“O Facebook é grande demais e devia ser partido aos bocados”

O investigador Gustavo Cardoso sugere a adopção de uma solução semelhante à que foi posta em prática na empresa de telecomunicações AT&T nos Estados Unidos, em 1984.

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Mark Zuckerberg, com os logotipos das empresas do grupo Robert Galbraith/REUTERS

O especialista em comunicação Gustavo Cardoso diz que o Facebook “é grande demais e devia ser partido aos bocados”, devido à sua posição dominante no mercado.

Numa entrevista no âmbito do 15.º aniversário da rede social, que se assinala na segunda-feira, o investigador do ISCTE-IUL disse à agência Lusa que empresas como o Facebook ou a Google são até “provavelmente grandes demais para o seu interesse enquanto empresas e, em última análise, para os seus accionistas”. Também não são benéficas para “os governos que albergam as suas sedes” nem para a “capacidade de inovação nas diferentes economias”.

Além da rede social homónima, o Facebook detém também a rede social Instagram e a aplicação de mensagens instantâneas Whatsapp.

“Se o Facebook conseguir criar uma espécie de sistema fechado em que quando eu saio de uma marca passo para outra da qual também sou o proprietário, isso é o sistema ideal, se tolerarmos a existência de monopólios. A questão é perceber se isso é positivo, e a minha resposta é que não, não é positivo, o Facebook é grande demais e devia ser partido aos bocados", defendeu o docente do ISCTE-IUL.

É por ser uma economia de rede que o Facebook cresceu tanto, explica o investigador. “As economias de rede sem regulação nenhuma tendem a transformar-se em monopólios, apenas porque em princípio oferecem a vantagem de mais gente estar dentro”.

“Isto é uma vantagem enorme para a pessoa que chega depois. Se já estão dez e eu sou o 11.º...”, gera-se um efeito de multiplicação de utilizadores, afirmou.
Por isso, Gustavo Cardoso considera que o Facebook é uma das empresas que “cresceram demasiado, que estão a uma escala que é maior do que a que deviam ter e que têm de ser reduzidas depois de dez anos. Estamos a falar de 10/15 anos, isto nem sequer é uma geração”.

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Gustavo Cardoso: "O Facebook e a Google são até grandes demais para o seu interesse" Fernando Veludo/PUBLICO

Estratégia “baby bells”

Gustavo Cardoso sugere a adopção de uma solução semelhante à que foi posta em prática na empresa de telecomunicações AT&T nos Estados Unidos, em 1984. Nesse ano, a AT&T, que detinha o monopólio do sector telefónico nos EUA, quer ao nível dos serviços quer de equipamentos, foi partida em sete companhias regionais e numa muito mais pequena (que ficaram conhecidas como baby bells), também designada de AT&T.

Gustavo Cardoso considera que se chegou a um ponto semelhante relativamente à empresa liderada por Mark Zuckerberg. "Chegados a este ponto, temos que fazer alguma coisa", defendeu. “Não estamos a inventar absolutamente nada”, assinalou.

“Pela primeira vez, temos monopólios à escala do planeta e não monopólios apenas em alguns países”, disse, considerando que é “relativamente partilhado” na teoria económica que empresas como o Facebook se consideram como monopólios. O investigador do ISCTE-IUL afirma que ainda não foi adoptada uma solução do género por “falta de vontade política”, pois considera que a sociedade tem as ferramentas para executar.

“Mas isso só acontece quando um dos lados acha que o outro tem demasiado poder e, portanto, tem de fazer alguma coisa”, justificou.

Dois tipos de moedas

Em termos futuros, além de se discutir a dimensão do Facebook e a sua possível divisão, o docente considera que uma outra renegociação de poder poderá acontecer “à medida que as pessoas tomarem consciência” de que “na realidade as suas carteiras têm dois tipos de moedas, as de euro e os seus dados pessoais”. Mas essa alteração virá “por via do dinheiro e não por via das liberdades e garantias”.

A alusão aos dois tipos de moedas é sustentada no facto de o Facebook gerar receitas através da publicidade segmentada, que é criada consoante os tipos de dados pessoais, comportamentos, 'gostos' e interacções que os utilizadores submetem e adoptam na rede social.

Gustavo Cardoso considera que a partir do momento em que as pessoas começarem a 'converter' os seus dados pessoais em euros e a ganharem consciência das implicações dessa conversão, interrogar-se-ão: “Bem, mas eu estou a pagar ao Facebook X todos os meses? Só porque o estou a utilizar? Então o que é que recebo em troca?”.

O investigador também considera que é “perfeitamente possível” que nos próximos anos empresas como o Facebook ou a Google venham a “criar ou comprar órgãos de comunicação social” em diferentes países.
 

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