Porque falham as nações e porque falha Portugal?

As mesmas pessoas podem viver em pobreza extrema num país e prosperar quando mudam para outro. Como pode uma fronteira fazer a diferença?

Os reconhecidíssimos economistas Daron Acemoglu e James Robinson publicaram, em 2012, o livro seminal Why nations fail: the origins of power, prosperity, and poverty, que ajuda a compreender as causas do atraso de uma economia e como pode ser ultrapassado.

Acemoglu e Robinson mostram que são as instituições políticas e económicas que estão na base do êxito económico ou na sua falta. A realidade atual mostra que as mesmas pessoas podem viver em pobreza extrema num país e prosperar quando mudam para outro. Como pode uma fronteira fazer a diferença? A explicação dominante, nos anos 60, considerava que os países pobres não possuíam capital para investir e, nos anos 80, assumia que seguiam políticas económicas erradas. O recente sucesso chinês é utilizado, sobretudo por elites africanas, a quem dá jeito, como prova dos benefícios da autocracia política. Mas a ascensão da China não é a chave para a prosperidade que as sociedades ocidentais têm como garantida.

Acemoglu e Robinson mostram que o sucesso de um país surge quando as instituições são inclusivas e pluralistas, ou seja, incluem a maioria da população na comunidade política e económica, criando incentivos para quem investe no futuro. A prosperidade moderna é gerada por investimento e inovação, pelo que investidores e inovadores têm de ter garantia da apropriação dos “frutos” do seu sucesso. As condições mínimas são uma adequada constituição escrita, eleições democráticas, poder político centralizado e competente que acomode todos os interesses, direito à propriedade com tratamento igual de todos face à lei, respeito pelos contratos, facilidade para abrir uma empresa, mercados competitivos e liberdade para que os cidadãos se expressem e desempenhem as profissões pretendidas.

Na China “socialista” o poder está centralizado. Mas, mesmo admitindo que é competente, não responde ao interesse de todos, pois “o partido controla as forças armadas, os quadros e as notícias”. As instituições são extrativas porque são anti-democráticas e restringem os ganhos económicos a uma elite, distribuindo a riqueza “para cima”, tornando os pobres cada vez mais pobres. Este poder centralizado permite escapar da pobreza, crescendo, mas não permitirá a ascensão até à prosperidade moderna porque o crescimento, enviesado para a elite, é insustentável. As instituições (extrativas) permitem que a elite sirva os seus interesses, mas estes colidirão e subjugarão os da população em geral.

A diferença entre o caminho percorrido pelas colónias portuguesas e britânicas prova a teoria. Nas colónias portuguesas, densas populações facilmente controláveis e exploráveis originaram a implementação de instituições extrativas. Nas colónias britânicas, pelo contrário, populações indígenas dispersas impossibilitaram igual controlo e exploração, e foram utilizados incentivos económicos para atrair colonos; o pluralismo económico e político ganhou raízes, a indústria floresceu e a prosperidade também.

A Inglaterra, berço da 1.ª Revolução Industrial, prova também a teoria. As diferenças entre os absolutismos inglês, espanhol e português refletiram-se no decurso do tempo. Nos descobrimentos, o comércio marítimo ficou sob controlo estatal em Portugal e Espanha, e em mãos privadas em Inglaterra. As riquezas do Novo Mundo solidificaram as monarquias em Portugal e Espanha, e asseguraram o pluralismo político em Inglaterra que semeou as sementes do expressivo crescimento económico posterior.

A prosperidade e desenvolvimento depende pois da capacidade dos governantes tornarem as instituições inclusivas e pluralistas, onde todos tenham as mesmas oportunidades. Só assim se permite que o potencial criativo das pessoas e dos países seja libertado, se constrói uma economia com vantagens competitivas, se cria mais riqueza para as empresas, para os seus trabalhadores e para o Estado, e se gera um circulo virtuoso que permite o progresso e a partilha de bem estar por todos.

Que lição decorre deste livro seminal para o Portugal atual, que, fazendo parte da União Europeia (UE), se apresenta como mais pobre e, ainda assim, contra o que sustenta a teoria económica, tem também pior desempenho económico, apesar de ter uma constituição escrita, eleições democráticas e poder político centralizado?

Vamos assumir que a constituição serve, ainda que, só para dar um exemplo, permita que os deputados não tenham qualquer elo de responsabilidade com os eleitores e que, assim, se impeça a participação da população no controle da qualidade dos responsáveis políticos e nos atos que praticam.

Será que as eleições são verdadeiramente democráticas? Não creio. Os eleitores são enganados com promessas falsas e meias verdades, que apenas garantem o paraíso no futuro! Quem está no poder, o incumbente, tem sempre vantagem porque, não havendo uma preocupação com a atuação eficiente dos órgãos de soberania (dominados politicamente), pode usar recursos públicos a seu favor para ganhar eleições. Próximo de atos eleitorais, as preferências vão para o que é imediatamente visível para o eleitor (autoestradas, atividades imobiliária e algumas “esmolas”/subsídios aos mais pobres) e não para a reforma inclusiva das instituições que assegura melhor saúde, educação, lei, ordem, natalidade, investimento, inovação, empreendedorismo e ordenamento.

O poder político tem sido competente? A falência eminente do país por três vezes no pós 25 de Abril diz tudo. As decisões sobre o “imediatamente visível” são casuísticas e discricionárias, não distinguem o essencial do acessório e asseguram que a riqueza é distribuída “para cima” (à elite) com algumas “esmolas” “para baixo” (aos pobres). O poder político não responde aos interesses de todos e não há vergonha na prática de atos abusivos que se criticavam em anteriores detentores do poder. Nem todos os portugueses têm as mesmas oportunidades porque, se não se combatem os monopólios em geral, não se combatem a nível corporativo e político como atesta a continuidade dos mesmos de sempre. O compadrio, a criação de intermediários improdutivos e de parasitas originados pelos partidos políticos é, de facto, a regra, desprezando-se a meritocracia em favor de interesses pessoais e/ou políticos. Deixo uma pergunta para reflexão: quem são os governantes e deputados de sempre, e os seus assessores?

Enfim, as instituições são extrativas e os cidadãos, compulsivamente afastados da vida coletiva, não desempenham as profissões pretendidas, seja porque as oportunidades são diferentes, seja porque a educação é cara, havendo profissões a que só alguns acedem. O Estado atrapalha tudo, condiciona a liberdade (até de expressão) dos cidadãos, e não há uma clara aposta na livre iniciativa e em regulamentações que evitem o condicionamento da atividade económica, desmotivando investidores e inovadores. Sem investimento, inovação e capital humano, a competitividade depende do emprego de mão-de-obra barata e é uma “festa” ter emprego que gera pobres. Neste contexto, a corrupção só podia, como é, ser generalizada, tendo aumentado com a democracia e com as deficiências da justiça. Esta, sendo morosa e também cara, não assegura que todos os portugueses tenham tratamento igual perante a lei. Há portugueses de primeira, de segunda, de terceira...

Em suma, as nossas instituições e a pertença à UE servem a elite e permitem escapar da pobreza, crescendo pouquinho, mas não permitem a ascensão da população em geral até à prosperidade média da UE. Tendo cada um de nós colaborado, por ignorância ou distração, para a situação atual cabe-nos, finalmente, perceber que nenhuma elite cede poder e benefícios voluntariamente, pelo que a prosperidade requer luta política contra o(s) privilégio(s).

O autor escreve segundo o novo Acordo Ortográfico 

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