Hotelaria conta com lay-off para atenuar perdas do coronavírus

Inquérito feito pela Associação da Hotelaria de Portugal aponta para fortes perdas no sector. Já houve o cancelamento de 346.497 noites, concentrado nos primeiros dias de Março.

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Raul Martins, presidente da Associação da Hotelaria de Portugal, diz que "foi um erro ter-se acabado com o banco de horas individual” TIAGO PETINGA/LUSA

A facilitação do recurso ao lay-off, prometida pelo Governo, vai ser fulcral para evitar despedimentos no sector hoteleiro, de acordo com Raul Martins, presidente da Associação da Hotelaria de Portugal (AHP).

“Medidas como o lay-off terão de ser utilizadas” pelos hotéis, afirmou este responsável numa conferência de imprensa realizada esta quinta-feira, acrescentando que, com o recurso a esse instrumento, “não teremos praticamente despedimentos”.

Na passada segunda-feira, a ministra do Trabalho, Ana Mendes Godinho, afirmou que o regime legal do lay-off ia ser alterado no sentido de o simplificar e permitir a sua aplicação mais rapidamente.

Embora os detalhes da mudança ainda não sejam conhecidos, Ana Mendes Godinho afirmou que para poder aderir será preciso que se verifique “uma quebra de vendas excepcional”, de 40%. Em caso de lay-off, que implica a suspensão ou redução temporária do período normal de trabalho, o trabalhador recebe menos, e maior parte é assegurada pelo Estado.

Sobre novas contratações, o presidente da AHP estima que “20 a 30 mil pessoas” não vão ter trabalho, ao contrário do estimado.

Cancelamentos avolumam-se

As preocupações devido ao novo coronavírus são muitas e crescentes. De acordo com os resultados de um inquérito promovido junto dos associados, realizado entre 3 e 9 de Março e com uma taxa de resposta de 56%, houve nesse período 346.497 noites canceladas, o que equivale a cerca de 30% da ocupação. Não se sabe quais já estavam ou não pagas, mas o indicador foi-se degradando à medida que os dias passaram, tendência que se mantém.

“Do dia 9 até hoje as coisas só pioraram”, realçou Raul Martins. Ou seja, os dados do inquérito não incorporam realidades como o anúncio dos EUA, que recomendou aos seus cidadãos não viajar para o estrangeiro e impôs restrições à entrada de viajantes a partir do espaço Schengen que não sejam norte-americanos.

Na apresentação dos dados, a directora-geral da AHP, Cristina Siza Vieira, avançou que está em cima da mesa um cenário cuja estimativa é a de uma perda de 30% de receitas na hotelaria nacional em termos homólogos entre 1 de Março e 30 de Junho, o que equivale a 500 milhões de euros.

Um cenário mais gravoso, de menos 50%, já coloca a factura em 800 milhões de euros. Aqui entra em jogo uma queda da taxa de ocupação, mas também das receitas associadas a outras rubricas, como eventos.

O impacto é sentido de forma diferente a nível nacional, com Lisboa, por exemplo, a ter a maior taxa de respostas positivas (90%), quando se pergunta se houve mais cancelamentos face a idêntico período homólogo. Sobre o país de origem dos cancelamentos, no caso de Lisboa o top 3 é dominado pela Itália, China e Espanha, enquanto no caso do Norte (que inclui o Porto) já é Portugal (turismo interno) que está na primeira posição, seguindo-se França e Itália. E, segundo Cristina Siza Vieira, os cancelamentos começaram por ser de reservas de grupos, “mas depois generalizou-se” para segmentos como o turismo religioso – com impactos em Fátima e zona centro -, além dos particulares.

A caminho da queda

Com a Páscoa ameaçada, e a necessidade de manter o pulso ao sector, a AHP vai repetir periodicamente o questionário. Se os dois primeiros meses do ano correram bem, e a perspectiva até há pouco tempo era a de manter a tendência de crescimento, tal como nos últimos anos – puxando pela economia nacional - agora o cenário mudou. O ano de 2020, afirmou Raul Martins, encaminha-se para ser “pior do em 2009”, quando o turismo se afundou a nível global.

Neste momento, a Organização Mundial do Turismo (OMT) já emendou os gráficos e colocou o sector em terreno negativo, antecipando uma quebra de 1% a 3% (em 2009, a descida foi de 4%).

Em Espanha, por exemplo, e de acordo com o presidente da AHP, Madrid está com uma taxa de ocupação de 15%. “Um meteorito caiu em cima de nós e temos de ver como vamos sobreviver” afirmou hoje à Reuters o responsável da Confederação Espanhola de Hotéis e Alojamentos Turísticos, Ramon Estalella.

Na expectativa dos apoios prometidos por Bruxelas, Raul Martins diz que também já pediu ao Governo o adiamento do fim do banco de horas por acordo individual, previsto para Outubro. “Foi um erro ter-se acabado com o banco de horas individual”, afirmou, acrescentando que essa será uma das primeiras medidas a utilizar pelo sector, ao dizer ao trabalhador para ficar em casa e compensar depois o tempo de serviço.

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