Comissão de Polícias contra Movimento Zero

PSP e GNR vão realizar uma manifestação conjunta na próxima quinta-feira, 21 de Novembro.

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Em 2013, PSP e GNR saíram pela primeira em conjunto à rua. Então, manifestantes furaram o cordão policial que os impedia de percorrer a escadaria de acesso à Assembleia da República. Miguel Manso

Uma intitulada “Comissão de Polícias pela dignidade e dignificação da Polícia” enviou por email esta quinta-feira a delegados sindicais da PSP e das associações da GNR um comunicado de duas páginas no qual chama a atenção dos agentes e militares para o que define como colagem pública de partidos de extrema-direita ao Movimento Zero.

“À reflexão de todos os Polícias, porque não podemos calar mais!”, o texto, a que o PÚBLICO teve acesso na íntegra, é um libelo acusatório à natureza do Movimento Zero e ao comunicado em que este apoia a manifestação de 21 de Novembro junto à Assembleia da República convocada pela Associação Sindical dos Profissionais de Polícia (ASPP) e pela APG [Associação dos Profissionais da Guarda Nacional Republicana].

“Dizem querer transformar uma acção devidamente autorizada numa acção nunca antes concretizada. O que quer isto dizer? Arruaça?”, interroga o texto no terceiro de cinco pontos em que são rebatidos os argumentos do denominado Movimento Zero.

Noutro ponto, é abordada uma referência à mudança do conceito de manifestação que consta do apoio daquele grupo à manifestação sindical: “Vamos tornar isto único. Isto quer dizer o quê? Mais violência? Mais confrontos entre polícias”, questiona.

Foi em 12 de Julho, em Lisboa, que o Movimento Zero, nascido em esquadras da periferia da capital e também bem implantado no Porto e Braga, apareceu pela primeira vez. Na cerimónia de aniversário da PSP, vestindo T-shirts brancas, voltaram as costas quando o director nacional da PSP começou a discursar. É um movimento sem rosto, que acusa os sindicatos e associações de fraqueza perante o Governo, e cujos membros comunicam nas redes sociais. Os posts referem as injustiças de que são alvo os que combatem a criminalidade e relatam um país vergado à marginalidade, num guião securitário de extrema-direita.

O Movimento Zero procurou impedir a existência de sindicatos, dividiu “a nossa unidade criando quase duas dezenas de sindicatos na PSP" e “criando uma rebaldaria na utilização das folgas sindicais”, acusa o comunicado.

O que se aproxima de um manifesto, realça que o objectivo último do grupo criado no Verão passado é “desacreditar o sindicalismo nas forças de segurança e dar pretexto para limitar os direitos dos profissionais, proibir o direito de manifestação nas forças e serviços de segurança.”

Em contrapartida, é realçado que o comportamento correcto não passa por “criar desacatos, pondo polícias contra polícias, dando pretextos para medidas castradoras dos direitos e pondo em causa o direito sindical e associativo”. No fim de tal processo, adverte a Comissão de Polícias, “ficaria quem dirige o Movimento Zero, sem rosto, pois as estruturas que não são convocantes da manifestação não podem, claro está, por isso serem responsabilizadas”.

“As ligações do Movimento Zero ao partido Chega e outras forças políticas de extrema-direita é indisfarçável”, acusa a carta. “Nós não podemos aceitar a tolerância para com aqueles que perfilham a intolerância como opção de vida e da sociedade”, argumenta o texto.

“Sabemos de experiência feita que há muita coisa a corrigir e a melhorar no Portugal de hoje, mas isso não nos pode conduzir para opções do passado”, alerta. E conclui com nova advertência: “Ninguém diga amanhã que não sabia. Isto é extensível à Direcção Nacional da PSP e à tutela.”

O carácter imprevisível das acções do Movimento Zero, que tem granjeado apoios nas forças de segurança, foi reconhecido pelos sindicatos e associações. “É muito grande o risco de um movimento sem rosto ser manipulado”, advertiu, ao PÚBLICO, César Nogueira, líder da APG.

Semanas depois do protesto na cerimónia do dia da PSP, Paulo Rodrigues, da direcção da ASPP, foi claro. “O Movimento Zero é um caminho perigoso, é uma chapada de luva branca à forma como os Governos têm tratado os polícias”, considerou Paulo Rodrigues em declarações à Lusa.

Esta versão foi corroborada por peritos em questões de segurança, que foram surpreendidos pela não resposta do Ministério da Administração Interna, no anterior executivo, às questões colocadas pelos sindicatos e associações.

O marasmo negocial instalado levou à subida de tom das críticas ao desempenho das estruturas representativas de agentes e militares e a uma tentativa de as deslegitimar. O Governo foi alertado pelos serviços de segurança para as consequências que tal teria na radicalização de protestos desenquadrados.

A escolha da próxima quinta-feira, 21 de Novembro, para a manifestação foi uma opção simbólica da ASPP e APG: em idêntica data, em 2013, PSP e GNR saíram pela primeira em conjunto à rua num protesto contra os cortes do Orçamento de Estado de 2014, como o apoio da CGTP, cujo secretário-geral, Arménio Carlos, esteve presente.

Então, manifestantes furaram o cordão policial que os impedia de percorrer a escadaria de acesso à Assembleia da República. Menos de quatro meses depois, em nova manifestação, um grupo de guardas prisionais radicalizados entrou em confrontos com a Polícia de Intervenção e ocupou metade daquelas escadas. A refrega fez dez feridos.

Nos últimos dias, tem sido posto a circular que agentes da Polícia de Intervenção não travariam o acesso dos manifestantes nas escadarias do Parlamento. Ou seja, que estaria iminente uma invasão. Razão pela qual, a Comissão de Polícias se refere no comunicado e por diversas vezes à ameaça de arruaças, de pôr polícias contra polícias e a confrontos.

  

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