Relvado artificial e barraquinhas no Miradouro da Vitória? Câmara do Porto mandou retirar

Empresa que instalou um mercado gastronómico e de artesanato no miradouro diz que câmara sabia do evento e não se opôs antes a ele. Autarquia responde que utilização feita do espaço não foi adequada. Reabilitação do Miradouro da Vitória, privatizado em 2010, pode avançar ainda este ano

Foto
Miradouro da Vitória integrava um lote que a Fundação para o Desenvolvimento da Zona Histórica do Porto vendeu em 2010 Gonçalo Dias

A Câmara do Porto mandou pôr um ponto final no mercado de gastronomia e artesanato instalado no Miradouro da Vitória, privatizado em 2010. No logradouro, um dos pontos turísticos mais badalados da cidade, colocou-se há cerca de uma semana um relvado sintético e instalou-se um mercado com várias barraquinhas de madeira e diversas mesas. A Blue Target, empresa organizadora deste “evento temporário”, vai acatar a notificação da autarquia. Mas sob “indignação”. É que, segundo a responsável Marta Barreiros, a intenção de instalar ali um mercado foi comunicada por escrito à câmara e esta nunca não se opôs. Por ser um espaço privado, terá sido dito pelo Gabinete do Munícipe à Blue Target que não carecia de autorização e teria apenas de fazer um “licenciamento zero”, iniciativa do Programa Simplex que permite prescindir de um alvará e exige apenas uma comunicação prévia para emitir uma licença.

Contactado pelo PÚBLICO, o gabinete de comunicação de Rui Moreira afirmou que, ao tomar conhecimento da “intervenção” no miradouro, a Câmara do Porto decidiu “diligenciar no sentido de ser ordenada a reposição do terreno e a cessação de utilização da parte do prédio, ou seja, do logradouro que se encontra a ser utilizado para um fim distinto do uso previsto”. 

Foto
Gonçalo Dias

Garantindo não ter recebido qualquer pedido de licenciamento, a autarquia reafirma a sua posição: “Considerando a intervenção que ali foi feita, constatou-se que os ‘quiosques’ implantados no local têm diversos usos, entre os quais, comércio e serviços (nomeadamente restauração e bebidas) e, nessa medida, estão em desconformidade com o uso que resulta da caderneta predial. Mais ainda, a utilização do solo, tal como está a ser praticada, constitui uma operação urbanística, uma vez que se trata da utilização do solo, para fins não exclusivamente agrícolas, pecuários, florestais, mineiros ou de abastecimento público de água, sendo que esta operação urbanística estaria sujeita a licença administrativa, ou seja, a licenciamento.”

No dia 18 de Junho, terça-feira, a Polícia Municipal notificou os “interessados” – a organizadora Blue Traget e os proprietários do lote, a Sociedade Maranhão Amaral Pinheiro & Gomes. Na manhã seguinte, os comerciantes das barraquinhas começaram a levantar os produtos e a abandonar a Rua da Bataria da Vitória e no feriado desta quinta-feira e manhã de sexta o espaço esteve já com os portões encerrados, vedando-se assim o acesso ao próprio miradouro.

Marta Barreiro, da Blue Target, recorda que aquele era um “evento temporário, com estruturas amovíveis” e, por isso, a argumentação da Câmara do Porto para que agora abandonassem o espaço por não terem “licença de obra” não faz sentido. “Não fizemos obra nenhuma”, notou. Com a notificação recebida na quarta-feira e um feriado pelo meio, Marta Barreiros disse não ter tido outra opção que não acatar a decisão. Apesar dos prejuízos e constrangimentos para a empresa e os comerciantes.

O Miradouro da Vitória integrava um lote que a Fundação para o Desenvolvimento da Zona Histórica do Porto, entretanto extinta, vendeu em 2010 e incluía os dois prédios contíguos, com duas frentes, para a Rua de São Bento da Vitória e a Rua de São Miguel. Nessa altura havia ainda vários inquilinos a viver ali. Hoje, não sobra nenhum no edifício e são poucos os que moram nas duas ruas.

Fotogaleria

Foi a sociedade construtora Maranhão quem na altura adquiriu o lote, tendo colocado no portão de ferro de acesso ao logradouro uma indicação de aquela ser uma “propriedade privada”, algo que, à época, gerou indignação. Agora, a indicação de espaço privado permanece, mas com a indicação de que o acesso para “fins turísticos” é permitido. A propriedade do lote continua na mesma sociedade, mas a sua composição foi-se alterando ao longo dos anos. Actualmente, é composta pela família dos donos do Externato Ribadouro, no Porto, e mais um sócio.

A decisão de cessar o evento poderá pôr em causa o acesso ao miradouro na noite de São João. Ao PÚBLICO, o assessor da sociedade, Rui de Sousa, disse que a empresa está a avaliar se existem “condições de segurança” para abrir aquele que é um dos pontos mais procurados da cidade para ver o fogo-de-artifício. “O evento era uma forma da segurança estar garantida, sem ele não sabemos se estará.”

Reabilitação a caminho

A sociedade construtora está a estudar um “projecto global” para aquele lote, mas diz já ter submetido à aprovação da autarquia um “projecto parcial de renovação das fachadas e uma intervenção urbanística no logradouro”. Algo que poderá arrancar ainda este ano. Para o prédio, admite, a hipótese de ali instalar um hotel está no “topo das prioridades”. Mas a decisão está por tomar.

O estado de abandono e degradação de alguns miradouros da cidade é uma história antiga. Entre os municipais, os Miradouros do Monte Tadeu e das Fontainhas, informou a autarquia, estão previstas algumas intervenções pela empresa municipal GO Porto. Na zona envolvente do passeio das Fontainhas estão em “fase de contratação” os projectos de reabilitação, que vão incluir a “reconstituição de todos detalhes arquitectónicos em falta”. Na mesma fase de contratação está uma intervenção nas escadas de Monte Tadeu; e a partir do projecto Rua Direita, o executivo quer reabilitar integralmente a Rua de Monte Tadeu. Nos últimos dois anos, entre 2017 e 2018, acrescenta, a Travessa de Monte Tadeu e o Largo Monte Tadeu sofreram intervenções para melhorar “as condições de acessibilidade pedonal daquela zona”.  

Sugerir correcção
Comentar