Freitas do Amaral fez tudo “à sua maneira” e não se arrepende de nada

Apresentação do terceiro livro de memórias do fundador do CDS foi presidida por Marcelo Rebelo de Sousa, que o considerou “um dos quatro pais da democracia” portuguesa.

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António Cotrim/Lusa
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“Não é um ajuste de contas com ninguém”, nem um pedido de desculpas”, porque Freitas do Amaral diz não se arrepender “de nada” do que fez ou disse ao longo de cerca de 50 anos de vida política. O livro Mais 35 anos de Democracia - Um percurso singular, editado pela Bertrand, o terceiro dedicado às suas memórias e que abrange o período entre 1982 e 2017, são as memórias do que chama “uma vida singular”. Foi apresentado nesta quinta-feira e contou com a presença do Presidente da República.

No Centro Cultural de Belém, o fundador do CDS apresentou o que diz ser “a sua verdade, com a imparcialidade possível”, esperando que, no futuro, possa ser útil a historiadores, “porque é verdade que mais ninguém deu”.

Numa longa vida e intensa vida política, Freitas revelou que o que mais o marcou na vida foi a sua “militância democrata-cristã”, “com a preocupação de ajudar os outros”. “Enquanto tiver um sopro de vida, quero dar continuar este propósito”, afirmou.

“Olhando para trás, para estes 45, 50 anos, penso que aquilo que mais me marcou foi a minha filiação democrata-cristã. Em primeiro lugar, a democracia, a qual explica quatro recusas de convites feitas pelo meu mestre e amigo, doutor Marcello Caetano, durante o Estado Novo. E explica mais de uma dezena de ‘sins’ que fiz conscientemente depois do 25 de Abril. Mas democracia-cristã, inspirada na vida e nos ensinamentos de Jesus Cristo”, afirmou.

Freitas terminou a sua curta intervenção, lendo em inglês parte de uma conhecida canção: My way, imortalizada por Frank Sinatra. “I've lived a life that's full/I've traveled each and every highway//But more, much more than this/I did it my way”, leu.

Já Marcelo Rebelo de Sousa considerou Freitas do Amaral uma “figura estruturante para democracia portuguesa e para que houvesse direita em Portugal”. Acabou mesmo por o classificar como “um dos quatro pais da democracia portuguesa”, a par de Mário Soares, Álvaro Cunhal e Sá Carneiro

No livro, Freitas do Amaral faz algumas revelações sobre a sua vida política. Afirma que a direita ficou zangada consigo por ter aceitado o cargo de ministro dos Negócios Estrangeiros no primeiro Governo de José Sócrates (2005-2006) como independente. Diz mesmo “que muitos se afastaram” dele desde que aceitou o convite.

“A direita portuguesa não aceitou. Ela achava que eu passara a ser propriedade sua, e só podia fazer o que fosse do seu agrado. A minha liberdade política, que incluía aliar-me com quem quisesse, devia ter ficado limitada pela propriedade política que a direita se arrogava sobre mim. Aliás, a direita costuma dar mais importância à propriedade do que à liberdade”, afirma.

“Houve uma primeira fase em que, com o país demasiado virado à esquerda, acentuei sobretudo valores de direita. E uma segunda fase em que, julgando eu que o país estava demasiado virado à direita, acentuei sobretudo valores de esquerda. Sempre no quadro amplo, vasto e profundo da democracia-cristã”, afirmou nesta quinta-feira.

E desde que saiu do Governo, “apenas por questões de saúde”, nunca mais foi convidado, “seriamente, para qualquer cargo público ou privado, de 2006 até hoje, por ostracismo”, acrescenta no livro.

Porém, antes de 2006, teve alguns convites importantes. Freitas revela no livro de memórias que os antigos primeiros-ministros Durão Barroso e José Sócrates tentaram que se candidatasse à Presidência da República contra Jorge Sampaio e Cavaco Silva. Recusou o convite de Barroso em 2001 na recandidatura de Jorge Sampaio e, em 2006, Sócrates terá tentado que concorresse contra Cavaco Silva, mas Mário Soares viria a antecipar-se e esta questão não voltou a colocar-se.

Na apresentação estiveram os centristas Diogo Feio, Manuel Queiró e Celeste Cardona, o antigo líder do partido Ribeiro e Castro, os sociais-democratas Ângelo Correia e Rui Machete, o advogado Proença de Carvalho, o constitucionalista Jorge Miranda e a deputada do PS Helena Roseta. O livro foi apresentado por Teresa Pizarro Beleza.

Nascido em 21 de Julho de 1941, na Póvoa de Varzim, Diogo Freitas do Amaral foi fundador e primeiro presidente do CDS, primeiro-ministro interino (após a morte de Sá Carneiro), vice-primeiro-ministro, ministros dos Negócios Estrangeiros (duas vezes) e ministro da Defesa Nacional. No plano internacional, foi presidente da Assembleia Geral da ONU (1995-96) e da União Europeia das Democracias Cristãs (1981-83).

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