Ponderar o regresso ao ensino online para o secundário e superior

Esta passagem a um regime de ensino online não teria impactos substanciais no exercício do trabalho dos pais, na medida em que não os obrigaria a ficar em casa nem prejudicaria aqueles que já estão em regime de teletrabalho.

Começo por esclarecer alguns pontos, para que não se erga a habitual suspicácia sobre o que escrevo: em primeiro lugar, apesar de na minha identificação surgir, com muita honra, a instituição em que lecciono, o que escrevo é da minha total responsabilidade, enquanto cidadã com opinião. Em segundo lugar, sou docente, entre o ensino secundário e o ensino superior há 25 anos. Em terceiro lugar, aprecio profundamente o contacto presencial com os alunos e acho que esse contacto, cara-a-cara, é fundamental no processo de ensino/aprendizagem. Em quarto lugar, estou a leccionar em regime misto (presencial e online) e não posso deixar de referir que, no caso concreto da minha instituição, têm sido feitos todos os esforços de reorganização, de modo a garantir a segurança (e a sua percepção) por parte de toda a comunidade escolar.

Depois destes esclarecimentos prévios, ou melhor dito, não obstante estes esclarecimentos prévios, defendo que uma medida fundamental para reduzir os números de disseminação da infecção por covid-19 seria a de passar a regime online todo o ensino secundário e profissional equiparado a secundário, bem como todo o ensino superior.

E defendo-o porque embora não partilhe desta espécie de “ataque” aos jovens, responsabilizando-os por todas as atitudes menos cautelosas (que verifico serem transversais a todas as idades e fundadas, somente, na consciência individual e social), a verdade é que não chegam as medidas correctas e adequadas adoptadas nos estabelecimentos de ensino, quando, depois, não se pode controlar o que sucede no espaço e tempo pós-aulas (e não me refiro às noites - questão que poderia ser resolvida com um eventual recolher obrigatório - mas com o que sucede à saída das escolas, mesmo do outro lado da rua), quando a vontade de interagir e conviver (próprias da idade, sobretudo depois do recolhimento em sala de aula) se afirma em toda a sua força e plenitude.

Além disso, esta passagem a um regime de ensino online permitiria, essa sim, um real desfasamento de horários, que é, no actual contexto, incompatível com a organização dos tempos escolares - veja-se a concentração de carros e pessoas entre as 8h00 e as 8h15 à porta de escolas e universidades. Acresce que este grande conjunto de alunos, pela sua autonomia, representa, também, uma significativa pressão sobre os transportes públicos, que seria diminuída com a sua permanência em casa.

E acresce, igualmente, que pelas mesmas razões de autonomia, essa permanência não teria impactos substanciais no exercício do trabalho dos pais, na medida em que não os obrigaria a ficar em casa (algo que sucederia se todos os níveis de ensino regressassem ao regime de ensino à distância) nem prejudicaria aqueles que já estão em regime de teletrabalho (idem), pelo que o argumento de prejuízo para a economia parece ser de pouco significado, ao passo que os benefícios em matéria de circulação de pessoas se afigura considerável.

Retomando as considerações iniciais, o reconhecimento de que este é um tempo de excepção, que obriga a medidas de excepção, justificaria, plenamente, a adopção desta medida, sem que isso tenha de configurar o desvirtuar do modelo de ensino/aprendizagem, que regressará ao seu “normal”, quando as nossas vidas, no geral, regressarem, também elas, ao “normal”.

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