Um quarto dos alunos não fez trabalhos em casa durante o confinamento

“Falta de tempo” é a principal justificação dos estudantes para não conseguirem responder às tarefas, mas há quem se queixe de não perceber o que é pedido pelos professores.

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Daniel Rocha

Um quarto dos estudantes não fez os trabalhos que lhes foram enviados pelos professores durante as duas primeiras semanas de suspensão das aulas, revela um inquérito feito pelo Observatório de Políticas de Educação e Formação. “Falta de tempo”, justifica-se a maioria. O “verdadeiro teste” ao ensino à distância começa esta terça-feira com o arranque do 3.º período, adverte Ana Benavente, que coordena esta investigação.

Ainda que a maioria dos alunos tenha conseguido completar as tarefas enviadas pelos seus professores, 25% dos inquiridos revela não ter conseguido realizar os trabalhos em casa durante o período de suspensão das aulas. A maioria (42,1%) evoca “falta de tempo”, mas mais de um terço dos alunos (33,7%) diz ter “dificuldade em perceber o que é pedido pelos professores.” Este é o segundo conjunto de resultados de um inquérito online que este centro de investigação tem vindo a promover para avaliar os impactos da covid-19 no sistema de ensino.

Os números agora divulgados mostram a importância do apoio doméstico ao estudo em contexto de ensino à distância, tendo 24,2% dos alunos dito não ter feito todos os trabalhos enviados pelos professores por “ausência de apoio/ajuda suficiente”. Ainda segundo o Observatório, três quartos dos alunos foram ajudados por alguém durante o período em que tiveram aulas em casa, sobretudo às disciplinas de Português (62,2% dos estudantes necessitaram de apoio) e Matemática (70,4%). Cerca de 15% dos alunos declaram precisar de ajuda diária para dar conta das tarefas inerentes às aulas em casa.

Nos casos em que os alunos precisam de ajuda, recorrem sobretudo às suas famílias, com destaque para as mães (77,5%). Seguem-se os pais (41,3%) e os irmãos ou outros familiares, que totalizam 18,1%. Mesmo em contexto de confinamento, cerca de 20% dos alunos tem tido ajuda de um explicador.

Estes resultados mostram como o ensino à distância está a colocar em causa a equidade na educação, não só em termos de acesso às tecnologias, mas também do apoio que cada família consegue garantir aos seus filhos, defende Ana Benavente. Estes dados podem até pecar por defeito, uma vez que, sendo respondido online, “o inquérito está distorcido porque só respondem as famílias com acesso às tecnologias”, contextualiza a coordenadora do Observatório, coordenado pelo Centro de Estudos Interdisciplinares em Educação e Desenvolvimento da Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias e pelo Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra. 

“Se é assim com estas famílias, como será com as que ficam de fora”, acrescenta Benavente. Estas “contradições” podem tornar-se mais evidentes a partir desta terça-feira, quando começa o 3º período que, para os alunos do ensino básico, será feito em exclusivo em regime de ensino à distância. “Este é que é o verdadeiro teste. Nos primeiros 15 dias [antes das férias da Páscoa] houve muita boa vontade e um enquadramento um pouco lúdico. Agora será tudo diferente.”

O 3.º período arranca com as aulas à distância para todos os alunos. Os estudantes dos três primeiros ciclos terão o apoio da nova Telescola – agora designada #EstudoEmCasa – a partir do início da semana seguinte, como complemento ao trabalho que os professores terão que continuar a fazer com os alunos.

A uma semana do início da emissão das aulas pela televisão, os conteúdos programáticos continuam desconhecidos dos professores, lamentaram os directores escolares. “Para os professores poderem organizar melhor as aulas, era importante que soubéssemos quais os conteúdos programáticos que serão exibidos na televisão”, sublinhou Filinto Lima, presidente da Associação Nacional de Directores de Agrupamentos e Escolas Públicas (ANDAEP), em declarações à Lusa. Até ao momento o Ministério da Educação divulgou apenas a grelha e o calendário das aulas que a RTP Memória vai transmitir para os alunos do 1.º ao 9.º anos.

Refeições nas escolas podem chegar a 20 mil alunos

As escolas públicas vão continuar a servir refeições aos alunos carenciados até ao final do ano lectivo. A medida, que já tinha vigorado nas duas semanas antes das férias da Páscoa para os alunos com o escalão A da acção social escolar, vai agora ser alargada também aos estudantes com escalão B, fruto do prolongamento da suspensão das aulas presenciais nos próximos meses.

Esta determinação do Ministério da Educação (ME) já foi transmitida às escolas e foi confirmada pelo PÚBLICO junto de fonte da tutela. Após a suspensão das aulas presenciais, por causa da pandemia da covid-19, o Governo tinha determinado que os alunos mais carenciados deviam continuar a ter acesso às refeições que habitualmente faziam nos estabelecimentos de ensino.

A medida destinava-se até aqui aos estudantes com escalão A, que pertencem às famílias com menores rendimentos. O alargamento para os beneficiários de escalão B duplica o universo de alunos que podem ser apoiados. Nas duas semanas de férias da Páscoa, que terminaram esta segunda-feira, as escolas serviram, em média, 10 mil refeições diárias.

Este serviço está a ser prestado por cerca de 700 escolas – o país tem 811 agrupamentos de escolas públicas. As refeições escolares foram um dos serviços excepcionais que o Governo determinou que as escolas deviam continuar a prestar depois da suspensão das aulas presenciais, no âmbito das medidas de contenção da covid-19, no mês passado.

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