Jerónimo recusa nova “geringonça” formal e prefere avaliar apoio ao PS “caso a caso”

Líder comunista admite que nunca quis sentar-se conjuntamente com o Bloco e o Governo para não dar sustentação à ideia de que há um Governo de coligação.

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Pedro Fazeres

Não será grande novidade, mas a cada semana vai ficando mais claro: é quase certo que não deverão existir novas posições políticas conjuntas assinadas entre os partidos à esquerda do PS e o Governo socialista, como aconteceu em 2015 por pressão do então Presidente da República Aníbal Cavaco Silva. Os comunistas preferem analisar as propostas socialistas “caso a caso”, medida a medida, orçamento a orçamento. “Não estamos obrigados a tentar repetir o acordo de 2015”, vincou Jerónimo de Sousa nesta segunda-feira de manhã em entrevista à Antena 1.

“É ao pé do pano que talhamos a obra”, apontou o líder comunista recorrendo às suas habituais analogias entre a política e os ditados populares. “Em cada iniciativa e em cada medida do futuro Governo nós agiremos da mesma forma: o que for bom para os trabalhadores e para o povo votaremos a favor e o que for mau votaremos contra.” Ou seja, se em 2015 os comunistas recusaram a proposta do PS para que o acordo escrito incluísse a viabilização dos orçamentos e optou por uma modalidade que previa o “exame comum” do documento, agora também não haverá qualquer "amarramento do PCP”, garante Jerónimo.

Questionado insistentemente sobre a forma como está disponível para assumir compromissos com os socialistas, o secretário-geral comunista garantiu que o partido “não tem linhas vermelhas” nem é seu “hábito fazer anúncios mais ou menos sonantes” - numa espécie de indirecta à actuação dos bloquistas. “O que temos é uma política alternativa perante o que o PS propõe.”

Jerónimo de Sousa não vê qualquer perigo de Portugal enfrentar o mesmo problema de Espanha ou de Itália, em que os resultados eleitorais provoquem um impasse na formação do executivo. E vinca que em mais de 40 anos de democracia nunca houve problemas para a formação de Governo. 

Não houve coligação

Recusando reconhecer se há ou não alguma rivalidade ou desconfiança entre o PCP e o Bloco, Jerónimo admitiu, no entanto, que os comunistas sempre se recusaram a aparecer sentados ao lado do Bloco e do Governo para não dar sustentação aos que repetiam que existiu neste quatro anos uma “maioria de esquerda ou um Governo de coligação”. “O que havia era um Governo minoritário, por isso nunca aceitámos reuniões a três porque isso aceitava essa ideia da coligação ou da maioria de esquerda.”

O líder comunista recusou olhar para a descida da CDU nas autárquicas de 207 e nas europeias de Maio como uma penalização do seu eleitorado pelo envolvimento do PCP na chamada “geringonça"; argumentou que nas autárquicas a coligação perdeu câmaras mas não perdeu influência”. E insistiu na ideia de que as sondagens - que têm dado uma redução da votação para a CDU em relação a 2015 - não costumam ser muito fiáveis nos resultados que apontam para a coligação. “Não há deputados eleitos antes de o povo decidir e o povo ainda não decidiu”, afirmou, preferindo falar da boa receptividade que vê nas ruas e que encontrou na festa do Avante! neste fim-de-semana. “Temos a certeza que o povo português reconhecerá o papel do PCP na procura de soluções e nos avanços que o país teve”.

Apesar da ideia de que a aproximação ao PS e ao Governo pode ter prejudicado eleitoralmente o partido, Jerónimo de Sousa garante que não se arrepende destes quatro anos. “Continuo a ter a ideia fundamental de que tudo o que for bom para os trabalhadores e para o povo também é bom [para o partido]. Mas estamos conscientes dos problemas sociais que o país ainda tem.”

A questão da maioria absoluta

O líder do PCP continua a ter baterias apontadas a uma eventual maioria absoluta dos socialistas alegando que “o PS nunca se libertou nem mudou em relação ao que era, com traços e eixos da política de direita”. A prova está no facto de, a tempos, se ter apoiado na direita e “sobretudo nesta parte final em que o PS procurou a velha companhia do PSD e do CDS na legislação laboral... e isso para nós tem um grande significado.”

Questionado sobre a aproximação do PS ao PAN, como que a preparar um eventual cenário em que aos socialistas baste apenas o apoio do partido de André Silva para chegar à maioria absoluta, Jerónimo afirma que o PCP “nunca será descartável” e concorda que a estratégia do PS é, primeiro, “tentar a maioria absoluta” e, em segundo, “ver [com quem se pode juntar] quem menos incomoda”. Ora, se o PS não eleger 116 deputados, “a arrumação de forças será determinante”, tal como vem sendo desde 2015.

“Sempre que houve maioria absoluta, houve indiferença e subestimação do papel da Assembleia da República [pelo Governo] e, por isso, essa futura arrumação de forças será determinante”, lembra o dirigente comunista

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