Exército japonês pediu uma escrava sexual para cada 70 soldados durante II Guerra Mundial

A questão das escravas sexuais tem sido fonte de uma dolorosa disputa entre a Coreia do Sul e o Japão

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Retratos de sul-coreanas que foram forçadas a ser "mulheres de conforto", , numa manifestação em frente à embaixada do Japão em Seul, em 2015 Reuters/KIM HONG-JI

O exército do Japão pediu ao Governo que fornecesse uma escrava sexual para cada 70 soldados, durante a Segunda Guerra Mundial, de acordo com documentos históricos analisados pela agência nipónica Kyodo News.

Os 23 documentos foram reunidos pela Secretaria do Gabinete do Japão entre Abril de 2017 e Março de 2019, incluindo 13 despachos secretos dos consulados japoneses na China para o Ministério das Relações Exteriores em Tóquio, datados de 1938, segundo a Kyodo.

A questão das escravas sexuais tem sido fonte de uma dolorosa disputa entre a Coreia do Sul e o Japão. As mulheres eram da Coreia do Sul, Taiwan, Austrália, Filipinas e Japão e os documentos agora divulgados sublinham o papel do Estado no chamado sistema de “mulheres de conforto”.

Em 1993, o então secretário-chefe do Gabinete Yohei Kono, o porta-voz do Governo, pediu desculpas pelo sistema de “mulheres de conforto” e reconheceu o envolvimento dos militares japoneses no transporte das mulheres contra a sua vontade.

A Kyodo deu conta de um despacho do cônsul-geral de Jinan (China) ao ministro dos Negócios Estrangeiros no qual se indica que a invasão japonesa causou um aumento na prostituição na área, com 101 gueixas do Japão, 110 mulheres de conforto também do Japão e 228 “mulheres de conforto” da Coreia do Sul.

Gil Won-ok habita na casa-abrigo para "mulheres de conforto" em Seul, Coreia do Sul. “[Um pedido de perdão] iria permitir-nos fechar os olhos mas duvido que isso aconteça facilmente”
Todas as quartas-feiras, Gil participa num protesto frente à Embaixada do Japão em Seu, exigindo um pedido de perdão e indemnizações do Governo nipónico
A borboleta na lapela de Gil simboliza o Butterfly Fund, criado para ajudar mulheres de todo o mundo vítimas de violência sexual em contextos de guerra
Ren Lane, que vive na província chinesa de Shanxi, manteve secreto durante quase toda a sua vida o facto de, com 15 anos, ter sido levada da sua aldeia e violada por soldados japoneses
A mãe de Ren conseguiu resgatá-la do bordel onde se encontrava a troco de arroz e farinha
Ren e a família aguardam ajuda financeira por parte do governo chinês mas até agora nunca foram contactados por nenhum responsável
A família diz que as autoridades ignoraram esta problemática quando a China estava a tentar normalizar as relações com o Japão na década de 1980
Kim Bok-dong pintou este quadro e deu-lhe o título "O dia em que uma rapariga de 14 anos foi roubada", precisamente a idade com que foi levada de sua casa pelos militares
"Não quero viver mais", desabafa Zhang Xiantu, uma das sobreviventes chinesas que foram usadas como "mulheres de conforto"
Zhang é a única sobrevivente das 16 mulheres de Shanxi que processaram o estado Japonês por tê-las raptado e usado como "mulheres de conforto"
Quando os militares japoneses entraram na sua casa, Zhang não conseguiu fugir pois tinha os pés amarrados (devido à tradição dos pés-de-lótus)
Sentada na sua tradicional cama de tijolos, Zhang aguarda a chegada do filho com o almoço
A filha adoptiva de Hao Yuelian acredita que a maior marca que a sua mãe guarda do período como "mulher de conforto" é a perda da fertilidade
Hao evita ver séries ou filmes sobre guerra, especialmente aquelas onde surgem soldados japoneses
Com 92 anos, Hao Juxiang vive na província chinesa de Shanxi e espera receber um pedido de perdão e indemnização antes de morrer
Hao foi raptada pelos militares japoneses quando tinha cerca de 15 anos e foi obrigada a ser "mulher de conforto" pelo menos durante 20 dias
Na pequena comunidade onde Hao Juxiang vive muitos dos vizinhos conhecem o seu passado como "mulher de conforto"
A sul-coreana Lee Ok-sun foi levada em primeiro lugar para uma base aérea na China, onde foi repetidamente violada pelos militares
Mais tarde foi levada para os bordéis que os soldados japoneses frequentavam
Quando a guerra terminou Lee não voltou para a sua cidade por ter vergonha de ter sido uma "mulher de conforto".
Lee Ok-sun só regressou à Coreia do Sul em 2001
Imagens actuais de uma antiga fortaleza onde os soldados japoneses mantinham as "mulheres de conforto"
Os soldados japoneses terão permanecido três anos nesta fortaleza, situada na província de Shanxi, pela qual terão passado mais de 50 mulheres
Zhang Shuangbing, que se dedica à pesquisa sobre as "mulheres de conforto" na China, em frente ao túmulo de uma delas
Uma estátua dedicada às "mulheres de conforto", em Seul, onde são depositadas flores
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Gil Won-ok habita na casa-abrigo para "mulheres de conforto" em Seul, Coreia do Sul. “[Um pedido de perdão] iria permitir-nos fechar os olhos mas duvido que isso aconteça facilmente”

No despacho assinala-se que “pelo menos 500 ‘mulheres de conforto’ devem estar concentradas aqui até o final de Abril” para os soldados japoneses.

Os registos sugerem que as mulheres referidas como gueixas podem ter surgido por conta própria, em oposição às escravas sexuais, que foram coagidas.

Outro despacho do cônsul-geral de Qingdao, na província de Shandong, na China, diz que o Exército Imperial pediu uma mulher para cada 70 soldados, enquanto a marinha solicitou mais 150 mulheres e gueixas para “conforto”, noticiou a Kyodo.

O número de escravas sexuais não é certo, mas os historiadores dizem que eram dezenas de milhares ou mais, e seu objectivo era impedir a propagação de doenças e reduzir as violações entre soldados.

A colonização e os registos de guerra do Japão continuam a prejudicar as relações com os vizinhos asiáticos.

O Governo japonês diz que as reparações de guerra estão resolvidas, mas criou fundos para apoiar as vítimas. Isso teve resultados mistos, com exigências contínuas de um pedido de desculpas mais completo. E existem processos em tribunal que prosseguem na Coreia do Sul.

Mais recentemente, as relações entre o Japão e a Coreia do Sul deterioraram-se e afectaram o comércio e o turismo e desencadearam outras controvérsias, incluindo uma no início deste ano sobre a exibição de uma estátua representando uma jovem “mulher de conforto”.

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