O racismo está no meio de nós

O preconceito racial não é uma idiossincrasia desta ou daquela esquadra. É transversal a toda a sociedade.

O perigo para a polícia não é acolher e tolerar agentes com suásticas tatuadas no corpo e mais susceptíveis de comportamentos racistas e xenófobos. O perigo para a polícia e para o seu principal sindicato é ter entre si um vice-presidente que ousou dizê-lo numa tese de mestrado. Quando a Associação Sindical de Profissionais de Polícia (ASPP) prescinde ou força um dos seus líderes históricos a demitir-se, por este afirmar que existe racismo na instituição, não está a fazer outra coisa que não seja proteger os comportamentos que Manuel Morais denunciou. A direcção da ASPP e os seus membros toleram mais o comportamento indigno de agentes que exteriorizam os seus ideais racistas do que a dignidade de quem defende o combate ao preconceito. O preconceito racial não é uma idiossincrasia desta ou daquela esquadra. Ele está no meio de nós. É transversal a toda a sociedade. Constatar que a discriminação existe, como esta semana sublinhou a ministra da Justiça, não é um crime de alta traição.

Os crimes pelos quais foram condenados oito polícias da esquadra de Alfragide deveriam ter desencadeado protestos mais veementes do que aqueles que desencadearam as palavras de Manuel Morais. A última coisa de que precisávamos era de uma polícia infiltrada por ideais de extrema-direita xenófoba e racista, que silencia a dignidade de quem não quer ver a sua classe invadida pela intolerância mais execrável.

Já basta que a PSP use critérios étnicos na avaliação dos graus de risco das zonas urbanas sensíveis, numa clara atitude de preconceito, sobre as quais o ex-vice presidente da ASPP fez a sua tese de mestrado, porque os bandidos estão todos no mesmo sítio e têm uma determinada coloração. Ou que Portugal surja com muito frequência nos piores lugares da discriminação racial nos relatórios internacionais sobre violência policial, por causa da forma como são tratados os afrodescendentes ou estrangeiros na hora da detenção ou quando estão à guarda das forças policiais. Ou ainda que seja referido em outros relatórios como tendo uma polícia que tolera o racismo e que não investiga a fundo as denúncias que recebe. O presidente da ASPP disse que a continuidade do seu ex-vice-presidente “podia trazer consequências graves” ao sindicato. O que deveria ter percebido é que a sua saída vai ter consequências piores para a polícia.

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