Babuínos com corações de porco conseguiram viver mais de seis meses

Dois babuínos que receberam um coração de porco sobreviveram cerca de 195 dias. A equipa de cientistas acredita que as técnicas usadas na experiência poderão ser aplicadas no futuro em seres humanos.

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A insuficiência cardíaca é uma síndrome que incapacita o coração de bombear eficazmente o sangue pelo corpo, afectando cerca de 380 mil portugueses. A única solução a longo prazo passa por transplantes de coração. Porém, existe uma grande escassez de dadores.

Uma investigação realizada na Alemanha provou agora que é possível transplantar, de forma eficaz, corações de porcos para babuínos, podendo levar a avanços significativos no campo da medicina em humanos.

Os resultados do estudo, publicado esta quinta-feira na revista Nature, mostram que o transplante de corações de suínos (geneticamente modificados) para babuínos pode ser uma solução a longo prazo. Até agora, tinham sido já transplantados com sucesso rins de porco para babuínos (cujos animais sobreviveram durante 435 dias). Além disso, tinham sido efectuados transplantes de corações de porco para babuínos, mas sobreviveram no máximo 57 dias.

A recente investigação distingue-se das demais, não apenas porque estes transplantes de coração eram essenciais à vida dos 16 babuínos (divididos em três grupos), mas também porque dois dos animais sobreviveram mais de seis meses, nota o artigo científico, um trabalho liderado pela Universidade de Munique. 

O sucesso foi alcançado, dizem os investigadores, através de alterações no protocolo e técnicas usadas nos transplantes de coração entre espécies diferentes (xenotransplantes). Além disso, a modificação genética dos corações dos porcos dadores, de forma a eliminar incompatibilidades entre as espécies, tornou possível uma maior resistência por parte do sistema imunitário dos babuínos ao transplante, diminuindo a probabilidade de rejeição do órgão.

Durante o procedimento, em vez de o coração ser preservado numa solução gelada (técnica-padrão), os cientistas bombearam nos corações uma solução oxigenada com compostos sanguíneos, nutrientes e hormonas com uma temperatura de 8 graus Celsius (técnica à qual se dá o nome de “perfusão”). A constante circulação do sangue diminuiu a probabilidade de o tecido cardíaco ser danificado.

Para evitarem a hipertrofia (o crescimento dos corações após o transplante), os cientistas recorreram a alguns métodos que se revelaram eficazes. Primeiro, reduziram a pressão sanguínea dos babuínos até níveis semelhantes aos dos suínos. Depois, administraram aos babuínos torisel – um composto que suprime a proliferação celular e evita a coagulação do sangue – e reduziram a quantidade de cortisona usada no tratamento pós-cirúrgico, que se crê estar relacionada com a hipertrofia cardíaca.

Dos 16 babuínos, dois viveram saudáveis durante 90 dias (o período limite da experiência) e os outros dois foram mantidos vivos por poucos mais de seis meses, antes de serem submetidos a eutanásia.

Christoph Knosalla, especialista do Centro Alemão para o Coração (Berlim) e que não participou no estudo, comenta que apesar de ainda ser preciso analisar o risco da transmissão de vírus para humanos, “a taxa de sobrevivência deste estudo é impressionante” e faz referência aos xenotransplantes como solução no futuro.

Em 1995, o californiano Jeff Getty, infectado pelo vírus da sida, recebeu o primeiro transplante de medula óssea de um babuíno. Porém, este foi um caso ímpar e tais procedimentos não se terão voltado a realizar em humanos.

As técnicas agora utilizadas, dizem os cientistas, poderão um dia vir a ser aplicadas em transplantes em seres humanos e colmatar assim a escassez de dadores no futuro. 

Texto editado por Teresa Firmino

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