É tempo de legislar para combater as desigualdades salariais

Legislar para pôr fim às crescentes desigualdades salariais é uma questão de sensibilidade social, de defesa da democracia, de racionalidade económica e, se tudo isto não for suficiente, um dever moral para o qual o Partido Socialista – e um seu governo – estão convocados.

As desigualdades salariais entre os trabalhadores mais bem remunerados e os que estão na base desta pirâmide não param de crescer, contribuindo para uma deficiente distribuição da riqueza gerada pela sociedade como um todo que, embora aumentando, não é canalizada de uma forma justa para a melhoria das condições de vida da generalidade da população.

A forma como este fenómeno contribui para aumentar as desigualdades sociais ou a evidência de que se tem vindo a agravar ao longo das últimas décadas, o que pode ser lido como uma incapacidade do poder político, um pouco por todo o mundo, regular eficazmente o capitalismo, são temas estruturantes para o futuro da nossa sociedade.

Os dados mais recentes evidenciam que Portugal não está imune a esta esta realidade, o que é notório se tivermos em linha de conta que, nos últimos anos, já depois de o País ter virado a página da austeridade, as remunerações dos gestores aumentaram em cerca de 40%, o que está muito longe de ter sido acompanhado pela remuneração da esmagadora maioria dos trabalhadores.

Estas desigualdades são injustas na medida em que dificilmente se encontra uma correlação entre os salários dos gestores, em determinados casos verdadeiramente astronómicos, e o desempenho das respetivas empresas. Um bom exemplo disso mesmo são os CTT, uma empresa que tem tido uma gestão bastante deficiente, fruto de uma atabalhoada privatização concretizada pelo anterior governo PSD/CDS, e cuja atual administração deixou vários concelhos do país sem nenhuma estação de correio. Nesta empresa, mesmo que os trabalhadores com salários mais baixos somem todos os vencimentos de toda a sua carreira contributiva, não conseguirão auferir valores próximos do que o seu administrador executivo ganha num ano de trabalho.

Mas esta injustiça na repartição dos rendimentos é ainda maior se tivermos em conta que está em contraciclo com os progressos tecnológicos e científicos ao dispor de todos, com a maior democratização no acesso à informação ou, no nosso caso, com um aumento consistente das qualificações dos portugueses.

É certo que esta não é uma preocupação exclusiva do nosso país: é um tema que está a ser debatido um pouco por todo o mundo, já que existe um reconhecimento alargado de que o agravamento das desigualdades ameaça a coesão social, colocando também os sistemas democráticos à mercê de aproveitamentos populistas de quem, ao invés de os querer reformar, apenas pretende a sua implosão.

Partindo do princípio que cabe ao Estado intervir em prol do bem comum sempre que isso signifique corrigir situações de manifesta injustiça, especialmente em casos, como estes, em que os mercados se mostrem incapazes de se autorregularem, é da mais elementar justiça e atualidade que seja estabelecido um mecanismo de limitação proporcional da desigualdade salarial no interior das organizações, públicas ou privadas, ou seja, um rácio máximo entre as remunerações dos trabalhadores com maior e com menor vencimento.

Não com a intenção final de baixar os salários mais elevados, mas seguindo o princípio de que se uma organização é capaz de gerar proveitos estes devem ser distribuídos de forma equilibrada entre todos os que participam na geração desta riqueza, contribuindo também para aumentar a retribuição mínima dos trabalhadores destas organizações.

Legislar para pôr fim às crescentes desigualdades salariais é uma questão de sensibilidade social, de defesa da democracia, de racionalidade económica e, se tudo isto não for suficiente, um dever moral para o qual o Partido Socialista – e um seu governo – estão convocados.

Este processo já foi iniciado – com uma Moção Setorial aprovada no Congresso do PS e, mais recentemente, com a aprovação de um Projeto de Resolução do PS, na Assembleia da República – mas tem agora mais um desenvolvimento, com a inclusão desta matéria no Programa Eleitoral que o PS apresenta às eleições do próximo mês de outubro.

Nele consta o compromisso de “desenvolver uma política de combate às excessivas desigualdades salariais, quer através da penalização, no plano fiscal e contributivo, das empresas que não cumpram os leques salariais máximos definidos, quer através do benefício àquelas que apresentarem uma trajetória positiva em contexto de valorização salarial”.

Estão por isso reunidas as condições, caso o Partido Socialista forme governo, para que a próxima legislatura fique também marcada pela aprovação de uma lei que limite as desigualdades salariais nas organizações portuguesas, sendo também essa a expectativa da maioria dos portugueses: que os poderes públicos tomem medidas para reduzir as desigualdades salariais, para melhorar a forma como a riqueza é distribuída e para tornar a sociedade mais justa.

O autor escreve segundo o novo Acordo Ortográfico

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