Ao menos não foi um workshop de maquilhagem…

A opção da Câmara Municipal para o dia 8 de Março, o dia em que ecoou no país uma voz colectiva contra as desigualdades, foi… (surpresa!) oferecer camélias às mulheres que se dirigiram ao Gabinete do Munícipe

À meia noite do dia 8 de março, uma bandeira da Greve Feminista foi hasteada em frente ao Tribunal da Relação do Porto e foi convocada para as 18h30 uma concentração na Praça dos Poveiras, no contexto da Greve Feminista que se realiza este ano em Portugal, com a mobilização de 12 cidades portuguesas, uma delas o Porto. Há cartazes na cidade toda. Rui Moreira não deve ter visto.

Não deve saber que as mulheres do Porto estiveram a reclamar direitos. Trabalho, respostas às famílias, educação, sustentabilidade financeira, habitação, segurança nas ruas e em casa, auto-determinação. Algumas das reivindicações a que dão voz as mulheres que puderam fazer greve, as que não puderam e se solidarizaram, as que se juntaram ao final do dia para se manifestarem contra a discriminação estrutural que se traduz na disparidade evidente entre homens e mulheres no que às oportunidades diz respeito. Rui Moreira não deve saber disso.

Na Assembleia Municipal do passado dia 25 de Fevereiro, o Bloco de Esquerda usou do escasso espaço que tem para declarações políticas para falar da Greve Feminista, da sua contextualização, dos seus eixos e do que é um município que tem os direitos de todas e de todos como prioridade. Um município que tem um plano de igualdade actualizado, medidas de combate à violência contra as mulheres, políticas transversais de educação, de habitação, de apoio aos cuidados informais, condições de trabalho de combate à precariedade, uma gestão atenta do espaço público e dos transportes. Rui Moreira não deve ter ouvido.

O Gabinete do Munícipe (e da munícipe, há que intuir) é um espaço na cidade onde se tem acesso a um conjunto de serviços inerentes a uma série de dimensões que dizem respeito ao concreto da vida das pessoas. O serviço municipalizado de apoio à reutilização de manuais escolares (menos mal, enquanto não se garantem manuais gratuitos), serviço municipal de aconselhamento jurídico (onde, pensar-se-á, se pode recorrer por exemplo em situações de violência doméstica ou de bullying imobiliário), serviço municipal de apoio ao consumidor (e à consumidora, naturalmente), Águas do Porto (onde se deve poder obter informações sobre a tarifa social da água, ou talvez ainda não), gabinete de apoio ao provedor do munícipe (onde recorrem hoje, depois da extinção da provedoria da pessoa com deficiência, todas as pessoas da cidade em toda a diversidade que tal implica), gabinete da inclusão, Europe Direct e Polícia Municipal. Ah! E é onde as pessoas se podem inscrever para participarem nas reuniões do Executivo e da Assembleia Municipal. Enfim, é o balcão de atendimento da Câmara às pessoas da cidade. Dir-se-ia portanto que uma iniciativa no Dia da Mulher, neste espaço, passaria por reforçar o acesso à informação sobre os direitos das mulheres em face das suas necessidades específicas, ou por abrir um espaço de discussão sobre políticas locais de igualdade, ou assinalar a data com alguma medida concreta que politize a vida das mulheres. Rui Moreira não deve ter esse entendimento.

A opção da Câmara Municipal para o dia 8 de Março, o dia em que ecoou no país uma voz colectiva contra as desigualdades, foi… (surpresa!) oferecer camélias às mulheres que se dirigiram ao Gabinete do Munícipe. Assim é bonito, sim senhor. E compensa todo o resto. Toda a fragilidade, vulnerabilidade e desprotecção ficaram hoje colmatadas. Rui Moreira assim o entenderá. E a cidade agradece. Ou não.

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