Aniversário de médico em Aljustrel colocou dois clínicos de quarentena

À crónica escassez de médicos que se verifica no Alentejo, juntam-se os clínicos que são infectados durante o exercício da sua profissão ou nos seus momentos de convívio.

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Paulo pimenta/Arquivo

O Alentejo já não é a aldeia do Astérix que se revelou durante a primeira vaga pandémica. O estatuto de região segura que metia medo à covid-19 convenceu, no último Verão, milhares de veraneantes vindos de Espanha e dos mais diversos pontos de Portugal a procurar o bronzeado na praia fluvial da mina de S. Domingos e nas zonas balneares em redor da albufeira do Alqueva, com toda a confiança. Com a chegada do Outono, a saudável realidade que reinou durante o período estival deu lugar ao medo. Os hospitais e centros de saúde passaram a ser focos de contágio, numa região onde os médicos e enfermeiros escasseiam e os transportes públicos deixaram de servir um progressivo número de comunidades isoladas, que se viram privadas da prestação de cuidados médicos regulares, como é o caso de freguesias de Aljustrel, onde dois médicos entraram em quarentena.

Os dramáticos acontecimentos que deram projecção internacional ao lar de Reguengos de Monsaraz iniciaram, como agora se diz, o novo normal. Os focos infecciosos foram ponteando a região.

No início de Outubro, 36 profissionais do hospital de Beja foram infectados com covid-19. De um dia para o outro, nove médicos, 17 enfermeiros, seis assistentes operacionais, dois assistentes técnicos e dois técnicos superiores de diagnóstico e terapêutica, foram colocados em isolamento profilático, lançando a consternação nos próprios prestadores de cuidados médicos e reduzindo assim o seu número quando eram mais precisos. Quase 60 profissionais da unidade hospitalar entraram em quarentena.

Decorrido um mês dos acontecimentos de Beja, no dia 10 de Novembro, dois médicos que prestam serviço em Aljustrel entraram de quarentena após a confirmação que tinham sido infectados com a covid-19. O centro de saúde foi encerrado para desinfecção e os quase 10 mil habitantes do concelho passaram a ter um único médico. A Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo (ULSBA) adiantou ao PÚBLICO que os cuidados médicos “são assegurados pelos seis enfermeiros do centro de saúde que se mantêm ao serviço”. Os cuidados médicos de todo o concelho “são assegurados por um médico na sede da unidade funcional (dois outros médicos estão em isolamento profiláctico)”.

Aquela entidade acrescenta que “há atendimento domiciliário de enfermagem aos utentes da sede e de todas as extensões, sob solicitação destes”.

O PÚBLICO deslocou-se à freguesia de S. João de Negrilhos, no concelho de Aljustrel, e nos contactos que manteve com alguns elementos da população, maioritariamente idosa e condicionada pelas doenças crónicas que obrigam ao reforço do receituário médico, é comum a preocupação pelo atraso que se verifica nas consultas que não estejam associadas à pandemia. Um dos depoimentos recolhidos salienta que a sua “consulta da diabetes foi adiada” e, noutro caso, “a esposa já tem a operação às varizes atrasada um ano”.

Quando a situação, depois da primeira vaga “já estava praticamente normalizada no que diz respeito à assistência médica, veio a segunda vaga e desorientou tudo novamente”, queixa-se outro morador. Neste momento, na freguesia não há infectados com a covid-19. Na primeira vaga houve dois infectados e “um deles com 89 anos safou-se, mas a mulher morreu por outras causas. O homem tinha dois filhos em casa e não apanharam, mas um que vivia fora e veio de visita ficou contagiado”, explicam os moradores, que pedem anonimato.

Para ajudar a contornar as carências, a autarquia “recebe os pedidos de medicamentação e envia-os para a coordenadora do centro de saúde, como acontecia durante a primeira vaga da pandemia”, explicou ao PÚBLICO o presidente da Junta de S. João de Negrilhos, Rui Pedro Faustino.

O autarca adiantou que as dificuldades que hoje condicionam a prestação dos serviços de saúde tiveram a sua origem no decorrer do aniversário de um dos médicos. “Um seu colega deslocou-se à sua residência para o felicitar e do convívio entre os dois surgiu o contágio que terá tido origem em meio hospitalar no centro de Saúde de Castro Verde ou no Hospital de Beja onde o médico infectado presta serviço.” Pedro Faustino acrescenta que mais nenhum dos convivas deu positivo.

As consequências do contágio que envolve dois médicos do centro de saúde de Aljustrel causaram “uma diminuição na prestação de cuidados médicos e de enfermagem”, mas o autarca acredita que “na próxima semana volte tudo ao normal”.

A ULSBA confirma que houve encerramento de extensões do centro de saúde nas freguesias de Messejana, Ervidel e S. João de Negrilhos e que não houve substituição dos médicos em quarentena. Quanto à origem do foco, dizem desconhecer.

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