Morreu o poeta Alexandre Vargas (1952-2018)

Tradutor de Peter Hammill e Patti Smith, a música era também uma das grandes fontes da sua própria poesia. Filho mais novo do escritor José Gomes Ferreira, tinha 65 anos.

Retrato de Alexandre Vargas por Luis Manuel Gaspar, realizado em 1987 para o livro ainda hoje inédito <i>Terminal Transe</i>
Fotogaleria
Retrato de Alexandre Vargas por Luis Manuel Gaspar, realizado em 1987 para o livro Terminal Transe, ainda hoje inédito
Alexandre Vargas no início dos anos 90 na livraria setubalense Uni Verso, do seu amigo, e também poeta, João Raposo. Ao lado, em pé, o poeta  António Cândido Franco
Fotogaleria
Alexandre Vargas no início dos anos 90 na livraria setubalense Uni Verso, do seu amigo, e também poeta, João Carlos Raposo Nunes. Ao lado, em pé, o poeta António Cândido Franco

O poeta Alexandre Vargas foi encontrado morto esta quarta-feira, em sua casa, não sendo ainda conhecidas as causas da morte. Filho mais novo do escritor José Gomes Ferreira, estreou-se como poeta com o livro Morta a Sua Fala, publicado em 1977 na prestigiada colecção das Iniciativas Editoriais, que o seu pai inaugurara em 1956 com o volume Eléctrico.

Tendo publicado regularmente desde o final dos anos 70 até meados da década seguinte, Alexandre Vargas remeteu-se depois a um prolongado silêncio, só quebrado em 1997 com a sua colaboração na obra colectiva Múltiplos de Três, com Rui Caeiro e Miguel Torres-Chaves.

Em 2002, Amadeu Baptista e Luís Adriano Carlos escolheram-no para abrir a sua antologia Poesia Digital: 7 Poetas dos anos 80, onde divulgam vários poemas inéditos de Alexandre Vargas, designadamente do livro inédito Terminal Transe, que o autor teria há muito pronto a publicar, e para o qual Luis Manuel Gaspar chegou a desenhar várias ilustrações em 1987, mas que acabou por nunca sair.

Já no seu livro de estreia, mas sobretudo a partir do volume seguinte, Cyborg (Livros Horizonte, 1979), a poesia de Vargas está cheia de referências à música pop, do psicadelismo de Syd Barrett ao rock progressivo dos King Crimson ou de Peter Hammill. O líder dos Van der Graaf Generator foi mesmo uma das suas principais referências: o poeta português entrevistou-o e traduziu as suas letras para o volume Camaleão na Sombra da Noite, que publicou em 1990 na colecção Rei Lagarto, da Assírio & Alvim. Alguns anos antes, em 1983, Vargas já publicara na mesma editora, com o título Witt, as suas traduções de Patti Smith.

Em 1981, o poeta chega à colecção Círculo de Poesia, da Moraes, com Vento de Pedra, e publica no mesmo ano, em colaboração com Rui Baião e João Candeias, o livro-envelope Ubris. Seguem-se mais dois títulos, ambos de 1984: Organum (Fenda) e Lua Cisterna (& etc).

Segundo o esquema já experimentado em Cyborg de juntar um conjunto de textos, em verso e em prosa, a um extenso poema final que dá título ao livro, Organum é talvez o volume onde as referências à música são mais frequentes e eclécticas. Num dos poemas do livro, Vargas escreve: “Sinto-me, falo pela tua boca Syd Barrett”. E termina o mesmo texto com uma referência expressa à canção See Emily Play, que Barrett compôs para o álbum inaugural dos Pink Floyd: “E Emily que brinca, que brinca até desapareceres…”

Nascido a 31 de Dezembro de 1952, Alexandre Vargas Gomes Ferreira era filho de José Gomes Ferreira e da sua segunda mulher, Rosália Abecassis Vargas, e meio-irmão do arquitecto Raul Hestnes Ferreira, que morreu em Fevereiro deste ano.

Sugerir correcção
Comentar