Resgate, o filme 100% moçambicano que agora chega a Portugal

Produção independente sobre o mundo do crime, com realização de Mickey Fonseca, estreia-se esta quinta-feira no Alvaláxia, em Lisboa, e no Parque Nascente, no Porto.

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Os que resta do cinema S. Gabriel é cenário de uma parte importante de Resgate, a primeira longa-metragem de Mickey Fonseca Imagem retirada do mural de Facebook da produção de <i>Resgate</i>
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Mickey Fonseca realizou e António “Pipas” Forjaz, da Mahla Filmes, foi director de fotografia, montador e produtor de Resgate Imagem retirada do mural de Facebook da produção de <i>Resgate</i>
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O filme centra-se na história de Bruno, que quer mudar de vida depois de ter passado quatro anos na prisão e conhecer finalmente a filha bebé que partilha com Mia dr
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Resgate esteve vários anos a ser preparado e foi mudando com o tempo dr
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"Nós queremos fazer filmes de entretenimento", diz o produtor António “Pipas” Forjaz dr
Mickey Fonseca
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Na Matola, um subúrbio a 20 quilómetros de Maputo, há um cinema chamado S. Gabriel. Quer dizer, estão lá as ruínas deste edifício dos anos 1950, sem telhado nem nada que se pareça. Estes destroços são o cenário de uma parte importante de Resgate, a primeira longa-metragem de Mickey Fonseca, realizador e também guionista desta produção independente que se gaba de ser o primeiro filme 100% moçambicano a estrear-se nas salas portuguesas — só a correcção de cor, feita em Lisboa, e o som, tratado na África do Sul, foram feitos fora do país. Estará, a partir desta quinta-feira e por uma semana, em exibição em dois cinemas que, ao contrário do S. Gabriel, continuam a funcionar: o Alvaláxia, em Lisboa, e o Parque Nascente, no Porto.

Resgate centra-se na história de Bruno, que quer mudar de vida depois de ter passado quatro anos na prisão e conhecer finalmente a filha bebé que partilha com Mia. Tenta encontrar, primeiro sem sucesso, um trabalho como mecânico, a profissão em que se especializou. A tia, irmã da sua recém-falecida mãe, arranja-lhe um emprego numa garagem. Mas este novo plano de vida cai por terra quando, sem aviso, o banco ameaça despejá-lo da casa da mãe se não pagar o empréstimo, por ele desconhecido, que ela contraiu antes de morrer. E é aí que vai ter de voltar ao mundo do crime.

No filme, um cartaz do Nascido Para Matar, de Stanley Kubrick, e uma fotografia de Clint Eastwood em O Bom, o Mau e o Vilão, de Sergio Leone, decoram as paredes do S. Gabriel. "Nós é que pusemos, são filmes que víamos quando éramos miúdos e é uma homenagem em que muita gente não repara”, conta ao PÚBLICO António “Pipas” Forjaz, da Mahla Filmes, a produtora que co-fundou com Mickey Fonseca e que está por trás de Resgate. O S. Gabriel era o próprio cinema onde o realizador ia ver filmes quando era pequeno. “Eu não, vivia em Maputo”, comenta Pipas, que foi director de fotografia, montador e produtor do filme — para a produção e a fotografia, usou a alcunha Pipas, enquanto para a montagem se creditou como António, só para não parecer que é tudo o mesmo gajo”. Mas é “uma vivência” partilhada pelos dois, essa dos cinemas que havia em Moçambique, garante, mesmo que só se tenham conhecido em adultos.

Resgate esteve vários anos a ser preparado e foi mudando com o tempo: por um lado, iam poupando dinheiro com os trabalhos da produtora em publicidade e co-produções, enquanto investiam em equipamento; por outro, Arlete Bombe, a actriz que faz de Mia, engravidou e mudou-se a história para incorporar a filha, esperando que ela crescesse um pouco. Pelo meio houve ainda uma fase de crowdfunding, para uma parte, garante o produtor, muito pequena do orçamento. E em 2011, quando começou uma vaga de raptos ocasionais em Moçambique, decidiram que essa temática teria de estar presente. 

No fim, diz, a equipa provou que é possível “fazer um filme: “Trabalhámos duro e conseguimos com o nosso dinheiro e o nosso equipamento”, remata. Até porque não há indústria no país. “Um filme por ano ou um filme de dois em dois anos não se pode chamar indústria. Em Portugal há uma pequena indústria, aqui nem pequena há.”

O filme que acabaram por fazer lida com a temática do crime. Porquê? “Os filmes que muita gente gosta de ver, como os Padrinho, são sobre gangsters, histórias que animam. Nós queremos fazer filmes de entretenimento, é esse o nosso objectivo, porque era o que íamos ver quando éramos pequenos.” Refere, como clássicos da infância, títulos como O Bom, o Mau e o Vilão, de Sergio Leone, O Comboio Apitou Três Vezes, de Fred Zinneman, Apocalypse Now, de Francis Ford Coppola, e O Meu Nome é Ninguém, de Tonino Valerii​. Este último tinha como protagonista Terence Hill, cuja dupla com Bud Spencer é aliás mencionada nos diálogos de Resgate.

Quando eu e o Mickey éramos miúdos, havia muitos cinemas que os portugueses tinham construído. Tínhamos 25 em Maputo, agora temos três. A maioria ficou destruída, outros tornaram-se igrejas”, partilha o produtor. Há mais cinemas com um projector e algumas colunas, mas não é como deve ser e aquilo a que vocês na Europa estão acostumados”, lamenta.

Isto ocorre, diz, porque “não há pessoas suficientes para pagar bilhete, mas não que não queiram”, continua. Explica que quando estrearam o filme em Moçambique, em Julho, conseguiram “duas ou três sessões com lotação esgotada”, mas depois a frequência começou a diminuir. Decidiram, então, baixar o preço por um dia para um terço do que custava antes. “Vendemos 1300 bilhetes em dois cinemas, tanto que a Lusomundo aceitou fazer mais um dia de promoção. Vendemos mais 800. Mais de 2000 bilhetes em dois dias não é mau para cinemas de cento e tal lugares.”

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