MEO oferece sete euros à hora a enfermeiros e farmacêuticos para trabalharem na Linha SNS24

Valores propostos aos enfermeiros e farmacêuticos são considerados “indignos” pela bastonária da Ordem dos Enfermeiros, Ana Rita Cavaco. BE já questionou Ministério da Saúde.

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Os enfermeiros e os farmacêuticos estão a ser contratados para triar, aconselhar e acompanhar doentes com covid-19 sem sintomas Daniel Rocha (arquivo)

No início deste mês, o Governo anunciou a contratação de mais 650 profissionais para a linha SNS24, bem como a abertura de dois novos call centers, mas os contratos que estão a ser propostos a enfermeiros e farmacêuticos oferecem uma remuneração de apenas sete euros à hora, o que está bastante abaixo do que um enfermeiro recebe no Serviço Nacional de Saúde (SNS).

“Num momento em que os profissionais de saúde se mostram fundamentais para o país e para o contexto em que país se encontra, não se compreende que se pretenda fazer reforço de profissionais com condições precárias e com degradação dos salários”, acusa o Bloco de Esquerda, cujo grupo parlamentar fez uma pergunta ao Governo sobre esta matéria, questionando o Ministério da Saúde sobre o montante pago à Altice (empresa detentora da MEO) por cada profissional do serviço SNS24.

Os profissionais que estão a ser contratados terão como função assegurar o atendimento à distância de utentes com covid-19 assintomáticos, usando um computador, um tablet ou um smartphone a partir de casa, “em distritos onde o SNS 24 não possui centros de atendimento”. A operadora MEO, que é a entidade que gere a linha, oferece os referidos sete euros por cada hora de trabalho, além de um seguro para acidentes de trabalho e de uma acção de formação à distância com a duração de uma hora, deixando aos candidatos a possibilidade de escolherem um turno de quatro horas diárias consecutivas, num intervalo que abarca das 7h00 às 22h00. 

Quando o pedido de divulgação desta operação de recrutamento chegou ao gabinete da bastonária da Ordem dos Enfermeiros, esta diz que se recusou a divulgá-lo. “Se é para contar tostões que contem sozinhos, porque os enfermeiros já estão a dar tudo o que podem dar no SNS”, reagiu Ana Rita Cavaco ao PÚBLICO, para acrescentar: “O valor que oferecem não é aceitável, há países a oferecer o triplo do salário aos enfermeiros, com casa e contratos, e, ao que me dizem, muitos dos que se candidataram estão a ser chamados para trabalhar nos call centers e não em casa como foi anunciado.”

A bastonária acrescentou, aliás, que o presidente dos Serviços Partilhados do Ministério da Saúde (SPMS), responsável pela Linha SNS24, Luís Goes Pinheiro, terá concordado que “não são condições atractivas para os enfermeiros” e ter-se-á disposto a tentar negociar com a operadora a respectiva melhoria. Ao PÚBLICO, a SPMS limitou-se a sustentar, contudo, que “a SPMS e as ordens profissionais não constituem parte nos contratos profissionais de saúde do SNS24, pelo que a sua intervenção esgota-se na promoção da divulgação das oportunidades de emprego”. 

Em Outubro, o secretário de Estado da Saúde, Diogo Serras Lopes, prometeu que os 650 novos profissionais da Linha SNS24 iriam iniciar funções ainda no Outono. Somando-se aos 1350 profissionais que já lá trabalham, aquela linha passaria a contar com mais de dois mil profissionais, o que garantiria, à partida, a diminuição dos tempos de espera para o atendimento num serviço que chega a somar 300 mil contactos por mês no decurso da pandemia. Desde o início de Novembro, a Linha SNS24 passou também a emitir declarações provisórias de isolamento profiláctico para pessoas que contactaram com indivíduos infectados pelo novo coronavírus para justificar faltas ao trabalho. 

A Ordem dos Farmacêuticos optou por divulgar a acção de recrutamento, mas fez questão de se demarcar das condições propostas. “A Ordem não tem qualquer envolvimento nas condições contratuais e remuneratórias oferecidas aos candidatos farmacêuticos”, lê-se no seu site.

As questões quanto às condições oferecidas aos enfermeiros para trabalhar no combate à pandemia não se cingem à Linha SNS24. Noutra pergunta, o grupo parlamentar do BE questiona o Ministério da Saúde a propósito do facto de o Hospital Garcia de Orta estar a recorrer a uma empresa de trabalho temporário para recrutar enfermeiros para trabalhar com doentes com covid-19 nos serviços de urgência e nos cuidados intensivos do hospital. Estes contratos estarão a ser realizados para um horário de 35 horas semanais, pagas a 8,5 euros à hora. “O reforço do SNS não pode, nem deve ser temporário”, acusa o BE, que quer saber se esta prática está a ser replicada noutros hospitais. “O valor que pagam aos enfermeiros podia ser maior se optassem por deixar de perder dinheiro com intermediários”, reagiu, por seu turno, a bastonária da Ordem dos Enfermeiros.

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