Covid-19: investigadores querem testes alargados a quem tem dor de cabeça e obstrução nasal

Sintomas mais frequentes nos infectados com idades entre os 15 e os 39 anos foram a dor de cabeça, a perda do olfacto e a obstrução nasal, concluiu estudo recente realizado em 18 hospitais europeus. A seguir surgiam a tosse, a falta de força e as dores musculares. A febre foi relatada em menos de metade dos casos.

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Daniel Rocha

Um grupo de investigadores da Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP) recomenda o alargamento dos actuais critérios para se fazerem testes de covid-19, incluindo sintomas para além dos que estão previstos na norma sobre caso suspeito da Direcção-Geral da Saúde (DGS). Sintomas ligeiros como dor de cabeça, corrimento ou obstrução nasal, dor de garganta e dores musculares devem também ser levados em conta e valorizados, preconizam. A actual norma da DGS considera que um caso é suspeito de infecção pelo novo coronavírus apenas quando há ou tosse ou febre, falta de ar, perda de olfacto ou de paladar.

Os quatro investigadores sugerem ainda ainda que se adopte “uma estratégia de comunicação” junto da população, sobretudo a mais jovem, que ajude a esclarecer quais são os sintomas ligeiros a valorizar, motivando, desta forma, as próprias pessoas a tomar a iniciativa de se auto-isolarem durante um curto período de tempo para evitar a transmissão da infecção, como já acontece em vários países, nomeadamente a Alemanha. Propõem mesmo que seja dada “uma indicação clara para isolamento de pessoas com sintomas respiratórios de qualquer gravidade, acautelando a sua protecção relativamente a questões laborais e financeiras”.

“Medidas restritivas mais gerais podem falhar na contenção da transmissão se os cidadãos continuarem a desvalorizar um conjunto de sintomas ligeiros”, avisam Vasco Peixoto, André Vieira, Pedro Aguiar e Alexandre Abrantes, no artigo de opinião que foi publicado esta terça-feira no Barómetro Covid-19 da ENSP da Universidade Nova de Lisboa.

Com a evolução da pandemia a lista de sintomas tem sido alargada e, hoje, o Center for Disease Control (CDC) dos EUA e a Organização Mundial de Saúde recomendam que se incluam como critérios para se se fazerem testes de  covid-19 a combinação de dois ou três dos sintomas seguintes: nariz obstruído, corrimento nasal, dor de garganta, dores musculares, dores de cabeça, náuseas, vómitos, diarreia ou fadiga”, lembram.

A desvalorização deste tipo de sintomas “representa um ângulo morto do controlo da pandemia e pode estar a contribuir para o actual descontrolo da mesma na Europa em contexto de maiores contactos laborais e sociais associados a diminuição de restrições”. E concluem: “Se não identificarmos estes casos, não poderemos controlar as cadeias de transmissão”.

Os investigadores recordam, a propósito, as conclusões de um estudo reportado pelo Centro Europeu de Prevenção e Controlo de Doenças (ECDC na sigla em inglês) que analisou as características clínicas de casos de infecção num conjunto de 18 hospitais europeus. Os sintomas mais frequentes com testes positivos e com idades entre os 15 e os 39 anos foram a dor de cabeça (70,3%), a perda do olfacto (70,2%) e a obstrução nasal (67,8%). A seguir surgiam a tosse (63,2%), a falta de força (63,3%), as dores musculares (62,5%) e o corrimento nasal (60,1%). No fim da lista apareciam a alteração do paladar (54,2%) e a dor de garganta (52,9%), sendo que a febre surgia em menos de metade dos casos (45,4%).

Se sintomas como a dor de cabeça, dores musculares e corrimento nasal, entre outros, forem incluídos nos critérios para se fazerem testes a casos suspeitos de covid-19, “mais casos poderão ser detectados e tomadas as medidas de saúde pública adequadas”, sustentam. Mas a proposta implicaria que muitos mais testes de diagnóstico fossem feitos. Os investigadores argumentam que a utilização de testes rápidos de antigénio, que arrancou segunda-feira em Portugal, pode permitir que se testem as pessoas que apresentam sintomas respiratórios ligeiros, típicos das infecções respiratórias agudas ou combinações dos mesmos. 

Não será muito elevado o preço a pagar por mais testes de diagnóstico em Portugal? “Há um custo-benefício em valorizar sintomas ligeiros. Deixar a transmissão da infecção descontrolada também implica fazer mais testes durante um período de tempo”, retorque Vasco Peixoto. “É importante levar em conta aquilo que se prevenia em número de casos de infecção, possível lockdown e custos com hospitalizações”, diz, lembrando que, apesar de terem menor sensibilidade e especificidade, os testes rápidos de antigénio permitem uma actuação rápida e em larga escala. 

O ex-director-geral da Saúde Francisco George concorda com esta proposta. “Houve jovens desportistas que me disseram, curiosamente: ‘Sinto-me como se tivesse jogado um jogo de râguebi ontem’. São dores generalizadas no corpo, fadiga”, descreve George, que é presidente da Cruz Vermelha Portuguesa, que desde meados de Setembro já está a usar testes rápidos de antigénio para controlar cadeias de transmissão. “Em saúde pública, para interromper a propagação da infecção, os testes rápidos de antigénio são insubstituíveis porque permitem a adopção de medidas rápidas”, frisa.

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