Em Portugal só há 875 empresas grandes

Das 889.296 empresas registadas, só 875 têm mais de 250 trabalhadores. Portugal, como a União Europeia, continua a ser uma economia de PME – que em alguns capítulos estão a par das congéneres do continente. Em outros há muito caminho a fazer.

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Adriano Miranda

O relatório tem a assinatura da Comissão Europeia e é dedicado ao comportamento das pequenas e médias empresas (PME) em 2018 e 2019, mas um dos dados que mais se destacam na sua longa colecção de números e de gráficos é o papel que as “grandes empresas” desempenham em Portugal. Ao todo são apenas 875 e representam 0,1% das 889.296 firmas registadas em Portugal. Mas essas empresas com mais de 250 trabalhadores no activo e um volume de negócios acima dos 50 milhões de euros por ano (é esta a definição que a Comissão Europeia faz de uma “grande empresa”) geram 22,6% dos empregos e um volume de negócios que representa quase um terço da riqueza nacional (27,7% do PIB, ou 60 mil milhões de euros).

A Comissão Europeia sempre encarou as PME como “a espinha dorsal” da economia da União e na assembleia geral destas empresas que se reuniu até esta quarta-feira em Helsínquia, na Finlândia, houve até quem inovasse e as considerasse como o “pulmão” que alimenta a criação de riqueza e o emprego.

Os números coligidos no relatório anual publicado pela Comissão Europeia dão conta desta realidade global, mas no caso português revelam até que ponto pode haver uma dependência excessiva das pequenas empresas. Na Europa, 0,2% das empresas são grandes, mas representam 33% do emprego e 43,6% do valor acrescentado da economia. Em termos comparativos, as grandes empresas em Portugal são menos do que na UE e, também por isso, valem muito menos em termos de emprego e de criação de riqueza.

É isto um problema? Em alguns casos é. No da internacionalização, por exemplo. O relatório da Comissão Europeia faz notar que o facto de apenas 4,7% das firmas portuguesas terem mais de dez trabalhadores é um obstáculo à sua expansão nos mercados externos. Ou um problema para a qualificação dos seus empregados ou para a criação de estratégias para a digitalização. Muitas de microempresas portuguesas são, afinal, unidades familiares que vivem de pequenos negócios, como o de um café, uma oficina de reparação automóvel ou uma barbearia.

Apesar desta limitação, as PME portuguesas não fazem má figura no relatório da Comissão. O seu papel na recuperação do país depois da crise financeira é sublinhado, principalmente ao nível do valor acrescentado, que entre 2014 e 2018 aumentou 27% e fica acima dos valores pré-crise. O mesmo não aconteceu no emprego, que permanece abaixo do índice de 2014 – embora as PME nacionais tenham aumentado a sua oferta de trabalho em 15,2%.

No ano passado, as PME continuavam por isso a ostentar o título de “espinha dorsal” ou de “pulmão” da economia: eram responsáveis por 68% do valor acrescentado e de mais de 77% dos postos de trabalho. Cada um desses 2,6 milhões de portugueses a trabalhar nas PME produzia bens ou serviços avaliados em 22.900 euros por ano, abaixo do PIB per capita, situado nos 23.400 euros – um indicador que ajuda a explicar os baixos salários e a precariedade em Portugal.

O melhor e o pior

No geral, as PME portuguesas estão bem em domínios como o “espírito empresarial”, na segunda oportunidade que concede a projectos falhados ou ao nível das “técnicas e inovação”. Nos inquéritos que deram base ao relatório, os empresários ou gestores de 64% das PME disseram que entre 2014 e 2016 tentaram introduzir inovação nos seus produtos ou processos – só os belgas conseguiram um resultado melhor.

Já quando se trata de fazer ou encomendar projectos de investigação e desenvolvimento, as PME portuguesas ficam mal: o país tem atrás de si neste capítulo apenas a Polónia, a Bulgária e Malta. Não admira por isso que apenas 23% dos produtos ou bens das PME nacionais sejam dotados de “alta intensidade tecnológica” – só a Lituânia, a Letónia e a Estónia estão pior.

Pior também é o capítulo que envolve as ajudas do Estado e as políticas públicas para as empresas.

Ao nível da desburocratização, da facilidade de criação de um negócio ou do tempo gasto para se vender uma empresa, o relatório considera que a situação é mais favorável do que no resto da Europa. Depois, o cenário agrava-se quando se trata de pagar impostos, que obrigam as empresas a gastar 243 horas por ano, contra 172 na UE. E piora ainda mais quando se chega ao capítulo dos pagamentos do Estado, que registam uma média de 32 dias de atraso, contra oito dias no resto da UE – o relatório faz notar, ainda assim, que o tempo de espera pelos pagamentos se reduziu em 11 dias desde o princípio de 2018. Para agravar este problema, as PME nacionais estão entre as que têm mais dificuldades de obter financiamento na Europa.  

Entre dados positivos e negativos, a Comissão Europeia não deixa de analisar favoravelmente a evolução das PME nos anos recentes. É referido o crescimento dos investimentos dinamizados pelo cluster automóvel, da metalomecânica ou da informação e comunicação.

Por outro lado, “a abertura de muitas subsidiárias por parte de gigantes tecnológicos ajudou a criar ecossistemas dinâmicos, atraiu profissionais qualificados e criou incentivos para o desenvolvimento das tecnologias de informação” ou para “o desenvolvimento de novas empresas”.

A este propósito, o estudo refere  que no ano passado bateu-se o recorde do número de novas empresas criadas – 45.191. Se a taxa de mortalidade de empresas em Portugal, uma das mais altas da Europa, se mantiver, no prazo de cinco anos só duas em cada cinco dessas novas empresas continuarão com as portas abertas.

O jornalista viajou a convite da Comissão Europeia

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