Governo alemão patrocina fusão entre Deutsche Bank e Commerzbank

As permanentes debilidades de dois dos principais bancos alemães forçaram o executivo de Angela Merkel a promover um entendimento com vista a uma fusão. Numa semana em que o BCE voltou a abrir a torneira de liquidez para ajudar a banca num cenário de arrefecimento económico.

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Reuters/Ralph Orlowski

Os últimos dias ficaram marcados pela decisão do BCE de adiar o regresso à normalidade dos juros, reforçando o apoio de liquidez à banca, para atenuar os riscos associados à desaceleração das economias europeia e mundial. Num quadro em que os analistas já falam numa possível recessão, ainda que prevejam ligeira, e destacam sinais de perigo associados à disfuncionalidade política crónica italiana e ao arrefecimento das economias chinesa e alemã, a semana fechou com a indicação de que pode estar para breve uma operação que retire do meio da tempestade o gigante alemão Deutsche Bank (DB).

Esta sexta-feira, a imprensa internacional avançou que estavam a ser dados novos avanços na fusão do Deutsche Bank com o Commerzbank (detido em 15% pelo Estado alemão), ambos cotados em bolsa.

A tentativa de criar um grande banco, a partir de dois bancos com fraquezas estruturais para dali resultar um mais forte, ganhou força com a revelação de que os presidentes Christian Sewing, do DB, e Martin Zielke, do Commerzbank, mantiveram reuniões para discutir os termos do negócio. E que o fizeram com mandato dos respectivos conselhos de administração e conselhos de supervisão. Um projecto bancário influenciado politicamente por Angela Merkel, a chanceler alemã, embora ainda se desconheça de que forma é que será concretizada a operação.

Depois de o governo holandês se ter movimentado na companhia aérea KLM/Air France, subindo a sua posição no capital para 15% para defender interesses estratégicos, e para contrabalançar o peso do Estado francês, foi a vez de o ministro das Finanças alemão Olaf Scholz se posicionar no mesmo sentido. Na edição de 5 de Março, o diário anglo-saxónico Financial Times atribuiu a Scholz a declaração: “O sector bancário é crítico para a soberania nacional alemã.” 

Para Olaf Scholz, o projecto de fusão bancária visa criar um “campeão nacional” para financiar a economia alemã, em particular as empresas exportadoras. A imprensa internacional salienta que será criado, caso se concretize, o terceiro maior banco europeu, atrás do britânico HSBC e do francês BNP Paribas, com triliões de dólares em activos.

Desde 2018 que a cotação do DB - que o FMI considerou um dos grupos com maior risco sistémico para o sector financeiro internacional - tem vindo a derrapar para níveis historicamente baixos. Os investidores desconfiam dos resultados dos testes de stress, os designados AQR, que incluem as avaliações a preços do momento, mark-to-market, do portefólio dos activos de risco (em full-in core Tier 1).

Mas os problemas do DB, com mais de 50% de accionistas alemães, não se limitam apenas às suas debilidades financeiras. Em cima da mesa há um tema de má reputação. É que o banco alemão tem estado envolvido em todos os grandes casos de corrupção na Europa e nos EUA, antes e depois da crise financeira de 2008. A persistência ao longo de mais de 10 anos das más práticas, que deram origem a multas milionárias e que fazem tremer os seus alicerces, também expuseram as debilidades do Bundesbank e do BCE para o fiscalizarem. E mostraram, nomeadamente, que Frankfurt tem actuado com dois pesos e duas medidas conforme os países e os bancos em causa. Em Portugal, por exemplo, as pressões vindas da ortodoxia alemã privilegiaram a venda das instituições problemáticas a investidores estrangeiros, perante a impotência nacional.

Ao promover a união entre o DB e o Commerzbank, Bona – sede do governo alemão - não está apenas a ajudar a esconder a cultura de ilegalidades que tem estado em vigor no banco, cuja actividade se desenvolve em grande parte fora do mercado doméstico, dada a sua natureza global e forte concorrência interna.

A Alemanha evita também ter de reconhecer que em casa tem uma doença, a fraqueza do seu sistema bancário, onde mais de 60% é de capitais públicos - na sua maioria são caixas regionais, ligadas aos landers e estão excluídas da supervisão do BCE e amparadas pelos governos regionais. Aliás, os alemães negociaram a União Bancária sem inclusão destas entidades regionais.

Hoje o que está em causa é o futuro do gigante privado, cotado, DB. Caso a concentração se confirme, não será uma operação inédita para o parceiro escolhido, o Commerzbank, que, após a crise financeira de 2008, já protagonizou uma operação de concentração, absorvendo o Dresdner Bank. Resta saber se da junção de todos, DB, CB/Dresdner, vai nascer um banco bom.  

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