Um momento de publicação independente: Defects

Fanzines, edições de autor, livros de artista — nesta rubrica queremos falar de publicação independente. O editor Manuel Pereira, da Black Blood Press, apresenta Defects.

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Apresenta-nos a tua publicação.
Defects é uma antologia de trabalhos do Thomas Stetson, uma série de desenhos criados entre 2014 e 2015, e a primeira publicação fora do circuito das suas edições de autor (via Foul Apparatus), geralmente em tiragens limitadíssimas e com muito escassa distribuição. É a edição com o aspecto mais “profissional” no catálogo da Black Blood Press, até ao momento, no seguimento do que procurei iniciar com a Slice of Cunt do ano passado, após uma primeira fase exclusivamente focada em zines fotocopiados (na qual o autor em questão tinha já participado com trabalhos inéditos na compilação Burnt To A Crisp, de 2015).

Quem são os autores?
Thomas Stetson é um ilustrador da Carolina do Norte avesso ao dinamismo das plataformas de promoção pessoal que norteia os circuitos criativos contemporâneos e que funde existências físicas e virtuais, marca identitária que se manifesta num trabalho obsessivo, exaustivamente detalhado no desfiar do traço e da neurose, na demorada formulação de um universo críptico, verdadeiramente singular e hermético, que só esse confinamento possibilita.

Do que quis falar?
Defects enquadra-se a 100% naquilo que procuro para a Black Blood Press, enquanto exercício mais amplo de exumação editorial. Os temas são os de sempre, as primordiais obsessões da humanidade desde os tempos mais remotos: sexo e morte nas suas mais aprimoradas e improváveis combinações.

Citando o prefácio, este livro é “composto por desoladas imersões nos tenebrosos recantos do universo íntimo do artista, pelo desdobramento psicótico de todos os seus habitantes, tão sombrio quanto deslumbrante, um catálogo caleidoscópico dos enfermos, dos atormentados, dos deformados, de todos os que infinitamente sofrem e perecem”.

Questões técnicas: quais os materiais usados, quantas páginas tem, qual a tiragem e que cores foram utilizadas?
Papel IOR 120 g, 21,5cm por 28 cm, impressão em offset (preto e branco), 48 páginas, 200 exemplares.

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Onde está à venda e qual o preço?
Custa 8 euros e está a venda directamente na página da Black Blood Press. Estou a trabalhar em expandir um pouco a distribuição para além do circuito do noise, onde é habitual ter algumas destas publicações, juntamente com os lançamentos da Narcolepsia. Em Portugal, deverá haver ainda alguns exemplares na sempre atenta Chili Com Carne e para os que procuram espaços físicos é provável que também vá estar na Matéria Prima, no Porto, cujo cuidado na selecção do material disponível, e abertura para acolher objectos como este, a tornam um dos meus espaços de referência.

Porquê fazer e lançar edições hoje em dia?
Sem contornar a inevitável referência à fruição do objecto na plenitude da sua fisicalidade, naturalmente distinta daquela mediada por ecrãs de qualquer tipo, prefiro focar-me na possibilidade de criar uma dinâmica de autenticidade (artística, social, intelectual, económica, etc.) entre criadores, editores e distribuidores, como espaço inter-relacional privilegiado para fazer circular um qualquer tipo de discurso, mas igualmente na tentativa de reclamar um outro tipo de atenção que a torrente de informação online não permite, ou não facilita.

Pela pequenez que não aspira a mais que isso, e pela intransigência relativamente ao que se edita, também a possibilidade de uma existência paralela, alheia a muitos dos constrangimentos do “mundo real”, orgulhosamente absorta na sua complexa e auto-suficiente indiferença.

Recomenda-nos uma edição de autor recente lançada em Portugal.
A nova Contos Sérios, nas bancas após um interregno de sete anos. Rebuscado trabalho de de autor com génese no mais psicadélico lodo do Mondego.

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