Edição “pirata” de 1984 gera disputa entre editoras portuguesas

A Antígona, que tem “os direitos exclusivos de publicação” do romance de George Orwell em Portugal até final de Dezembro deste ano, interpôs uma providência cautelar para impedir que o Clube do Autor continue a comercializar a edição de 1984 que lançou em Março e está à venda em livrarias online.

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George Orwell XXX DIREITOS RESERVADOS

Em livrarias online portuguesas como a Wook , a Fnac.pt ou a Almedina, estão disponíveis, ambas por 16 euros, duas edições do romance distópico 1984, de George Orwell, como o PÚBLICO confirmou esta terça-feira. Uma delas é da Antígona, que, explica o editor Luís Oliveira, “editou este livro em 1990, sendo detentora dos direitos autorais, exclusivamente para Portugal, até 31 de Dezembro de 2020”. A outra foi lançada em Março deste ano pela editora Clube do Autor com um prefácio assinado pelo escritor José Rodrigues dos Santos na colecção Os Livros da Minha Vida. Para fazer valer os seus direitos, a Antígona interpôs uma providência cautelar a pedir a retirada do livro de circulação, impedindo a sua venda. 

Embora eu não seja contra os piratas, esta edição é pirata. ​O decreto sobre a entrada no domínio público de um autor, depois de passarem 70 anos após a sua morte [Orwell morreu a 21 de Janeiro de 1950], não contém nenhuma ambiguidade, é claro. [A obra] passa ao domínio público no fim do ano em que se completam os 70 anos da morte do autor”, explica Luís Oliveira, citando o artigo 31.º do Código do Direito de Autor e Direitos Conexos (Decreto-Lei n.º 63/1985), e, mais especificamente, o artigo 3.º do Decreto- Lei nº 334/1997, que acrescenta que “a caducidade só opera após o dia 1 de Janeiro do ano seguinte àquele em que o prazo se completar”.

A edição de 1984 da Antígona
A edição da Clube do Autor
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A edição de 1984 da Antígona

Luís Oliveira diz ao PÚBLICO que esta terça-feira recebeu do seu advogado, Francisco Teixeira da Mota, a informação de que o Clube do Autor “já foi citado” e que está agora a decorrer o prazo de dez dias para esta editora se opor à providência cautelar. Acrescenta que, com o aparecimento da edição do Clube do Autor, a Antígona teve “uma quebra imediata de 80% nas vendas”. Para o editor, “esta montagem do Clube do Autor é uma afronta à Antígona, que há 30 anos se dedica à obra de George Orwell acrescentando em cada livro documentos, prefácios, estudos, ensaios”. O catálogo da editora de Luís Oliveira tem sete títulos deste autor, além de uma biografia escrita pelo autor inglês John Newsinger. “Dediquei muitos anos a ler e a reflectir sobre a obra monumental de Orwell, tendo prosseguido, com paixão, a publicação de outros títulos, muitos deles desconhecidos dos leitores portugueses”, sublinha o editor. “Em síntese, houve uma dedicação do editor a um autor que o apaixonou e continua a apaixoná-lo”, acrescenta ainda.

Antes da declaração do estado de emergência actualmente em vigor, a edição em papel do Clube do Autor chegou a estar à venda fisicamente nas livrarias. No entanto, já esta terça-feira, a pesquisa pelo nome do autor ou pelo título do livro no site oficial do Clube do Autor revelava-se improcedente, não havendo qualquer referência à obra ou ao autor britânico no catálogo on-line da editora. O PÚBLICO tentou ouvir esta terça-feira à tarde o responsável pelo Clube do Autor sobre este assunto, mas tal não foi possível, uma vez que estava incontactável em reunião. Mais tarde, a assessoria de imprensa da editora não atendeu os telefonemas do PÚBLICO, nem respondeu às mensagens. 

A partir de Janeiro, quando a obra de George Orwell entrar no domínio público, outras editoras portuguesas vão reeditar 1984, entre elas a Relógio D’Água, que já o anunciou publicamente.

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