Ainda há aulas em tendas e salas sem telhado em Moçambique, um ano após o ciclone Idai

Está ainda longínqua a recuperação dos estragos causados pelas tempestades que atingiram Moçambique no ano passado.

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Um aluno estuda junto aos destroço de uma sala de aula da Escola Primária Completa 12 de Outubro ANTÓNIO SILVA/LUSA
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Numa aula ANTÓNIO SILVA/LUSA

A Escola Primária Completa 12 de Outubro da cidade da Beira é uma das que tem mais alunos na capital provincial, cerca de 4000, e foi também uma das mais destruídas pelo ciclone Idai, que há um ano devastou o centro de Moçambique.

Ali ainda há aulas em tendas, persistem danos como na maioria dos estabelecimentos de ensino daquela zona de Moçambique: 3500 salas de aula foram atingidas. O problema mais comum foi que ficaram sem cobertura. “Foi um estrago imenso. Ninguém esperava ver cenas daquele género”, descreve Jorge Oliveira, 46 anos, director pedagógico do curso nocturno da escola 12 de Outubro.

O período chuvoso de 2018/2019 foi dos mais severos de que há memória em Moçambique: 714 pessoas morreram, vítimas dos estragos causados por dois ciclones (Idai em Março e Kenneth em Abril). A Beira, uma das principais cidades do país, foi severamente afectada.

Na Escola Primária 12 de Outubro, um bloco de salas foi completamente arrasado, só alguns pilares ficaram de pé, assim como uma parede com os quadros negros de ardósia com rabiscos a giz branco e que permanecem hoje a céu aberto. É uma parte da escola que ainda aguarda por obras, ao passo que outras salas já foram recuperadas, mas não chegam para toda a gente.

A escola funciona com seis turnos por dia, cada um com 13 turmas, cinco com aulas em tendas, que só deverão ser desmontadas quando os quadros de ardósia voltarem a estar entre quatro paredes. Jorge Oliveira espera que tal aconteça ainda este ano, graças ao apoio dado ao Governo por patrocinadores privados e organizações de socorro.

“Pouco a pouco estamos a reerguer” a escola, conclui.

Só 10% de salas de aula reabilitadas

Não muito longe dali, na Escola Primária Completa Mulheres Macombe, há salas de aula ainda sem telhado, cobertas com lonas de ajuda humanitária. É início de tarde e depois de cantarem o hino nacional em formação, no pátio, as alunas vão entrando e ocupando os lugares.

Ao lado, as Nações Unidas mostram trabalho em curso num bloco onde nasce um plano piloto de recuperação de escolas de forma resiliente – um modelo para o Governo poder aplicar a todos os estabelecimentos, assim tenha recursos para tal.

Além das escolas, o ciclone Idai danificou outras estruturas públicas, como 55 unidades sanitárias no centro do país.

Segundo dados da administração provincial, há 10% de salas de aula reabilitadas e 9% das unidades sanitárias têm garantia de financiamento para recuperação, em obras de recuperação dependentes de verbas e projectos por desbloquear.

Os doadores internacionais que prometeram 1,1 mil milhões de euros em 2019 para a fase de reconstrução (pós-ajuda humanitária) fazem depender a entrega de verbas da apresentação de projectos. No início de Fevereiro deste ano, asseguraram ao Governo moçambicano o desembolso de 173,3 milhões de euros face aos projectos apresentados.

Por seu lado, as autoridades moçambicanas prometem acelerar processos, mas também pedem simplificação de procedimentos.

Em resumo, a reconstrução de casas e edifício públicos mais resistentes após o ciclone Idai vai levar tempo, disse à Lusa a coordenadora residente das Nações Unidas no país, um ano depois de o centro de Moçambique ter sido atingido. “O conceito de reconstruir com resiliência (ou BBB, do inglês ‘build back better’) precisa de estudos, de engenharia”, ou seja, “não é algo que se possa fazer de maneira tão rápida”, nomeadamente num país com as necessidades de recursos de Moçambique, referiu Myrta Kaulard, em entrevista.

A falta de habitações condignas “é a questão pela qual mais clamam as populações, que querem estar protegidas. Não querem estar cobertas com lonas”, nota Stella Zeca, representante do Governo moçambicano na província de Sofala, Stella Zeca. “Já estão em zonas mais seguras, mas estão a viver em habitações precárias. É uma questão temporária”, garante, uma vez que já foi aprovada uma planta modelo e “paulatinamente vão ser construídas habitações resilientes”.

“A prioridade é construir habitações seguras para as famílias que foram reassentadas”, nas 72 zonas de realojamento criadas após os ciclones (Idai e Kenneth) de 2019 e onde o sistema das Nações Unidas e organizações não.governamentais têm garantido apoio básico, alimentar e social, sublinhou Stella Zeca.

Para já, e porque a data do ciclone Idai não vai ser esquecida tão depressa pelos alunos e professores da Escola Primária Completa 12 de Outubro, prepara-se uma cerimónia de inauguração. Para sábado, 14 de Março está marcado o corta-fita das salas já recuperadas.

Ao lado, a ardósia a céu aberto espera pelo resto das obras, para que se desmontem as tendas de aula.

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