidência portuguesa da UE dedicará uma especial relevância ao domínio digital, seguindo três princípios orientadores.

Portugal assumirá a Presidência do Conselho da União Europeia dentro de poucos dias e, considerando as experiências passadas (1992, 2000 e 2007), é mais uma oportunidade de ouro para deixarmos uma marca distintiva no processo da construção europeia.

O atual contexto, fortemente marcado pela covid-19 e pela crise social e económica que lhe está subjacente, condicionará a agenda e, inexoravelmente, grande parte dos esforços serão dedicados à implementação dos apoios financeiros para a recuperação das empresas e dos empregos, assim como à execução dos planos de vacinação coletiva nos diversos Estados-membros.

Mas existe mais vida para além da pandemia e a presidência portuguesa da UE (PPUE) dedicará uma especial relevância ao domínio digital, seguindo três princípios orientadores: a) temos a convicção de que a transição digital é um forte motor para a recuperação económica sustentável, juntamente com a transição verde; b) temos de reforçar a qualificação digital dos cidadãos e das empresas apoiada em soluções tecnológicas fiáveis, éticas e neutras; c) queremos defender a democracia digital, assente nos valores humanistas e no combate à desinformação, fazendo da Europa uma referência global.

E como é que estas prioridades políticas se concretizam? Por diversas formas, desde logo, dando sequência às negociações de pacotes legislativos de enorme oportunidade e relevância. Destaque óbvio para o “Pacote dos Serviços Digitais” que, regulando as grandes plataformas digitais, visa fomentar a competitividade do Mercado Único Digital, através da promoção de condições equitativas para todas as empresas, em especial as PME e as “startups”. Acresce que, num tempo em que “os dados são o novo petróleo”, a PPUE pretenderá fomentar o debate em torno do livre fluxo de dados, potenciando o acesso e a partilha dos mesmos (no setor público e privado) no Mercado Único. Não esquecendo, naturalmente, a digitalização da administração pública – tão cara ao nosso país – e criação de uma “identidade digital europeia” que facilite de forma segura o interface com os serviços públicos e privados no ambiente digital. Por último, mas não em último, a conclusão das negociações em torno da tão esperada privacidade das comunicações eletrónicas é um elevado desiderato da PPUE.

Mas a história de Portugal é marcada por construirmos pontes com outros mundos e assim será uma vez mais durante o primeiro semestre de 2021. Pretendemos que a UE se afirme como líder global no domínio digital e na economia de dados, mas para o efeito é essencial construir uma sólida infraestrutura e redes de conexões internacionais, através, por exemplo, da inauguração da primeira ligação por cabo submarino entre a América do Sul (Brasil) e a Europa (Portugal), fator decisivo para aproximar empresas e dar escala ao mercado digital europeu.

Portugal é, hoje, justamente reconhecido como “Nação Startup”, pela prioridade que tem dado ao empreendedorismo digital, donde é justificado que almejemos o mesmo estatuto para a Europa, como espaço onde existam condições regulatórias, financeiras e outras que permitam o aparecimento e o crescimento de jovens empreendedores, pondo termo à fuga de cérebros para outras regiões do mundo.

Finalmente, tal como o Tratado de Lisboa faz parte integrante do acervo comunitário, a PPUE tem a ambição de deixar para a posteridade a “Declaração de Lisboa sobre a Democracia Digital com Propósito”. Isto é, um manifesto com as bases para um modelo europeu de transformação digital assente numa forte dimensão humana e nos valores democráticos, nos direitos e liberdades dos cidadãos, colocando a UE na dianteira global de um novo mundo digital, mais seguro, confiável e competitivo.

Além das negociações e debates próprios, que terão lugar nas instituições comunitárias, ao longo do primeiro semestre de 2021 sob a égide da PPUE, haverá ainda oportunidade para que estas prioridades digitais componham a agenda de dois importantes eventos: o “Dia Digital”, em março, e a “Assembleia Digital”, em junho.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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