Dia 108: A culpa é das hormonas?

Não são vocês que gritam, são elas. Não são vocês que perdem a cabeça, são elas. Não estou a brincar — a síndrome pré-menstrual é uma entidade reconhecida, que atenua crimes e reduz anos de prisão.

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@DESIGNER.SANDRAF

Ana,

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Hoje não consigo sacudir a vontade de implicar com alguém, só me posso ter levantado do lado errado da cama, que ao que parece é o lado esquerdo, seguindo uma superstição que nos ficou dos romanos.

Se fosse há uns anos — bem vistas as coisas talvez seja melhor começar a falar em décadas —, não teria dúvidas em afirmar que a culpa era das hormonas, mas se há alguma coisa boa em envelhecer é livrarmo-nos do poder supersónico dos estrogénios e progesteronas. Por isso, insisto, só posso ter saltado da cama do lado errado.

E em que é que isso é relevante para a tua vida? Em nada, desde que não apareças, nem telefones até que a crise passe, mas pode ser importante para explicar por que as avós tendem a ser mais serenas do que as mães. Mais serenas do que foram enquanto mães, inclusivamente.

A consciência deste facto muda tudo. Por exemplo, até aqui quando me colocavam esta questão — serão os avós mais calmos do que os pais — respondia sempre que sim, tendencialmente como consequência da sabedoria adquirida, de uma aprendizagem aturada daquilo que é acessório e do que é essencial. Mas hoje pressinto que não passa de conversa fiada, porque a verdade é só uma: deixámos de ser palco de uma montanha russa de emoções. Só isso. Não temos mérito nenhum na coisa.

E vocês, pela mesma razão, estão absolvidas de todos os gritos e impaciências. Não são vocês que gritam, são elas. Não são vocês que perdem a cabeça, são elas. Não estou a brincar — a síndrome pré-menstrual é uma entidade reconhecida, que atenua crimes e reduz anos de prisão. Numa família sensata, a mãe teria direito a uma “Licença de Hormonas”, três dias por mês em que receberia um voucher para ficar longe de casa, num quarto de hotel a comer chocolates e a ver séries. A sério, Ana, a minha solidariedade é total.


Querida Mãe,

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É nestas alturas que sei que não temos qualquer espécie de livre arbítrio! Estamos reféns das hormonas.

Gostei muito do seu livre-passe de culpa, muito obrigada.

Só que fico com um problema... Que desculpa uso nos outros 25 dias do mês?

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