A "geringonça" e a asfixia das expectativas

Os socialistas escolheram o “meio-termo aristotélico” como leitmotiv da sua estratégia política. Sim, garantem, estamos no bom caminho, mas o caminho faz-se andando e ainda não chegámos ao nosso destino.

Enfermeiros, médicos, funcionários judiciais, magistrados, forças de segurança, etc. Talvez não seja despropositado perguntar: quem é que não está em greve na função pública portuguesa? É certo que a avalanche de greves que assola o país é um resultado inevitável da melhor conjuntura económica do país mas é, também, uma consequência expectável da forma como o governo usou e abusou da evolução positiva da nossa economia para legitimar o seu poder. Aproximam-se eleições. O senso comum dita que o governo terá de celebrar os seus feitos económicos no processo eleitoral. Todavia, sempre que o governo rejubila com os resultados da sua governação, milhares de funcionários públicos pensam: se a situação do país está muito melhor, então porque raio continuo eu a receber pouco mais do que recebia durante a malfadada austeridade? Se o governo celebra a presente situação de forma excessivamente efusiva, estimula mais greves. Se não a celebra, perde legitimidade.

A resposta do governo socialista a esta debilitante situação tem sido esta: moderar a celebração dos feitos económicos com o pragmatismo austero de Centeno. Sempre que assistimos a uma proclamação grandiosa de qualquer membro do governo, um ou dois dias depois o ministro das Finanças Centeno sugere prudência e bom senso. Parece-me evidente que os socialistas escolheram o “meio-termo aristotélico” como leitmotiv da sua estratégia política. Sim, garantem, estamos no bom caminho, mas o caminho faz-se andando e ainda não chegámos ao nosso destino. Será esta a fórmula mágica dos socialistas? Esta estratégia política vai ser bem-sucedida? Só o tempo dirá mas, confesso, não me parece que o futuro seja risonho. Porquê? Para o governo e certamente para uma boa parte do eleitorado socialista, a postura dos governantes será considerada sensata e moderada. Para os funcionários públicos, para muitos outros socialistas e para os eleitorados dos restantes partidos esta postura ambivalente será certamente considerada hipócrita.

A "geringonça" está a ser asfixiada pelas expectativas crescentes de muitos portugueses. Se o governo cede às exigências de um sector da função pública acusar-lhe-ão de favoritismo. Se não cede a qualquer exigência, será acusado da mais vil hipocrisia. Se cede a todas as exigências de forma comedida, Bruxelas intervirá de forma decisiva. O que pode o governo fazer? Rezar. 

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