Benavente tem novo PDM após anos de batalha em tribunal com a Quercus

A primeira revisão do Plano Director Municipal de Benavente foi agora publicada em Diário da República, mas há ainda três acções da Quercus a correr nos tribunais que contestam a legalidade do processo. A Câmara acusa a associação ambientalista de “litigância de má-fé”

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RG RUI GAUDENCIO - PÚBLICO

Aprovada em Junho de 2015, a primeira revisão do Plano Director Municipal (PDM) de Benavente só foi publicada em Diário da República nesta sexta-feira. Primeiro foi preciso esperar pela ratificação do Conselho de Ministros e, depois, pela decisão de uma providência cautelar apresentada pela Quercus por causa do novo aeroporto. Com a publicação no órgão oficial do Estado, a revisão entrará em vigor logo que a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional de Lisboa e Vale do Tejo publique a nova carta de Reserva Ecológica Nacional do concelho.

A associação ambientalista defende que esta revisão devia contemplar a localização do futuro aeroporto no Campo de Tiro de Alcochete (CTA), que tem cerca de 80% da sua área no concelho de Benavente. A autarquia tem um entendimento diferente e, com o aval de entidades da administração central, não contemplou na revisão eventuais implicações da construção do aeroporto nas zonas envolventes do CTA, porque isso poderia confrontá-la com avultados pedidos de indemnização de empresas com empreendimentos já aprovados.

Depois de ter apelado ao Governo para que não ratificasse esta revisão, a Quercus avançou, em Maio de 2017, para uma providência cautelar, que foi apreciada em três instâncias judiciais (devido a recursos da associação), que deram razão à Câmara de Benavente. “Sempre dissemos que não havia razões para todos estes processos jurídicos”, disse, nesta sexta-feira, ao PÚBLICO, Carlos Coutinho (CDU), presidente da Câmara de Benavente, afirmando que todo este processo e a demora de mais de três anos na publicação da revisão do PDM “prejudicou de uma forma muito séria a nossa população naquilo que é importante, que é a criação de postos de trabalho e a criação de riqueza, porque não foi possível concretizar alguns projectos previstos para o concelho de Benavente face à ausência do PDM revisto”.

Carlos Coutinho sustenta que os prejuízos são muito elevados, designadamente com vários projectos de construção de unidades hoteleiras que não puderam avançar, assim como um grande investimento internacional no domínio da produção de materiais de utilização hospitalar e vários casos de ampliação de unidades industriais já existentes.

O autarca da CDU garante que esta demora na publicação da revisão nada teve a ver com dúvidas do Governo, mas apenas com a providência cautelar da Quercus. Outra das questões colocadas tinha a ver com a inclusão, ou não, nesta revisão do PDM de medidas preventivas de salvaguarda de espaços para o futuro aeroporto e infra-estruturas de apoio. A Câmara alegou que as medidas impostas pelo governo em 2008 tinham caducado em 2010 e os tribunais também lhe deram razão.

A Quercus aponta “desconformidades” e “irregularidades” no processo de revisão, sobretudo por considerar que as medidas de protecção para a área do novo aeroporto deviam ter sido incorporadas. A associação fala, também, de “ameaças” à Zona de Protecção Especial do estuário do Tejo, de acréscimos injustificados nos espaços para actividades económicas e nos perímetros urbanos e na eliminação “injustificada” de 500 hectares de reserva ecológica. Por isso apresentou, também, duas acções contra a edilidade de Benavente e, já em Setembro passado, entregou uma acção popular em tribunal contra a Câmara, contra o Governo, contra vários eleitos camarários e contra entidades da administração central por alegadas irregularidades nesta revisão. Acções que correm ainda na justiça.  

João Pinheiro, advogado que representa a Quercus nestes processos, considera que o indeferimento da providência cautelar “não é uma batalha perdida”, até porque “já foi interposto recurso para o Supremo Tribunal Administrativo” e “parte substancial desta questão será discutida nas acções principais que apresentámos”. Estas três acções estão ainda na primeira instância, em apreciação no Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria. O causídico admite que a publicação da primeira revisão do Plano Director é um facto consumado, mas considera que, no futuro, se os tribunais vierem a dar razão à Quercus, alguns actos entretanto tomados poderão ser declarados nulos. Diz, também, que a Câmara poderia ter promovido esta publicação mais cedo, independentemente do facto de estar ainda em apreciação a providência cautelar.                   

Carlos Coutinho tem um entendimento diferente e interroga-se se haverá outras motivações para estas sucessivas acções da Quercus. “É um processo de desgaste, que não entendemos. Espero que um dia venha a ser explicado o que esteve na base de tudo isto, na certeza de que houve tempo perdido que esperamos que possa ser, agora, recuperado. A nossa convicção é que não havia razão nenhuma para todos estes processos, na forma como foram sendo tratados pela Quercus. Achamos que foi como que uma perseguição aos interesses das gentes do município de Benavente”, afirma Carlos Coutinho, acrescentando que o Município já decidiu avançar também com uma queixa contra a Quercus e que na contestação que tem feito a algumas acções judiciais já referiu que acha que “houve aqui litigância de má-fé”. Nesse sentido, a autarquia admite reclamar uma indemnização pelos prejuízos alegadamente causados pela situação.

João Pinheiro sustenta, contudo, essa é uma questão que não preocupa a Quercus, porque a alegação de “litigância de má-fé” já foi apreciada pelo TCA-Sul que “indeferiu esse pedido da Câmara, não reconhecendo qualquer fundamento a essa ideia de litigância de má-fé. Todas as acções que interpusemos estão devidamente fundamentadas com documentos, ou da própria revisão ou de entidades que emitiram pareceres onde estão descritos esses factos, não são factos inventados”, conclui.

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