Formar para poder participar em liberdade

A participação só é para todos se nos preocuparmos em garanti-la. O Estado e cada um de nós falha porque continua a não tratar a abstenção como uma ameaça real que urge combater.

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Nuno Ferreira Santos

Na antecâmara das eleições europeias e já sendo sobrevoado pela intensa (ainda que vazia de discussão europeia) campanha eleitoral, penso no que seria da nossa democracia, que é como quem diz “de nós”, se todos participássemos de forma consciente e informada. Claro está que consciência e informação levarão, inevitavelmente, a conclusões díspares – mas é mesmo essa a riqueza democrática que, com apenas 19 anos, temo possamos vir a perder.

Por volta dos feriados dos dias 1 de Maio e 25 de Abril, senti o impulso de fazer uma coisa pouco vulgar: expor a minha opinião através de um veículo que não a minha própria voz. É, portanto, natural que este texto tenha um tanto de apelo ao trabalho e outro tanto de elevação da liberdade, desde logo pelo simples motivo de estar a escrever e daquilo que escrevo chegar (espero eu) a outras pessoas sem qualquer tipo de filtro ou censura.

Bem sei que qualquer trabalho deve ser feito com decoro. Ao recordar-me da frase inscrita no tecto da Livraria Lello, no Porto, – decus in labore – espero, ao ser consistente e rigoroso neste texto, conseguir pô-la em prática. Lembro-me ainda da dificuldade que é para um estudante passar da teoria à prática desta afirmação. Por isso mesmo, para alguém com falta de educação (leia-se instrução e não bons modos) sê-lo-á também: provavelmente com ainda maior intensidade.

Falar em trabalho implica falar em liberdade. Neste momento, poucas coisas me parecem melhores do que evocá-la e alertar para o perigo de não a sabermos conservar. Não sou apologista da ideia que só sabemos o que algo verdadeiramente é, se o tivermos vivido. Mas, que o contacto na primeira pessoa ajuda, ai disso não tenhamos dúvidas. A sugestão é que deixemos de nos conformar e o pedido que nos ensinem a valorizar a liberdade, nunca que nos impinjam uma vida sem ela. Todos devemos participar e envolver-nos com o mundo que nos rodeia. Devemos é garantir que estamos devidamente preparados para o fazer com consistência.

Acredito que os mais de 65% dos eleitores que não votaram nas últimas eleições europeias não participam porque sentem um enorme afastamento entre o poder político e as suas vidas quotidianas (e também entre o que o candidato diz e o eleito faz). Mas também – e não menos relevante - porque não estão suficientemente esclarecidos acerca do que implica viver em democracia e, ser, desde a nascença, obrigatoriamente parte dela. Assim sendo, há duas coisas que quero sugerir:   

  1. Que se ensine, possivelmente a partir do 6.º ano de escolaridade e a título obrigatório, o que são, para que servem e o que fazem os partidos políticos; o que é a democracia e como é que, quer em Portugal quer no resto do mundo (com ênfase na União Europeia), esta ganha vida. E aqui surgem, uma vez mais, os partidos políticos e, sobretudo, as inúmeras instituições que garantem o funcionamento deste regime de vida em sociedade, associações e outros movimentos que promovem uma cidadania activa.
  2. Que se discuta aquilo que no ponto 1 propus, sendo certo que esta não seria, ainda que de baixo custo e potencialmente apoiada comunitariamente, uma medida milagrosa, mas antes parte da solução de um problema cuja origem é bem maior do que enunciei. Esta troca de ideias deve notar que legislar sobre o sistema de ensino é ainda de exclusiva competência dos Parlamentos Nacionais e que tal medida só faria sentido não discriminando áreas de estudo, nem tipo de ensino – Público ou Privado.

Se, por um lado, alguns têm a sorte de, quase de forma intrínseca, se interessarem por Política, Desporto ou Arte, igualmente verdadeiro é afirmar que todos devem ter a hipótese de se cultivar em todas as áreas. A participação só é para todos se nos preocuparmos em garanti-la. E aí sim, parece-me que o Estado e cada um de nós falha porque continua a não tratar a abstenção como uma ameaça real que urge combater.

Dito isto, fica o desejo de que todos os que vão votar nas próximas eleições se informem antes de o fazer; e que, na altura das próximas eleições Europeias (em princípio em 2024) possamos constatar que temos uma população mais esclarecida e com vontade de, com mais do que gostos, partilhas ou comentários inúteis, dizer o que pensa.

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