O abraço de Bannon e as lágrimas de May

Entre a direita radical e o extremismo de esquerda há um abraço que se estreita de cada vez que uma solução ao centro ou, no caso, a hipótese de uma solução, desaba.

O momento foi capturado por uma jornalista no Cazaquistão. O ex-deputado trabalhista George Galloway, que tem palmilhado o caminho do extremismo pela esquerda, que já participou no Big Brother, é apoiante do Partido do Brexit de Neigel Farage nestas eleições, deu a Steve Bannon a notícia: “Theresa May demitiu-se.” O ex-conselheiro de Donald Trump foi espontâneo: “Deixe-me dar-lhe um abraço.”

Entre a direita radical e o extremismo de esquerda há um abraço que se estreita de cada vez que uma solução ao centro, ou, no caso, a hipótese de uma solução, desaba. Foi isso que a comemoração de Steve Bannon significou. E não demorou muito tempo para que o conservador Boris Johnson viesse dar voz ao momento de gáudio: “Vamos deixar a União Europeia em 31 de Outubro, com ou sem acordo.”

Sim, com grande probabilidade é este o destino do Reino Unido, o caos de uma saída sem acordo que provavelmente arrastará a Europa para grandes problemas económicos – porque, apesar de muitos sempre terem olhado para a primeira-ministra como o rosto dessa medida extrema que é o “Brexit”, a verdade é que a sua saída de cena deverá representar o estertor das sucessivas tentativas de encontrar uma saída menos má para o embaraço em que se encontra a velha Albion.

Emaranhada nas linhas vermelhas que os sectores mais tradicionais do seu partido lhe ditaram, sem uma solução lógica para a questão irlandesa, há muito que May caminhava de tropeção em tropeção, numa sucessão em que o fim das negociações com o timorato Partido Trabalhista terá sido o tombo final. Traída pelo seu próprio partido, com o Governo a esboroar-se, na expectativa de um desastroso resultado nas eleições de domingo, não tinha outra saída que dar-se por vencida.

As suas lágrimas, depois da frase “O país que eu amo”, mais do que a emoção do momento, parecem traduzir a consciência histórica do potencial de caos que se abre à Europa na sequência deste falhanço. E é nesse caos que aposta um estratego como Steve Bannon, mesmo que diga que está do “lado certo da História”, porque está disposto a enfrentar os problemas da imigração e a corporizar o regresso em força nacionalismo junto de quem teme os efeitos da globalização. É no caos que medram as soluções autoritárias que têm sido tão amigas de Bannon e é desse caminho escuro que nos falam os olhos tristes de Theresa May.  

Sugerir correcção
Ler 8 comentários