Presidente executiva do YouTube chama novas regras de direito de autor na União Europeia de "irrealistas"

Num texto de opinião para o jornal britânico The Financial Times, Susan Wojcicki diz que o artigo 13º pode ser difícil de executar.

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Wojcicki apela aos eurodeputados para repensar a nova directiva dos direitos de autor Reuters/Eric Gaillard

A presidente executiva do YouTube, Susan Wojcicki, diz que as novas regras de direitos de autor que estão a ser delineadas na União Europeia são um perigo para o futuro da indústria criativa. Num texto de opinião para o jornal britânico The Financial Times, Wojcicki descreve a abordagem do Parlamento Europeu para responsabilizar plataformas como o YouTube, o Facebook e o Google por conteúdo pirateado online como “pouco realista”, porque “muitas vezes os próprios criadores de conteúdo discordam sobre quem é que tem os direitos sobre o material”. Para Wojcicki, “é impossível esperar que sejam as plataformas que alojam o conteúdo a decidir correctamente.”

Desde 2016 que a União Europeia está a preparar uma directiva para modernizar as leis dos direitos de autor e proteger os criadores de conteúdo digital. A versão actual – que está a ser alvo de negociações num processo à porta fechada que envolve a Comissão Europeia, o Conselho Europeu e o Parlamento Europeu – inclui o polémico artigo 13.º, que pretende responsabilizar as plataformas online, como o YouTube e o Facebook, por remover o conteúdo sem direitos de autor que chega à plataforma.

Ficou conhecido como a “máquina da censura” porque na proposta original, o artigo 13º propunha os serviços online adoptassem “tecnologias efectivas de reconhecimento de conteúdos” para combater a pirataria. A expressão não consta na versão actual, onde se lê que as plataformas “devem celebrar acordos de licenciamento justos e adequados com os titulares de direitos” e ter “mecanismos de reclamação e recurso céleres e eficazes para os utilizadores”.

Para Wojcicki, os problemas com o artigo 13º continuam. Usa a música viral Despacito, de Luis Fonsi, para exemplificar como as novas leis podem dar mau resultado. “O vídeo está protegido por múltiplos direitos de autor, desde a gravação do som aos direitos de publicação”, escreve. Embora o YouTube tenha acordos com várias entidades para poder passar o vídeo, alguns dos detentores de direitos não são conhecidos. Aos olhos da chefe do YouTube, essa incerteza pode obrigar o YouTube a bloquear o vídeo para evitar problemas com o acordo 13º. “À escala do YouTube, onde mais de 400 horas de vídeos são carregadas a cada minuto, os possíveis danos são tão grandes que nenhuma empresa poderia sobreviver a tal risco financeiro”, avisa Wojcicki.

A presidente executiva do YouTube pede aos eurodeputados para reformular a directiva actual que foi aprovada, em plenário do Parlamento Europeu, com 438 votos a favor, 226 contra e 39 abstenções. “Nós apoiamos os objectivos do artigo 13º”, frisa Wojcicki, que diz que o YouTube pagou 800 milhões de euros aos artistas europeus com conteúdo na plataforma de vídeos em 2018. “Mas a versão actual pode ter consequências imprevistas que afectam as vidas de centenas de milhares de pessoas”, alerta.

Wojcicki acrescenta que as plataformas “que se esforçam para ajudar os criadores de conteúdo, não deviam ser responsabilizados por cada peça que é carregada” nos sites.

Nos últimos anos, o Google – que é dono do YouTube – diz ter investido cerca de 100 milhões de dólares  a proteger os direitos de autor no site de vídeos com o Content ID. Trata-se de uma funcionalidade que analisa todos os vídeos do YouTube para os comparar com uma extensa base de dados de conteúdo protegido por direitos de autor. A lista contém obras enviadas ao YouTube por estúdios de cinema, editoras de música, produtoras de televisão e outras entidades, que são notificadas quando é detectada alguma infracção. São os criadores que escolhem ao que acontece ao conteúdo pirateado que é detectado na plataforma (podem exigir que seja removido, receber dinheiro de anúncios colocados nesses vídeos, ou apenas seguir o número de visualizações e gostos desses vídeos).

Há anos que a tentativa de desenhar novas linhas para guiar os direitos de autor na Internet é marcada por divergências ideológicas e interesses de negócio em conflito. Por toda a Europa, vários artistas e associações ligadas à indústria criativa têm enviado apelos aos seus eurodeputados a defender a versão actual. De acordo com um apelo enviado aos pela Sociedade Portuguesa de Autores, aos eurodeputados portugueses em Setembro, “o que verdadeiramente preocupa os grandes potentados económicos de distribuição digital, opositores da proposta directiva, é que com esta serão obrigados a remunerar justamente os titulares de direitos.”

Embora o texto de opinião de Wojcicki se foque no artigo 13º, os artigos 3.º e 11.º têm motivado também muita discussão. Definem, respectivamente, limites às entidades que podem fazer recolha e tratamento de dados, e permitem aos media cobrar pelos excertos que acompanham os links de notícias (por exemplo, em motores de busca).

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