Nove minutos é o máximo que um médico dos cuidados paliativos dispensa por dia a cada doente

Relatório do Observatório Português dos Cuidados Paliativos recomenda contratação urgente de profissionais para os serviços de cuidados paliativos sob pena de a população se sentir lograda com a qualidade da assistência.

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A escassez de profissionais aumenta o risco de os cuidados paliativos serem "inadequadamente prestados", segundo investigadores Daniel Rocha

Um médico integrado num serviço de cuidados paliativos dispõe apenas de entre um a nove minutos por dia para cuidar de cada doente. A conclusão está contida no relatório do Observatório Português dos Cuidados Paliativos (OPCP), divulgado esta quarta-feira, e é, no mínimo, preocupante. “É muito pouco. Se considerarmos que este tempo médio inclui o tempo que o médico demora a fazer o registo do processo clínico e a fazer prescrições, não sobra tempo para que o clínico possa olhar para o doente e para a família”, conclui ao PÚBLICO Manuel Luís Capelas, coordenador do estudo.

No tocante aos cuidados de enfermagem, a média diária do tempo despendido com cada doente aumenta ligeiramente. Mas, entre os profissionais que devem assegurar os cuidados psicológicos e de apoio social, “é igualmente muito reduzida”. Logo, “há um risco enorme de estes doentes estarem a ser inadequadamente cuidados”, alerta aquele responsável, para quem a generalidade das equipas de cuidados paliativos é posta a funcionar sem condições para cumprir os serviços mínimos.

“O serviço até pode existir, mas, se não tiver pessoal, não funciona. É um erro grave continuarmos a insistir na abertura de serviços de cuidados paliativos quando sabemos que eles não cumprem os requisitos que a própria entidade que os promove qualifica como mínimos” critica o director do OPCP para sublinhar que, no caso dos cuidados paliativos, “o doente nem sequer pode optar por recorrer ao [sector] privado, dado que, no tocante aos cuidados paliativos, a resposta é incipiente”.

A aposta urgente no recrutamento de recursos humanos para os cuidados paliativos, assim como a implementação de indicadores de qualidades, que permitam uma avaliação objectiva da qualidade da assistência, são as recomendações constantes neste relatório. Os seus autores apontam, de resto, o risco de a insuficiente resposta por parte dos profissionais de saúde poder “gerar um sentimento de logro na população, por a acessibilidade efectiva e a qualidade destes cuidados poder não ser a desejada”.

Com o intuito de medir a actividade assistencial das equipas e dos serviços de cuidados paliativos, este segundo relatório do OPCP contou um total de 109 equipas e serviços de cuidados paliativos públicos e privados com actividade assistencial ao longo do ano de 2018. Acrescem 33 unidades de cuidados paliativos, 48 equipas intra-hospitalares de suporte em cuidados paliativos, a que acrescem duas vocacionadas para os cuidados paliativos pediátricos e 26 equipas comunitárias. Recorde-se, porém, que os autores do estudo só conseguiram obter dados referentes à respectiva actividade assistencial em pouco mais de metade destes serviços. Entre os que responderam, foram admitidos 25.660 doentes ao longo de 2018, dos quais 90 eram doentes pediátricos.

No país, e segundo os investigadores, há 102.452 pessoas com 18 e mais anos a precisar de cuidados paliativos. Quanto às crianças e jovens, haveria, em 2018, quase oito mil com necessidade destes cuidados. Com base nestes dados, a taxa de acessibilidade nacional foi calculada em 23,3%.

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