Iniciativa demagógica ou demagogia liberal?

Tenho algumas dúvidas se, efectivamente, as pessoas da Iniciativa Liberal acreditam nas medidas propostas ou estas, em particular, são apenas uma forma de gerar atenção para o partido.

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Ricardo Arroja, cabeça de lista da Iniciativa Liberal LUSA/ANTÓNIO PEDRO SANTOS

Desde o início da pré-campanha, torna-se usual o aparecimento de algumas propostas mais dúbias, até mesmo mirabolantes, ou algumas “farpas”, quase em modo de ataque pessoal. Estamos todos habituados a esse nível demagogia e populismo. É certo que não deveria ocorrer, mas parece que é, actualmente, o standard de uma campanha eleitoral. No entanto, a grande generalidade dos concorrentes às legislativas de Outubro não faz uma campanha baseada nestas ideias. Já a campanha da Iniciativa Liberal (IL), a meu ver, é assente em frases e outdoors meramente chamativos, mas com pouco substrato. Não julgo livros pela capa e faço o mesmo em campanhas eleitorais. A direita portuguesa está claramente fragmentada e ainda em angústia devido aos últimos quatro anos, daí o sentimento de diferenciação face aos restantes toldar a mentalidade de quem cria o programa e a campanha eleitorais. Mas isso não é razão para, por exemplo:

  1. Querer definir 15% de IRS para todos. Além desta medida resultar num colapso do sistema social, a medida não é tão boa como querem transparecer. Isto porque 15% para um salário de 800 euros é totalmente diferente de 15% para um salário de 2000, uma vez que a importância relativa (nomeadamente, face ao poder de compra) é totalmente diferente. 15% para um salário de 800 euros é muito mais importante que 15% de um salário de 2000, apesar do valor bruto ser, obviamente, superior no salário mais elevado. A progressividade deste imposto, como está prevista pela lei, deve ser feita pelo aumento da taxa efectiva para um salário mais alto. Creio que alterações podem ser feitas quanto aos escalões (seja em número e em região de escalão), tornando o imposto mais justo e compatível com a realidade portuguesa.
  2. ADSE para todos. E ainda recorrer ao slogan “O privado não será só de alguns”, que é em si mesmo uma contradição. O privado é sempre de alguns e nunca será de todos. Essa é a definição de privado. Torço o nariz só quanto ao conceito de saúde privada, mas a verdade é que os privados na saúde possuem um papel relevante, seja como forma de escoar várias pessoas do SNS ou como um factor de competição para o SNS, fazendo com que este esteja sempre a tentar evoluir, seja em tecnologia, equipamentos ou recursos humanos. No entanto, querer tornar o estado um mero espectador, sem ser regulador e actuando quando tal for necessário, resulta em selvajaria, como sabemos.
  3. Afirmar que o modelo económico-social vigente no nosso país é o socialismo. Esta, honestamente, nem tem ponta por onde se lhe pegue.

Tenho algumas dúvidas se, efectivamente, acreditam nas medidas propostas ou estas, em particular, são apenas uma forma de gerar atenção para o partido. Mas engane-se quem ache que o futuro do liberalismo em Portugal reside na IL. Libertinagem não é liberalismo. No entanto, se o objectivo era ser mais “Thatcherista” do que Thatcher, creio que estão a ser bem-sucedidos. Achei que com 2008 todos aprendemos que o neoliberalismo não é solução. Afinal, os portugueses têm mesmo memória curta.

Costumo citar Lena D’água: “Demagogia, feita à maneira, é como queijo numa ratoeira”. Espero que em Outubro sejamos todos intolerantes à lactose.

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